- O que você quer me dizer? - Augusto me perguntou naquela noite, sua mão descendo e subindo pela minha perna.
Eu tinha passado o dia todo com medo do que ele me falaria. Não sabia se ficaria ao meu lado ou se iria embora com medo do que meu pai poderia fazer com nós dois. Nossa relação ainda não estava muito clara para mim, já que nós não colocávamos nossos sentimentos especificamente em palavras.
- Estou esperando um filho seu. - soltei de uma vez, sem conseguir olhá-lo nos olhos.
Imediatamente sua mão subiu para minha barriga.
- Está falando sério?
Criei coragem para olhar em seus olhos, e vi tanto amor e alegria que todos os medos desapareceram da minha mente – até mesmo os receios de morte com o parto que eu teria que passar.
Augusto ficou completamente radiante, as lágrimas escorrendo pelo seu rosto e um sorriso que iluminou a noite. Foi inevitável sorrir também, com alívio.
- Acredito que sim. Tenho quase certeza.
Ele me beijou com carinho, entre risadas e choros, e por um tempo nenhum de nós pensou em como as coisas precisariam ser daquele ponto em diante.
Mas, mesmo diante daquela nossa fantasia de amor e família, Augusto não era inocente. Ele sabia que precisávamos pensar no que fazer.
- Você acha que tem alguma chance de seu pai nos perdoar pelo que fizemos? – me perguntou algumas horas depois.
- Não acredito que meu pai vai ver nossa relação com bons olhos. – optei pela sinceridade total – Como todos aqui, ele...
- Acha que minha mãe acabou com a vida do meu pai. – ele completou em tom resignado.
- Mais ou menos isso. – encolhi os ombros, envergonhada por precisar admitir – E não somos casados.
Augusto passou a mão pelo meu rosto e me fez olhar para ele.
- Você acredita nessas mesmas coisas?
- Eu acho que ninguém culpa os homens. – olhei em seus olhos – Ninguém obrigou seu pai a sair com o barco e criar uma outra família.
Augusto sorriu, parecendo um pouco aliviado pelas minhas palavras, e me beijou suavemente.
- E quanto a parte de não sermos casados?
- Não pode ser mais pecado do que o que seu pai fez com a família.
Eu não sabia se estava indo longe demais, se ele veria aquilo como uma ofensa, mas decidi que Augusto deveria saber exatamente quem eu era – até mesmo meus pensamentos mais escondidos.
- Para mim é importante ter você como minha esposa. – ele não pareceu incomodado com as minhas palavras – Não porque precisamos corrigir um erro, mas porque você é a mulher que eu quero para a minha vida.
Abri a boca, mas não consegui formular uma frase.
Aquilo era um pedido de casamento? Eu não soube com certeza, mas a forma como ele acreditava no que estava falando, me fez sentir um amor imenso.
- Quer que eu fale com seu pai?
Quando Augusto se propôs a fazer algo tão incrivelmente perigoso, me dei conta de que nunca daria certo. Nós dois acabaríamos mortos.
Precisei falar para ele, com muita frieza, que meu pai jamais permitiria nossa união. Tentei colocar uma distância em tudo, como se estivesse falando de um estranho, e não do homem que tinha ajudado a me trazer ao mundo.
- Então nós temos que ir embora. – a voz dele, apesar de firme, estava muito preocupada – Quanto tempo temos antes de sua barriga aparecer?
- Acho que não muito. – senti um arrepio pela minha pele – Algumas poucas semanas, talvez.
Ele balançou a cabeça em sinal positivo, e me disse para ir para casa. Já era muito tarde e nós não precisávamos começar a arriscar além do habitual.
Naquela noite quase não dormi. Fiquei escutando o som do mar do lado de fora e pensando em como nós dois, que não tínhamos absolutamente nada, faríamos para ir embora para longe.
Na manhã seguinte, meu pai pegou meus dois irmãos e saiu para o mar. Era um dia ensolarado e com muito vento, e algumas horas depois aconteceu uma das piores tempestades que eu já tinha visto.
Eu e minha mãe passamos horas sentadas na frente da casa, esperando pelo momento que o barco aparecesse, mas isso nunca aconteceu.
Quando anoiteceu, e nenhuma de nós duas tinha se movido, eu simplesmente falei:
- Estou grávida.
Nem mesmo a olhei nos olhos, não tinha pensado que ia falar. As palavras saíram por vontade própria, e me causaram um alívio imenso. Talvez, depois da tragédia que tínhamos acabado de viver, essa notícia fosse uma esperança.
Eu nunca tinha sentido medo de minha mãe, nunca tinha cogitado que ela pudesse ser agressiva, mas ela voou para cima de mim com uma força além da esperada para uma mulher de sua estatura e peso.
Fiquei encolhida no chão, suportando tudo sem revidar, até que alguém a tirou de cima de mim.
Quando ergui os olhos, vi que era Augusto que a continha. Ele não se importava com os chutes que ela acertava nele, só se preocupava comigo.
- Eu amaldiçoo vocês dois! – minha mãe berrou antes de se soltar dos seus braços e correr em direção ao mar.
Eu tentei ir atrás, mas Augusto me segurou. O mar ainda estava agitado, a chuva caindo com toda força com raios e trovões. Rapidamente ela sumiu de nossas vistas.
Em um único dia, perdi toda a minha família.