Capítulo 3 Eloá

Eloá

Eu nem acreditei quando chegamos em Penedo, que lugar lindo.

Um friozinho gostoso, eu ia explodir de tanta felicidade.

-- Ta feliz preta?– ele perguntou enquanto dirigia.

-- Claro amor, esse lugar é lindo.– falei admirando cada rua que a gente passava.

Ele parou o carro enfrente a uma pousada linda, cheio de vegetação

-- Vamos ficar nessa pousada.- ele saiu do carro, sai logo em seguida..

*****

-- Tá tomando seu remédio direito né?– ele falou enquanto alisava minhas costas.

-- Estou amor, todo mês certinho eu vou no posto tomar minha injeção.– Farula nunca usou camisinha comigo, por isso que assim que eu me perdi eu contei pra minha madrinha, ela me levou no médico e passei a tomar remédio.

-- Pode dá bobeira não, já pensou tu grávida.– ele riu.-- Vai ser a grávida mais linda, mas vai criar nosso filho sem pai.– olhei pra ele sem entender.

-- Porque sem pai? Vai me largar grávida Fernando? – ele começou a rir.

-- Te largar não, mas vão me matar se você aparecer grávida.– ele ria achando graça, mas não tinha graça nenhuma.

Meu padrinho ia mesmo matar ele se eu engravidasse, por isso eu tomava todos os cuidados.

-- Mas se eu engravidasse, você seria a favor do aborto?– perguntei com receio.

-- Tá maluca, sou contra isso.– ele levantou pra pegar o cigarro de maconha no bolso da calça.-- Meu sonho é ser pai preta, sempre quis ter um pivete, uma miniatura minha correndo pela casa.– ele falou com um sorriso bobo nos lábios.

-- Você nunca me contou sobre isso.– ele sentou na cama novamente.-- Na verdade eu sei pouca coisa sobre você.– ele mudou a feição dele.

-- Tem coisas que é melhor tu não saber, não gosto de falar do meu passado.– ele falou e depois ficou mudo.

O Fernando era muito misterioso, pouca coisa eu sabia sobre a vida dele. Ele nunca falou dos pais e nem da família, nunca se ouvia falar nada sobre ele. Nem mesmo meu padrinho falava sobre isso.

Nosso final de semana foi maravilhoso, aproveitamos muito cada momento só nosso.

Uma semana depois teve outra operação no morro, na verdade foram dias de guerra, muitas mortes, muitos feridos.

O tiro comia solto, ninguém entrava no Salgueiro. Eu e a madrinha saímos do Salgueiro assim que o meu padrinho avisou que ia ter operação.

Ficamos no apê no asfalto, a gente só tínhamos notícias pela TV.

-- Dinda desliga isso, só tá passando sobre as mortes.– eu falei vendo o que passava no jornal.

-- Você tá certa.– ela desligou a tv.-- Eu vou me deitar, qualquer coisa você me chama.– assenti com a cabeça.

Fiquei mexendo no celular, a Luísa me passava como estava a favela, depois fiquei ouvindo música, até a campainha tocar me assustando.

Olhei pelo olho mágico e vi o Farula e o meu irmão, abri a porta dando passagem pra eles.

Eles estavam nervosos, meu irmão com cara de quem havia chorado, a Farula foi pra cozinha.

-- Cadê a Tia? – meu irmão me perguntou.

-- Tá lá no quarto, o que aconteceu...– ele nem deixou eu falar e foi em direção ao quarto, não demorou nada o Farula voltou de cara fechada.

-- Nãooooooooooo..- minha madrinha gritou do quarto.

-- O que aconteceu com o meu padrinho? – perguntei pro Farula, ele respirou fundo.

-- Seu padrinho foi preso Eloá.– ele falou olhando pro nada.

Caí no chão aos prantos, meu padrinho foi preso, preso.

Senti alguém me abraçando, mas eu só queria mesmo era o meu padrinho.

–- Vai ficar tudo bem preta, nós vamos tirar ele de lá.– ele deu um beijo no topo da minha cabeça.

*****

Um mês depois tudo tinha voltado ao normal ou melhor quase tudo. Meu padrinho ainda estava no presídio e para complicar ainda mais ia ser transferido para Penitenciária Federal de Catanduvas no Paraná, por ser dono do morro do Salgueiro, a justiça tem medo que fuja.

Não está sendo fácil ficar sem o meu padrinho aqui, minha madrinha vive à base de calmante.

Ela ainda nem conseguiu ir visitar ele, está sendo a maior burocracia devido a transferência dele.

O Farula assumiu enquanto o meu padrinho estiver preso, quase não estamos nos vendo já que ele agora tá tendo uma responsabilidade ainda maior.

Como eu disse, tudo voltou ao normal.os Baile, pagode e festas.

Eu não vou pra nenhum desses lugares, ando muito cansada, com muito sono e indisposta pra tudo.

Isso tudo que aconteceu com meu padrinho, mexeu muito comigo. Todo dia eu acordo enjoada, sem fome, não sabia o que estava acontecendo comigo.

*****

-- Ontem o baile tava muito bom amiga, curti na melhor forma.- a Bruna falou sorrindo, enquanto eu botava mais uma colher de açaí com Nutella, leite ninho e ovomaltine.-- Seu boy tava lá também, mas não ficou muito tempo, sabe quem também sumiu assim que ele saiu? - parei de comer e arquei a sobrancelha e ela continuou falando.-- A Luísa.– olhei pra ela tentando analisar o que ela estava falando.

-- O que você está querendo dizer com isso Bruna ?– ela deu um longo suspiro.

-- Ai amiga, esquece.. só abre o olho que nem todo mundo é leal a você.– ela falou o mesmo que todo mundo fala sobre ela.

Eu neguei com a cabeça, continuei comendo, mas parei quando meu estômago embrulhou, levantei e corri pro banheiro.

Levantei a tampa do vaso e coloquei tudo para fora.

-- Amiga tudo bem com você?– a Bruna entrou no banheiro aparentemente nervosa.

-- Ai amiga, acho que esse açaí não estava muito bom.– vomitei novamente.-- ou eu devo estar com alguma intoxicação alimentar.– ela olhou pra mim, depois fechou a cara.

-- Tem quanto que tu tá assim Eloá? – ela cruzou os braços me encarando.

-- Tem umas 2 semanas, eu acho.– levantei indo lavar meu rosto, peguei a escova, botei a pasta e comecei a escovar meu dente.

-- Eloá, sua menstruação veio esse mês? – parei na hora, olhei pra ela através do espelho.

-- Você não acha que eu estou...– nem terminei de falar ela já me interrompendo.

-- Que tu tá prenha? – assenti com a cabeça.-- Acho sim.– ela falou com um pouco de raiva.

-- Eu não posso estar grávida, Bruna isso é loucura.– comecei a chorar.

-- Não adianta ficar chorando agora, tem que fazer um teste pra saber.– ela falava de um jeito tão estranho parecia que estava com raiva ou sei lá.

-- Como eu vou comprar isso, ai meu Deus eu estou ferrada.– eu estava desesperada. Grávida aos 17 anos, como ia ser a minha vida, meu padrinho ia mandar matar o Farula, eu ia ficar sozinha na rua com uma criança no colo.

-- Bora Eloá, eu vou te ajudar.– a Bruna me chamou me trazendo pra realidade.-- Não adianta nada tu ficar chorando agora, não conta nada pra ninguém sobre a sua suspeita, nem mesmo pro Farula até saber se tu tá ou não grávida...

            
            

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