A noite estava densa, e o silêncio do apartamento só amplificava o turbilhão de pensamentos na mente de Sofia. Ela ficou sentada na cama por um longo tempo, a carta ainda aberta em suas mãos, os olhos fixos naquela assinatura que parecia gritar em letras maiúsculas: Romulo Lyher. O nome ecoava em sua cabeça, como um enigma que insistia em permanecer oculto. Quem era Romulo? Por que sua mãe, Ana, guardara aquela carta por tanto tempo, sem nunca mencionar o nome? E, o mais inquietante, o que ele tinha a ver com Marcelo, seu pai? Sofia sentiu o peso daquela chave prateada na palma da mão.
O metal frio parecia carregar um segredo que, até então, ela nem sabia que existia. Respirou fundo e decidiu enfrentar a única pessoa que poderia ter respostas: sua mãe. Desceu as escadas devagar, cada degrau rangendo sob seus pés. Encontrou Ana na sala, sentada no sofá, as mãos entrelaçadas no colo. Ela olhava para o nada, perdida em algum ponto distante do passado. - Quem é Romulo? - Sofia quebrou o silêncio, a voz firme, mas carregada de incerteza. Ana demorou a responder. Quando finalmente o fez, a voz saiu baixa, quase um sussurro. - Alguém que eu quis esquecer. - Não é suficiente, mãe. - Sofia se aproximou, sentando-se de frente para ela. - Você sempre me disse que fugimos por causa do meu pai. Que ele era perigoso. Violento. Agora aparece essa carta, e você não me diz nada? Ana fechou os olhos, como se estivesse reunindo forças. Quando os abriu novamente, havia uma tristeza profunda neles. - Seu pai, Marcelo, sempre teve um lado obscuro. Ele... não era o homem que você lembra. Havia segredos. Coisas que ele fazia... coisas que me fizeram fugir. Mas Romulo... - Ela parou, engolindo em seco. - Ele foi a razão de tudo começar a desmoronar. - O que você quer dizer com isso? - Sofia sentiu o coração acelerar. Ana olhou para a chave na mão da filha. - Aquela chave... abre um cofre no velho banco da cidade. O que está lá pode responder suas perguntas. - Por que você nunca me contou isso? - Porque eu queria te proteger. Mas agora... talvez seja a hora. Sofia assentiu, sem saber o que esperar. A decisão estava tomada: ela precisava voltar à cidade onde tudo começou. Na manhã seguinte, a viagem parecia um mergulho no desconhecido. A estrada sinuosa que levava de volta à cidade natal era familiar e ao mesmo tempo estranha. Cada quilômetro percorrido parecia aproximá-la de algo inevitável. Quando finalmente chegou, o peso da cidade antiga caiu sobre ela. As ruas de paralelepípedos, as casas com fachadas envelhecidas, tudo parecia congelado no tempo. A memória das noites de infância voltou com força, trazendo uma mistura de nostalgia e medo. O banco ficava no centro, uma construção antiga de paredes desgastadas. Sofia estacionou o carro e entrou, sentindo o frio do lugar se misturar com a ansiedade que queimava em seu peito. Um atendente a conduziu até uma sala nos fundos, onde o cofre estava localizado. Sofia tremia quando inseriu a chave na fechadura. Um clique metálico ecoou, e a porta pesada se abriu. Dentro do cofre, havia uma caixa de madeira. Sofia a pegou, sentindo o coração bater descompassado. Com as mãos trêmulas, abriu a tampa. O que viu a fez prender a respiração: fotografias antigas, cartas manuscritas e, no fundo, um diário de capa escura. Pegou uma das fotos. Era de sua mãe, jovem, ao lado de um homem que não era Marcelo. Um homem de olhar intenso, sorriso enigmático. Romulo. Sofia folheou o diário. As primeiras páginas eram cartas de amor, escritas por sua mãe, destinadas a Romulo. Mas, conforme avançava, o tom das páginas mudava. O amor dava lugar a um medo crescente. "Romulo está diferente. Obsessivo. Ele fala sobre coisas que não entendo. Marcelo tentou alertar, mas agora não sei mais em quem confiar." As peças começaram a se encaixar. Romulo não era apenas uma sombra do passado. Ele fora uma ameaça real, algo que mudou o destino de sua família. Mas havia algo mais. Algo que ainda escapava. No fundo do diário, uma última anotação: "Se algo acontecer comigo, não acredite em tudo que ouvir. A verdade está entrelaçada com mentiras. Romulo e Marcelo... eles sabiam. Só espero que Sofia nunca precise descobrir." As palavras queimaram na mente de Sofia. O que sua mãe nunca quis que ela descobrisse? O que havia entre Romulo e Marcelo? De repente, o som de passos a fez virar. Um homem estava parado na entrada da sala. Alto, com traços familiares. - Sofia. - A voz era rouca, quase um eco do passado. - Quem é você? - perguntou, o coração disparado. - Eu sou Romulo. A verdade estava mais perto do que ela jamais imaginou.