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Catherine
O barulho insistente de batidas na porta da frente me trouxe de volta de meus sonhos em um sobressalto. Mal conseguia recordar do momento em que havia me entregado ao sono. Os livros que estive lendo, junto das provas dos alunos de perícia criminal que terminava de corrigir na noite passada, ainda se encontravam espalhados por cima de meu corpo e pelo chão da sala, fazendo-me derrubar mais alguns quando me estiquei preguiçosamente.
Diferente do barulho das capas dos livros colidindo com o chão e das folhas de papel "voando" pelo ar até terem o mesmo destino. O som constante na madeira continuou insistente, impedindo-me de fechar os olhos novamente. Ainda tonta e sonolenta, arrastei-me para fora do aconchego do cobertor quente que me cobria e tentei desviar dos amontoados de papéis que estavam no grande tapete felpudo sob os meus pés com certa dificuldade devido ao pouco espaço disponível. Precisava agradecer a mim mesma por comprar um sofá tão confortável ou estaria sofrendo com uma severa dor na coluna agora.
- Estou indo! - Gritei, já irritada. A ideia de pegar minha arma no cofre e atirar em quem perturbava meu merecido descanso passou pela minha mente mais de uma vez naqueles poucos minutos de caminhada até a porta da frente. Um rápido olhar para o relógio digital perto da mesma fez-me bufar internamente. Deveria ser crime acordar uma pessoa às seis e meia da manhã de um domingo! Não me dei nem mesmo o trabalho de espiar o olho mágico, eu sabia que somente existia um ser disposto a atrapalhar minha paz tão cedo em pleno final de semana. - Jackson, o que você está fazendo aqui? - Perguntei, observando o homem de cabelos escuros e 1,82 de altura parado à minha frente com um sorriso presunçoso nos lábios.
- Trouxe comida. - Ele argumentou simples, dando de ombro despreocupadamente para a forma ameaçadora em que eu o estava encarando enquanto balançava as sacolas em suas mãos na altura de meus olhos. Esse garoto só pode estar de brincadeira com minha cara. Sem esperar por uma resposta ou um convite, o moreno passou por mim para dentro da residência, cantarolando e parecendo achar graça da situação. Ele estava se divertindo com meu sofrimento, eu não tinha dúvidas. Respirei fundo, contando até dez, para não acabar por estrangulá-lo como queria e acabar perdendo meu réu primário tão cedo.
- Inacreditável...! - Murmurei a contragosto, revirando os olhos para meu amigo de longa data.
Fechei a porta atrás de mim, caminhando a passos firmes em direção ao meu quarto. Precisava de um banho para acordar de verdade e possuía plena noção de que discutir com Jackson Hould logo de manhã era uma tremenda perda de tempo. Ele sempre fazia o que aquele cérebro brilhantemente teimoso e sádico dele mandava no final. Era mais fácil somente ignorá-lo.
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Demorei mais do que planejava embaixo do chuveiro, a água morna havia relaxado meus músculos em segundos e, após todos aqueles dias cansativos com os alunos da universidade e um caso de assassinato resolvido, era o que mais necessitava. Semanas de intensivas para o semestre final sempre acabavam comigo.
Antes mesmo de caminhar para fora do quarto, as vozes que conversavam animadamente chegaram aos meus ouvidos. Era no mínimo peculiar o modo como meus amigos e colegas de trabalho entravam e saíam de dentro da minha casa, sem ao menos se preocuparem com a minha opinião sobre o assunto. Contudo, o fato de eu simplesmente ter achado "normal" e me acostumado tão facilmente depois de três anos nessa mesma rotina era o que realmente me preocupava.
- Por que eu ainda tenho trincos nas portas, mesmo? - Perguntei com o ar debochado explícito em minha voz, finalmente entrando na cozinha onde os três se encontravam.
- Bom dia para você também, Cathy. - Diana me respondeu, divertida e alegre como de costume. A ruiva, alguns centímetros mais baixa que eu, estava sentada ao lado de Michael na mesa. Direcionei um olhar afiado para ela, recebendo um sorriso despreocupado da mulher que piscou para mim, erguendo as sobrancelhas como geralmente fazia quando sabia que eu estava de mau-humor e comia seu bolinho de aveia.
Mas, diferente dela e de sua alegria ao acordar, comer algo saudável e correr pelas ruas, eu necessitava de um café forte somente para funcionar e não acabar por xingar alguém.
Fiz meu caminho até o balcão, enchendo minha caneca e observando Jackson no fogão derretendo torradas com queijo enquanto vestia meu avental rosa de ursinhos, como fazia quase todas as manhãs desde o dia em que, por um fatídico milagre, o convidei para entrar. Eu deveria ter batido a porta na sua cara enquanto podia e não ter ficado com pena, ao vê-lo todo molhado pela tempestade inesperada que havia caído naquele dia. Me pouparia muitas dores de cabeça, com toda a certeza.
- Algum motivo especial ou estão invadindo minha casa em um final de semana somente para não perderem o costume? - Questionei, sentando-me em frente aos outros dois com a xícara fervendo. Segurei um riso quando meu olhar caiu sobre o loiro, que devorava seu café da manhã apressado e perfeitamente concentrado. A única forma de manter Michael Reed calado era dando-lhe algo para comer.
- Lembra do caso do trem fantasma de 1911 que desapareceu misteriosamente em um túnel em Lombardia? - Jackson começou se aproximando de nós e parando ao meu lado. Havia um motivo especial para que nunca tivesse expulsado o moreno a pontapés de minha cozinha, ele, de fato, fazia o melhor café forte que já experimentei em toda a minha vida, além de cozinhar muito bem. Murmurei positiva, encarando faminta as torradas que o mesmo derrubava em meu prato antes de também se sentar à mesa. - A Academia de Ciências Antropológicas Históricas se juntou ao governo italiano para investigar o local do acidente. Eles vão reabrir o túnel bombardeado na Primeira Guerra para procurar a locomotiva e descobrir o que realmente provocou o incidente.
- Exato, e eles precisam de especialistas com experiência para cuidar do caso, já que provavelmente a repercussão será mundial. - O loiro finalmente se pronunciou, prestando atenção em nossa conversa, após terminar sua grande fatia de bolo de chocolate com mousse em dobro. Michael não ter diabetes era o que realmente deveríamos investigar, levando em consideração o tanto de açúcar que consumia todos os dias. - Falei com a direção-coordenadora ontem e sugeri nosso grupo. A direção de Roma está analisando nossa papelada para confirmar.
- Quando sai o resultado? - Diana se interessou. Ela e eu havíamos estudado sobre a lenda da locomotiva fantasma para um trabalho na época da faculdade. Era um mistério e tanto para se ter nas mãos, apesar das lentas exageradas que a envolviam.
- Semana que vem, no máximo. Mas, considerando os sucessos dos nossos últimos casos... Seremos designados para esta investigação. - Ele deu de ombros com um sorriso convencido em direção à ruiva.
- Ótimo, porque eu preciso de férias das aulas na universidade. - Digo em um suspiro contente. Amava lecionar e treinar os novos peritos policiais, mas nada se comparava a sair a campo e descobrir a verdade sobre casos esquecidos no meio da história.
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