E como ainda estava cedo, os alunos não haviam chegado. Mas aproveitei para ir conhecendo o lugar. Quando pisei o pé dentro daquele ambiente fiquei muito encantada com todo aquele capricho, não estava diferente de uma escola num bairro bom do RJ, o dono daqui deve realmente amar educação.
- Você deve ser a professora nova não é? - Uma mulher de aparentemente cinquenta anos disse com um sorriso sincero.
- Bom dia, tudo bem? Sou! Meu nome é Lívia Azevedo - Estendo minha mão satisfeita.
- Seja bem vinda Lívia, espero que sua passagem aqui seja duradoura, meu nome é Ana e sou a diretora desse colégio a quase trinta anos. - ela confessa.
- Obrigada, será um prazer! Mas porque Maria de Lourdes? - Pergunto curiosa.
- Maria de Lourdes foi a primeira professora do morro, graças a ela alguns moradores aqui conseguiram se alfabetizar - Explicou. - Bom Lívia, não sei se te informaram mas você vai ficar com os pequenos de quatro a cinco anos, eles estão sem ninguém.
- Informaram sim, agradeço imensamente a sua confiança em mim.
- Vou mostrar sua sala, daqui a pouco todos chegam tudo bem? - Assinto e ela me acompanha até a sala, também já aproveitou e mostrou todos os cômodos da escola, apesar de ser linda não é tão grande como imaginei, a Ana me explicou que esse é um colégio do ensino fundamental um e que as séries próximas são feitos em outra escola fora do morro.
Quando ela apresentou a minha sala de aula fiquei abismada quando notei que a antiga professora não colava nada nas paredes pra melhor entendimento dos pequenos.
- Você pode se acomodar aqui Lívia, mas tarde volto com as crianças – Ela afirmou simpática mas logo saiu.
Eu tinha uma mesa grande, um quadro e vinte alunos e muita fé para dar o meu melhor. Fiquei muito ansiosa não vou negar, e quando ouvi que eles estavam vindo fiquei de pé e esperei que eles entrassem todos em fileiras.
Eram realmente crianças pequenas, a maioria eram meninas pra ser mais exata, mais só quando eles sentaram perceberam a minha presença ali.
- Crianças, essa é a tia Lívia, é ela que vai ficar com vocês apartir de hoje.
- Obrigada por tudo Ana - Agradeci e ela saiu da sala.
Quando fechei a porta senti aqueles olhinhos pequenos em cima de mim.
- Meu nome é Lívia mas podem me chamar de tia Liv tudo bem? eu estava muito ansiosa para conhecer vocês - Disse com uma voz calma.
Fiz algumas brincadeiras logo após para conhecer melhor cada um. E uma menininha de cabelos dourados cacheados me chamou bastante atenção, ela parecia não gostar muito de brincar.
- Raissa? Tudo bem com você tia? - Perguntei carinhosa mas ela ficou em silêncio.
- Você está dodoi? - Perguntei esperançosa.
- Me dexla in paz tia - Ela disse séria mas mesmo assim não consegui segurar o riso.
- Tudo bem princesa, estarei aqui se precisar.
E assim os dias foram passando, confesso que no começo não foi fácil, todos do morro pareciam me olhar estranho. Mas eu não dava importância pra isso.
Até que chegou o dia do meu primeiro "acidente" com os alunos, numa brincadeira durante o recreio dois pequenos acabaram se esbarrando sem querer e os dois cairam de joelhos ralados, conversei com a mãe do Pedro e expliquei o que aconteceu, ela entendeu e foi super gentil comigo, e agora estou aqui na sala esperando o tio da Raissa para falar com ele, a Ana me disse que ela perdeu a mãe a dois anos num acidente de carro, e que nunca soubemos quem era o pai da menina.
- Tia, tá dodói - Ela me chamou com os olhinhos cheio de lágrimas.
- Agente já limpou tudo meu amor, vai ficar bom logo logo - Expliquei pra ela que entendeu.
Tomei um susto quando a porta foi aberta com muita força, claramente era o tio da Raissa e como podemos ver ele não tem um pingo de educação, mas era extremamente gato, aí meu Deus Lívia, quando foi que tu virou uma Cláudia da vida.
- O que aconteceu tio, quem fez isso com você Raissa? O tio não vai deixar isso passar em branco princesa - Ele repetia e eu não me contive.
- Foi só um acidente, a outra criança não teve culpa - Falei séria, e só aí ele percebeu a minha presença ali.
- Tu é professora dela? onde tu tava que deixou minha sobrinha se machucar assim?
- Foi um acidente no recreio, todos os alunos passam por isso um dia - Tento explicar mas os olhos dele eram de fúria pra mim.
- Todos e o caralho mina, te pago bem pra porra e tu deixa isso acontecer com a minha sobrinha, sabe com quem tá falando?
- Com essa arrogância, já imagino quem seja - Retruco séria
- Devia abaixar tua bola patricinha, me disseram que ia mandar uma professora boa pra cá, e não uma boca aberta que não consegue cuidar de dez crianças - Eu ri.
- Senhor, acho melhor você falar com a senhora Ana, você não entenderia minha língua não é mesmo? - Debochei, se tem uma coisa que eu não sou é puxa saco.
- Quem vai falar com ela sou eu sacô, não te quero mais na porra do meu morro - Ele diz sério e eu apenas ouço.
- Tio, eu goto da tia Liv, não foi cupla dela,eu e pedo tava correndo rapidlo - Raissa diz segurando na mão dele, e foi como se toda aquela raiva sumisse do nada.
- Caramba Raissa, o tio já falou que não é pra correr pow - Ele a repreendeu, e me olhou em seguida.
- É melhor não deixar isso acontecer de novo tá ligada - ele disse, mas não me contive e acabei revirando os olhos pra ele.
- Tu não te medo de morrer mesmo não né mina? qual foi? tu já viu alguém revirar os olhos pro chefe - disse travando o maxilar.
- Na minha sala de aula, quem manda sou eu - Falei com um sorriso no rosto.
- Nossa conversa ainda não acabou beleza? Preciso levar a cria pra casa - Ele disse saindo dali com a Raissa, mas apesar de ser um ogro arrogante ele era muito mais gato que o tal de JP do outro dia.