Capítulo 5 Segredos na Cozinha

Capítulo 5 – "Segredos na Cozinha"

(Narrado por Lara Torres)

O cheiro de alho refogando em azeite invadia minha pequena cozinha, um aroma que sempre teve o poder de acalmar meus pensamentos mais tumultuados. Era o fim de tarde, a luz dourada entrava pela janela acima da pia, tingindo o ambiente com uma serenidade quase ilusória. Depois da noite passada, minha mente parecia um turbilhão.

A dança, os olhares insistentes e, principalmente, a presença esmagadora de Evan Montenegro ainda estavam frescos na minha memória. Mas agora, aqui, no meu espaço, eu tinha controle. Pelo menos era o que eu dizia a mim mesma enquanto cortava os vegetais com movimentos precisos.

Minha cozinha era o meu refúgio. Pequena, mas organizada, cada utensílio tinha seu lugar. A parede era decorada com azulejos coloridos que herdei da minha avó, e a mesa de madeira no centro do cômodo tinha marcas de anos de uso. Tudo nela era acolhedor e familiar, diferente do mundo glamoroso que Evan parecia carregar consigo.

Peguei um punhado de ervas frescas, sentindo a textura nas pontas dos dedos, e me forcei a respirar fundo. Cozinhar era meu escape, meu modo de recalibrar. Mas, no fundo, eu sabia que estava apenas adiando o inevitável confronto comigo mesma.

Minha campainha tocou.

Eu congelei, a faca suspensa no ar. Quem poderia ser? Não esperava visitas, e meu círculo de amigos íntimos era pequeno demais para surpresas.

Deixei os vegetais na tábua, enxuguei as mãos em um pano de prato e fui até a porta. Ao abri-la, meu estômago deu um nó.

– Evan? – O nome escapou dos meus lábios como uma mistura de incredulidade e exasperação.

Ele estava ali, de pé no corredor, trajando um suéter preto de gola alta que contrastava perfeitamente com seus olhos castanhos. As mangas estavam ligeiramente dobradas, revelando seus antebraços, e ele segurava uma garrafa de vinho tinto na mão.

– Posso entrar?

– Isso é uma pergunta ou uma afirmação? – retruquei, cruzando os braços.

Ele sorriu, aquele sorriso irritantemente confiante que parecia ser sua marca registrada.

– Você não me deixaria aqui fora, deixaria?

Eu deveria. Honestamente, deveria mesmo. Mas algo na forma como ele me olhava, como se já soubesse que eu abriria espaço, me irritava e me fascinava ao mesmo tempo.

– Entre – cedi, dando um passo para o lado.

Ele passou por mim, e o ambiente acolhedor da minha casa pareceu encolher em sua presença.

Ao entrar na cozinha, Evan olhou ao redor, sua expressão avaliando cada detalhe do espaço.

– A cozinha é exatamente como eu imaginei.

– Pequena? – perguntei, fechando a porta.

– Não. Cheia de personalidade – ele respondeu, colocando a garrafa de vinho sobre a mesa.

Revirei os olhos e voltei para o balcão, retomando meu trabalho como se ele não estivesse ali. Mas sua presença era impossível de ignorar. Ele se aproximou, apoiando-se na bancada ao meu lado, observando enquanto eu cortava os vegetais com precisão.

– Precisa de ajuda? – perguntou, o tom casual.

– Você sabe cozinhar? – minha voz carregava um tom de descrença.

– Sei o suficiente para não queimar uma cozinha – ele respondeu, pegando uma das facas da bancada.

– Não toque nisso – falei, quase instintivamente, tirando a faca de sua mão. – Essa faca é afiada demais para amadores.

– Você acha que eu sou um amador em tudo, não é? – Ele parecia mais divertido do que ofendido.

– Prove que estou errada. – Empurrei para ele uma tigela com alho por descascar.

Ele aceitou o desafio com um sorriso. Era estranho vê-lo naquele contexto, tão diferente do CEO controlado que conheci. E, para minha surpresa, ele parecia confortável, quase à vontade.

– Você está sempre assim? – perguntei, sem conseguir evitar.

– Assim como?

– Irritantemente confiante.

Ele riu, um som baixo e genuíno que reverberou na cozinha.

– Apenas quando estou certo de algo.

– E do que você está certo agora?

Ele parou por um momento, segurando um dente de alho entre os dedos, e me olhou diretamente nos olhos.

– De que você é muito mais interessante do que deixa transparecer.

Meu coração deu um salto inesperado, mas mantive a expressão neutra.

– Continue descascando o alho, Evan.

Conforme trabalhávamos juntos, a atmosfera começou a mudar. A tensão que parecia sempre pairar entre nós deu lugar a algo mais leve. Ele fez piadas ruins sobre culinária, e, para meu desgosto, eu ri de algumas delas.

Quando o alho estava pronto, decidi ensinar-lhe algo simples.

– Tudo bem, agora vamos refogar isso. Pegue a frigideira.

Ele obedeceu, mas quando tentou despejar o alho, fez um movimento desajeitado, derrubando metade no balcão.

– Incrível – zombei, tentando não rir. – Você realmente é um desastre.

– Ei, todo gênio tem suas falhas – retrucou, pegando os pedaços caídos.

A cozinha parecia menor enquanto nos movíamos lado a lado. Em um momento, ao pegar uma faca que ele havia deixado no lugar errado, nossas mãos se tocaram.

Foi um toque breve, mas o suficiente para fazer o ar parecer mais pesado. Olhei para ele, e sua expressão tinha mudado. Não havia mais brincadeiras, apenas algo mais intenso que eu não conseguia identificar completamente.

– Lara – ele começou, mas eu recuei, quebrando o contato.

– O alho vai queimar – murmurei, voltando minha atenção para a frigideira.

Mas minha mente estava longe. Eu podia sentir o calor do toque dele ainda presente, como uma marca invisível.

Quando a comida finalmente ficou pronta, ele insistiu em provar. Sentamos à mesa, e por um momento, quase parecia normal. Mas eu sabia que não era.

Enquanto ele saboreava o prato com um sorriso satisfeito, eu tentava ignorar a sensação crescente de que estava começando a baixar minha guarda.

E isso era perigoso.

– Boa comida e boa companhia – ele comentou, erguendo a taça de vinho.

Eu não respondi, mas não consegui evitar um pequeno sorriso.

Quando ele finalmente foi embora, fiquei sozinha na cozinha, olhando para a mesa onde ele esteve minutos antes.

E pela primeira vez, me perguntei se realmente queria vencer esse jogo.