Eu me recolhi. O mundo fora dos meus aposentos deixou de existir. Eu não comia. Eu não dormia. Os empregados da casa deixavam bandejas de comida do lado de fora da minha porta, e elas eram levadas horas depois, intocadas. A única coisa que eu consumia era o silêncio, e era uma refeição amarga.
A ferida na minha mão formou uma crosta, uma linha irregular e feia que servia como um lembrete constante. Latejava com uma dor surda, uma manifestação física da podridão que se instalara em minha vida.
Então as mensagens de Carina começaram de novo. Uma torrente implacável de veneno entregue diretamente ao meu celular.
*Vocês estão mesmo noivos? O Frederico diz que é só um acordo de negócios. Ele diz que nunca nem dormiu com você.*
*Você é só uma relíquia do passado, Estela. Uma obrigação. Ele me disse que mal pode esperar para se livrar de você.*
*Por que você não desaparece de vez? Tornaria as coisas muito mais fáceis para todo mundo.*
*Deixe ele ir. Ele me ama. Ele quer ficar comigo e com o nosso bebê.*
Então veio a foto. Uma selfie. Carina, enrolada nos lençóis de Frederico, sua barriga de grávida orgulhosamente à mostra. Frederico dormia ao lado dela, o braço jogado protetoramente sobre ela. Ela sorria, um sorrisinho triunfante e cruel.
A legenda abaixo dizia: *Ele ainda faz amor comigo todas as noites, mesmo com o bebê. Qual foi a última vez que ele te tocou assim, Estela? Ou ele já te tocou alguma vez?*
Meu polegar pairou sobre a tela. Eu не senti nada. Nem raiva, nem lágrimas. Apenas um vazio vasto e frio. Calmamente, bloqueei o número dela e apaguei todo o histórico de mensagens.
Uma semana depois, um jantar formal de família foi arranjado. Uma tentativa dos anciãos Monteiro de projetar uma imagem de estabilidade diante do escândalo crescente. Minha presença não era opcional.
Vesti um vestido preto severo, o curativo na minha mão um contraste branco e gritante. Entrei na grande sala de jantar, de cabeça erguida. A longa e polida mesa de mogno estava cheia com os rostos do clã Monteiro – tios, tias, primos. Seus olhares eram uma mistura de pena e curiosidade mórbida. Eu podia sentir seus pedidos de desculpas não ditos pairando no ar como um cheiro ruim.
Meu lugar designado, à direita da cabeceira da mesa onde o patriarca se sentaria, era meu por direito de nascença. Era o lugar que minha mãe ocupara uma vez, o lugar que significava minha posição como a futura matriarca da família.
Caminhei em direção a ele, cada passo um ato deliberado de reivindicar o que era meu.
E então eu parei.
Minha respiração ficou presa na garganta. O mundo girou em seu eixo.
Sentada na minha cadeira, aninhada ao lado de Frederico, estava Carina Gonçalves.
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