Acordava cedo, sempre antes de todo mundo. Antes mesmo da luz do sol entender que era hora de brilhar.
A casa ainda silenciosa, mas a cabeça, não. Já acordava cheia: de tarefas, de medos, de vontades deixadas pra depois.
O primeiro som do dia não era o despertador - era o suspiro. Aquele longo, que só quem carrega o mundo conhece.
E ainda assim, ela levantava.
Não porque estivesse descansada, mas porque sabia que se não fosse ela, ninguém mais faria.
Tinha dias que o espelho mostrava mais olheiras que olhos, mais cansaço do que cor. Mas bastava ouvir a vozinha chamando "mamãe", e algo nela se acalmava.
Era exaustão com sentido.
Tinha aprendido a se virar no automático.
Fazia o café enquanto lavava a louça da noite passada. Arrumava a mochila com uma mão, ajeitava os cabelos do filho com a outra, e com o coração... segurava tudo o que não podia desabar.
Nem sempre alguém perguntava se ela estava bem.
Nem sempre ela sabia a resposta.
Mas ela estava ali.
Inteira, apesar dos pedaços.
E quando saía de casa, de chinelo no pé ou salto no coração, ela levava junto o que ninguém via:
o peso invisível de ser tudo para todos.
E quase nada para si.
Mas ela não reclamava.
Nem sempre por escolha.
Às vezes, por costume.