Capítulo 9 A Dor da Perda

Raphael

Olhando para o portão de embarque, pergunto se estou realmente pronto para voltar à Los Angeles, para ir de encontro a todos os sentimentos que sufoquei depois de minha partida.

Mesmo após um ano, ainda é difícil aceitar a morte de minha Leilah, foi um golpe duro e bem difícil de lidar. Em um momento estávamos felizes com os planos de começar nossa família, ter os tão sonhados filhos, e no seguinte a descoberta do câncer, que a tirou de mim. E o pior, é que se não fosse a irresponsabilidade da Leilah, que foi negligente com a própria saúde, ela teria mais chance de estar viva.

Entrei no avião, e acomodado na poltrona, fechei os olhos, deixando as lembranças me preencher.

Devido a uma caxumba quando eu tinha 13 anos, eu me tornei infértil, o que nunca foi um problema em meu casamento, mas com o tempo, eu comecei a querer ter uma família, e sabendo que a única opção era por fertilização, conversei com a Leilah, e ela aceitou de imediato, pois queria muito ser mãe.

Porém, enquanto fazia os exames, Leilah foi alertada de um problema na mama, mas na ocasião só olhou no google e acreditando não ser nada de importante, escondeu de mim. Mas era algo sério, câncer de mama. Só fui descobrir bem depois, quando ela teve uma queda e foi ao hospital. Naquele dia, antes de saber da doença, nós acabamos discutindo. Eu estava preocupado, pois ela vinha há uns dias sentindo dores nas costas, e ao sugerir que aproveitasse para realizar mais exames, Leilah ficou furiosa ao se recusar, e não consigo esquecer suas palavras naquele momento.

- Engraçado que ontem você não parecia nada preocupado com essas dores, apenas queria transar.

Sua acusação me magoou muito, a ponto de me afastar dela, apesar da preocupação que sentia. Nós tínhamos aprontado muito no dia anterior, mas apenas porque as atitudes dela me fizeram ficar relaxado, afinal ela não estaria daquele modo se estivesse com dores.

- Sim, me desculpe se ontem cometi o terrível crime de me deixar ser seduzido por minha esposa, e acreditar que se ela estava em um jogo de sedução comigo, era por estar bem.

O silêncio no quarto foi horrível depois disso, e só foi quebrado quando o médico apareceu, e ao receber a notícia que minha esposa estava com câncer de mama, toda a briga foi esquecida e foquei apenas em dar o apoio que ela precisava.

Só no dia seguinte que pudemos confirmar a doença, e descobrir que ela estava com câncer no estágio avançado e a doença já havia se espalhado para a coluna, sendo daí a origem de suas dores. Foi nesse momento que descobri sua mentira e irresponsabilidade. Tudo só se tornou pior para mim ao ver que ela estava deixando a própria vida de lado para poder engravidar.

Mais uma vez discutimos, ainda mais após eu perceber que ela tinha usado o sexo para me distrair naquela semana. E foi só quando ela perguntou se eu a deixaria que me acalmei, jamais a abandonaria em seu pior momento, casamento é bem mais profundo que apenas sorrisos.

Depois daquele dia, fiz a Leilah prometer nunca mais esconder de mim, afinal era por culpa de um segredo que eu estava em risco de perder a mulher que tanto amei.

Foram três meses difíceis. Eu me afastei da empresa para auxiliar Leilah em seu tratamento contra o câncer, e apesar de ter ficado muito bravo por sua mentira, acabei deixando a raiva de lado ao ver como ela estava fragilizada pelo que estava acontecendo, minha esposa precisava de meu apoio e eu não falharia com ela.

Durante todo o tempo, me mantive confiante que tudo acabaria bem, e após a cirurgia ela ficaria bem... Mas ela não acreditava nisso assim como eu. E a maior prova disso foi a promessa que ela me fez fazer.

- Sabe Raphael, nos últimos dias, eu pensei muito em como será sua vida depois que eu me for, eu não quero que você desista de tudo por me perder.

Eu sabia onde ela está querendo chegar com aquela conversa e não queria ouvir.

- Leilah pare, por favor.

- Não posso, não antes que você me prometa.

Mesmo tendo certeza de qual seria a promessa que ela queria, ainda assim, fiz a pergunta para qual não poderia dar resposta.

- Prometer o quê?

- Prometa que continuará sendo esse homem maravilhoso que é. Prometa que nunca deixará de cozinhar os chocolates deliciosos que faz e nem de inventar receitas. E o principal, prometa que não se fechará para o amor, que se dará uma nova chance.

- Não me peça isso Fofinha, minha vida sem você não terá sentido.

- Terá sim, e por mais que sua vida fique por um tempo sendo sem luz, um dia o sol voltará a brilhar e você será feliz novamente.

- Você é o brilho da minha vida.

- E sempre irei ser, onde eu estiver, estarei olhando por vocês.

- Vocês?

- Sim, todos que amo. - Eu sentia que tinha algo de estranho em sua afirmação.

- Por que está fazendo isso Leilah? Por que essa insistência em dizer que vai morrer?

- Porque é o que estou sentindo, e não quero partir sem ter a certeza de que você ficará bem. Por favor, me prometa isso, Raphael.

Na ocasião, acabei me lembrando das palavras de minha avó pouco antes de perder o vovô: "Meu querido menino, nunca negue uma promessa ou perdão para alguém em seu leito de morte ou enfermo, algumas pessoas sentem o chamado da morte. E quando a morte nos chama, queremos garantir o bem daqueles que amamos para partir em paz. Vá lá e dê ao seu avô a paz que ele precisa".

Eu me recusava a acreditar que Leilah estivesse ouvindo o chamado da morte, porém, não tive coragem de lhe negar essa paz, não quando estava para entrar em uma cirurgia tão delicada.

- Fofinha, mesmo tendo a certeza de que você ficará bem e logo estaremos em nossa casa, eu te prometo que não deixarei de ser quem sou, nem de fazer meus doces, mas não posso te prometer que irei amar outra mulher além de você.

- Mas quando eu não tiver mais ao seu lado, quero que se dê a chance de um novo amor, pode ao menos me prometer isso?

Ela estava tão determinada, e seus olhos lacrimejantes, suplicavam por minha aceitação.

- Está bem, se um dia você não estiver mais comigo, dou a chance, mas não acredito que poderei amar outra como a amo.

Seu sorriso tímido, aqueceu meu coração, pois vi naquele momento que fiz o melhor para ela. Pouco depois ela foi levada para a cirurgia, mas não sem antes se despedir, e suas palavras me deixaram bem abalado.

- Só mais uma coisa, eu sei que errei por não ter contado tudo a você, mas nunca se esqueça que cada uma de minhas atitudes foram pensando no nosso filho, foi por ele que fiz tudo. Mesmo assim quero pedir que me perdoe. Eu o amo, Vida. - Foram suas palavras finais.

E essa foi a última vez que a vi com vida, que ouvi suas doce voz. Limpando as lagrimas que teimam em querer sair, lembro daqueles momentos derradeiros.

Eu fiquei na sala de espera, e os minutos foram passando e se transformam em horas, e a todo momento ficava olhando para o relógio, que parecia estar se arrastando bem devagar. O médico havia me falado que a cirurgia levaria entre 2 à 3 horas, mas já passou meia hora do previsto e nada de alguém vir nos dizer o que está acontecendo. Minha vontade era invadir o centro cirúrgico e obter alguma informação da Leilah, mas sabia que não devia fazer algo assim, pois poderia atrapalhar os médicos.

Finalmente, quando estava dando quase 4 horas de cirurgia, o médico veio até nós, e logo fiquei alerta ao ver sua expressão.

- Doutor, graças a Deus o senhor apareceu, como está minha esposa?

- Senhor Lewis, as primeiras horas de cirurgia foram dentro do esperado, apesar das complicações encontradas. - Noto que suas feições ficam mais carregadas e tenho um mal pressentimento. - Assim que iniciei o procedimento e estava como cítio cirúrgico exposto, encontramos uma complicação, o tumor estava enraizado no arco-aórtico obstruindo, uma das ramificações que é responsável por levar sangue arterial ao coração, eu tentei ressecar essa parte da lesão, mas estava difícil. A senhora Lewis acabou tendo uma parada cardíaca e não resistiu, vindo a óbito. Eu sinto muito.

- É MENTIRA. - Me recusava a acreditar que fosse real.

- Sinto muito mesmo, senhor Lewis, mas não é, a senhora Lewis teve uma parada cardíaca durante a cirurgia, e embora prontamente iniciamos as técnicas de reanimação, foi em vão. Nós fizemos todo o possível para salvá-la, porém, não conseguimos. Eu lamento informar que a senhora Leilah Lewis faleceu.

Senti meu mundo desabar e me ajoelhei e chorei por saber que nunca mais veria minha mulher. Minha mãe me abraçou, ela e meu pai tinham chegado um tempo antes para me fazer companhia. Mas, mesmo com seus braços, ainda me sentia desamparado e sozinho, pois o coração que fazia compasso com o meu, que guiava meus passos, já não batia mais. Não podia acreditar que nunca mais ouviria essas palavras de sua boca, que não teria mais seus sorrisos para alegrar meus dias e nem seus beijos para adoçar minha vida.

Minha vida tinha acabado naquele instante, por não ter mais comigo aquela a quem dei meu amor, minha alma e meu coração, aquela que dava brilho e cor a minha existência. A partir daquele dia, tudo se tornou preto, sombrio como eu me sentia.

Sem minha Leilah, não existia mais vida para mim.

Foi um mês bem difícil para mim depois da morte de Leilah, eu perdi qualquer vontade de viver, só lembrando de todos os momentos juntos, pensando nos dias que estivemos sonhando em sermos uma família. Esqueci-me completamente de minha promessa. Após o enterro afundei em uma terrível depressão, não saía de casa para nada, passava os dias trancado em meu quarto.

Essa situação só mudou depois de receber uma visita de minha avó, dona Dinah, chegou como uma força da natureza em minha casa e de certa forma, me salvou.

Todos estavam respeitando meu luto e me dando espaço que precisava, então foi uma grande surpresa quando vi minha avó entrando em minha casa. Eu não lhe via desde o enterro, e pensava que tinha retornado para sua viagem pela Europa, que ela havia interrompido quando Leilah adoeceu.

- Menino, alguma vez prestou atenção no que lhe ensinei? - Sua voz era firme, e não sabia o motivo da bronca.

- Vovó, eu sempre levei muito a sério o que me ensinou.

- Então por que está trancado dentro desta casa, quando prometeu a sua mulher que faria o oposto? É assim que ama a Leilah, lhe negando o descanso após tanta dor que ela passou?

Sua repreensão naquele momento doeu demais, pois sabia que ela estava certa, eu fiz uma promessa a Leilah em seu leito de morte e não estava cumprindo, estava apenas existindo e não vivendo como havia prometido. Eu não estava em meu sofrimento provando meu amor, pelo contrário, estava fazendo tudo que ela não desejava para mim. Leilah de algum modo sabia que seu momento estava chegando, e seu último desejo foi que eu vivesse bem, e eu prometi que faria isso.

Foi difícil ver isso, e saber que eu deveria cumprir a promessa que fiz e voltar a viver, pois não poderia desapontar a Leilah, e muito menos minha avó. Eu iria me reerguer.