Capítulo 2 O Eco das Almas

Em uma noite de verão, quase dois séculos após a tragédia que selou o destino de Aline e Rafael, as margens do rio resplandeciam sob o brilho da lua cheia. A festa anual que unia Valdoria e Eldrith ocorria mais uma vez, um evento aguardado por todos, onde as rivalidades históricas eram temporariamente esquecidas em prol da celebração da vida.

Entre os dançarinos e os risos, Amália, uma jovem de cabelos castanho-claros e um sorriso contagiante, passeava com um brilho de curiosidade nos olhos. Filha de um influente comerciante de Valdoria, ela sempre ouvira as histórias sobre o amor trágico que ali florescera, mas nunca imaginara que um dia o destino a colocaria em um caminho semelhante. Ao seu lado, Rui, um jovem de olhar intenso e porte confiante, era o filho de um nobre de Eldrith. A conexão entre eles era instantânea, como se um fio invisível os atraísse.

- Você já ouviu falar da lenda do rio? - perguntou Amália, com um toque de brincadeira na voz.

Rui sorriu, percebendo a faísca de paixão que surgia entre eles. - Claro, quem não conhece? Dizem que as almas de Aline e Rafael aparecem nas noites de lua cheia.

- Imagine como deve ser. Dois amantes, separados por um destino cruel... - Amália disse, seu olhar distante, quase sonhador.

Os dois se afastaram um pouco da multidão, em busca de um momento de privacidade. O murmúrio da festa era um pano de fundo suave, enquanto a correnteza do rio refletia a luz da lua. Ali, a atmosfera estava carregada de um magnetismo inexplicável.

- Sabe - Rui começou, sua voz baixa e séria -, sempre senti que havia algo especial neste lugar. Como se o rio carregasse os ecos de histórias que não se apagam.

Amália se virou para ele, a respiração suspensa. - Você acredita que o amor pode transcender o tempo?

- Acredito - Rui respondeu, seus olhos fixos nos dela. - O que aconteceu aqui é uma prova de que os sentimentos verdadeiros não morrem. Eles apenas esperam por uma nova oportunidade.

Enquanto as palavras flutuavam entre eles, uma leve brisa soprou, fazendo as tochas balançarem, criando sombras dançantes ao redor. O ambiente se tornava mais mágico a cada instante. Amália, impulsionada pela emoção, tomou a mão de Rui.

- Vamos nos afastar um pouco, só nós dois? - sugeriu ela, a voz tremendo de expectativa.

Ele concordou, e juntos caminharam em direção a um recanto mais tranquilo à beira do rio. O som da festa se dissipava, e o mundo ao redor parecia se silenciar, como se o próprio rio estivesse prestes a revelar seus segredos.

Ali, sob a luz suave da lua, Rui olhou nos olhos de Amália. A conexão entre eles era tão intensa que parecia carregar o peso das vidas passadas. Ele se inclinou lentamente, seus lábios a poucos centímetros dos dela.

- Amália, eu... - começou, mas não conseguiu terminar. O impulso de beijá-la era incontrolável.

Mas antes que pudessem se tocar, um som de risadas e música interrompeu o momento. O encantamento da noite foi quebrado, e a realidade se impôs novamente. Amália recuou, um misto de frustração e excitação.

- Precisamos voltar - disse ela, hesitante, mas seus olhos traíam o que seu coração desejava.

Rui assentiu, mas a chama da paixão ardia intensamente entre eles. Ao se aproximarem da festa novamente, um grupo de jovens começou a contar histórias sobre Aline e Rafael, rindo e dramatizando a tragédia de forma quase cômica. No entanto, Rui e Amália sentiram o peso da história que ecoava em suas almas.

Quando a música recomeçou, eles se entreolharam, ambos cientes de que algo extraordinário havia nascido entre eles naquela noite. Assim como Aline e Rafael, estavam destinados a viver um amor marcado pela tensão entre seus povos.

Ao final da festa, enquanto as estrelas brilhavam intensamente acima, Amália e Rui se separaram, mas não sem antes trocar um olhar carregado de promessas. A lenda agora tinha um novo capítulo, e o rio, que um dia foi testemunha de um amor trágico, guardava em suas águas a esperança de um reencontro, enquanto uma antiga profecia sussurrava que o amor entre cruz e espada ainda tinha muito a contar.