Suspirei olhando para o vídeo na tela onde a ragazza comia um brioche atrás do outro antes de devorar o jantar em menos de um minuto.
- Nossa, ela está com fome... - Gianni comentou. - A propósito, vai mandar ela pra boate hoje?
- Ela tem medo de homens, não pode ir pra Luna di Vino por enquanto.
- Devo avisá-la que a dívida de Gaspar ainda está pendente? - perguntou Gianni.
- Não. Eu mesmo farei isso. Se ela não me obedecer, vou mandar de volta para o Gaspar. - Eu bebi o whisky. - Leve a ragazza para o meu quarto.
- Sim, senhor!
- Aliás, diga a Ricardo e Miguel que não quero que regressem sem o Gaspar - enfatizei antes de sair dali.
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Juliette.
Após o jantar, sentei num aconchegante sofá. Já tinha ido até a saída, mas tinha soldados de Vito por todo canto.
- Olá, senhorita! - disse uma idosa de cabelos brancos presos num coque. - Sou Maria, governanta da família Lucchese. Vou te levar para o seu quarto.
- Eu durmo aqui!
A mulher riu e carinhosamente respondeu:
- O senhor Lucchese não vai gostar disso - falou serenamente. - Venha comigo.
Segurando minha roupa rasgada na altura do abdômen, tentei esconder meu sutiã.
Embora fosse extremamente gentil, aquela senhora não pareceu comovida com a minha situação. Ela simplesmente andou na frente, indicando o caminho.
Maria parecia uma daquelas funcionárias que estava habituada com esse tipo de coisa. Ela não quis saber o porquê do meu vestido estar rasgado e mal olhou para os meus ferimentos.
- Se precisar de algo, pode me chamar.
- Grazie... - disse, meio sem graça.
Algum tempo se passou. Enrolada nos lençóis macios, eu relaxei. Estava sonolenta e de barriga cheia, o que era raro nos últimos anos em que convivi com Gaspar e com minha mãe.
Um ruído estranho fez com que os meus batimentos cardíacos acelerassem. Alguém estava abrindo o trinco do outro lado.
Quando a porta se abriu, Gianni entrou. Ele não me olhou com raiva, apenas com indiferença.
- Levante-se, Juliette. O Don mudou os planos.
"Será que ele ia me deixar ir embora?" Animada, saí da cama e atravessei a porta.
Ajeitei o tecido para cobrir a parte com o rasgo quando Gianni me levou para o lado oposto do corredor até pararmos numa porta que parecia ainda mais imponente. Quando ele abriu, eu titubeei
Aquele cômodo era maior, mais escuro, dominado por uma cama gigante, com lençóis de um cinza profundo e travesseiros brancos.
A janela panorâmica mostrava a cidade como um brinquedo aos pés dele. Mas o que me sufocou foi o cheiro. Cedro, couro e um perfume masculino potente, frio e inconfundível. O cheiro dele estava em tudo. Nos lençóis, no ar, nas roupas escuras jogadas sobre a poltrona.
Sem me tocar, Gianni apontou para o banheiro.
- Vista a camisola que Maria deixou sobre a cama. Não tente nada estúpido. Se o senhor Luchesse não gostar de você, ele simplesmente vai te devolver para o seu pai.
- Já disse que aquele asqueroso não é meu pai.
- Que seja... - Grunhindo, Gianni rumou para a saída.
"Vou ter que voltar para casa do Gaspar." Aquele pensamento era o suficiente para congelar qualquer ideia de fuga. Eu estava presa entre dois infernos, e o de Vito, até aquele momento, tinha o que comer e uma cama quentinha pra dormir.
Eu entrei no banheiro e corri para tomar um banho quente. A água quente corria, mas eu mal sentia enquanto esfregava a minha pele com força.
Só queria me livrar daquela sensação horrível e do cheiro asqueroso do meu padrasto. Por mais que tentasse me limpar, era impossível me livrar da lembrança daquele homem bêbado sobre mim, me machucando. As lágrimas fluíram, misturando-se à água.
Não sei por quanto tempo fiquei debaixo daquele chuveiro, mas, em certo momento, já não tinha mais lágrimas para derramar.
Quando saí, vi a camisola de seda que estava dobrada sobre a cama.
Olhei para a cidade, sentindo-me a pessoa mais insignificante e perdida do mundo.
Meus olhos caíram sobre a mesa de cabeceira dele, onde tinha um cinzeiro pesado de cristal, ao lado de um livro de capa dura sobre a história de Roma.
A cada lufada morna do aquecedor, eu sentia o cheiro potente dele. Eu estava encolhida na beira da cama;
A porta se abriu e então, Vito entrou sem pressa.
Eu me levantei da cama, recuando até que minhas costas bateram na parede fria do vidro.
- Adoro desafios, ragazza. - Sua voz era grave e baixa.
- Eu sei quem o senhor é - eu disse, tentando manter a voz firme, mas ela tremeu. - É um monstro que se veste melhor.
Ele sorriu e continuou a avançar.
- Ficou sabendo do boato sobre minha noiva? - Vito se curvou, sussurrando no meu ouvido.
Sim, já tinha escutado que ele matou a noiva depois que descobriu que ela era uma espiã do grupo rival.
- Não admito traição! - murmurou em meu ouvido.
Uma fragrância de perfume ambarado emanava dele. A tensão era tão densa que eu mal conseguia respirar no momento em que me encurralou, prendendo meu corpo entre o dele e o vidro.
- É bom saber que alguém pode estar assistindo à maneira como toco em você... - ele engrossou a voz, porém manteve o tom baixo.
O contato era inevitável, mas ele manteve uma polegada de distância, permitindo que o calor de sua ameaça fosse pior do que o toque real.
Eu levantei o queixo, encarando aquele mafioso. Enxerguei a escuridão nos olhos dele, mas não era a mesma escuridão que eu via em Gaspar.
A respiração falhou em meus pulmões, e eu comecei a tremer incontrolavelmente quando sua mão tocou minha cintura, apertando-me.
- O que o senhor quer de mim? - Minha voz saiu tremida.
- Quero ser o primeiro...