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O céu já não era silêncio.
Por eras incontáveis, as estrelas haviam sussurrado entre si em códigos sutis, orbitando em harmonia tênue, mesmo quando rivais. Mas agora, gritos cortavam o vazio. Lanças de luz viajavam em linhas retas, perfurando nebulosas, arranhando o tecido da calma celeste.
O amor entre Nayla e Elios havia sido a centelha. A guerra, o incêndio.
Na superfície de uma lua esquecida, camuflado por poeira cósmica, Elios se preparava. Vestia uma armadura leve, feita com filamentos de aurora, presente de Lyara. Seus olhos queimavam, mas seu rosto estava sereno.
- Está certo disso? - Lyara perguntou, posicionando-se ao lado dele. A túnica dela ondulava mesmo sem vento.
- Não vim até aqui pra desistir. Nayla está presa. Meu pai quer que ela apodreça. Eu... eu não deixarei.
- E se Lunara resistir?
- Então lutarei. Mas não contra a Lua. Apenas contra a tirania.
Atrás de Elios, um pequeno grupo de estrelas errantes e exiladas aguardava. Todos eles tinham cicatrizes: por amores proibidos, ideias reprimidas ou por simplesmente ousarem sonhar diferente. Agora, todos tinham um motivo para lutar.
No Palácio Lunar, Nayla escutava os rumores atravessarem as paredes encantadas.
- Ele está vindo - sussurrou para si mesma, pela milésima vez. - Meu amor vem pelo céu.
A cela que a mantinha não tinha trancas visíveis. Era feita de energia sólida, criada pela própria Lunara. Mas Nayla conhecia a Lua. Sabia que tudo ali era comandado pelo ciclo das emoções.
E naquele dia, Lunara estava desequilibrada.
Quando a mãe entrou na cela, Nayla se virou, firme.
- O céu vai tremer hoje.
- Já treme - respondeu Lunara, seca. - Mas será por minha vontade, não por tua ilusão.
- Não é ilusão. Ele me ama. E eu o amo.
- Amor não é suficiente, Nayla. Nem sempre salva.
- Mas às vezes é o que começa tudo.
Lunara fechou os olhos. Por um segundo, parecia ver o próprio passado. A irmã morta. As promessas desfeitas. Os beijos dados nas sombras, exatamente como Nayla e Elios haviam feito.
- Eu não perderei você também - murmurou, e saiu sem olhar para trás.
Horas depois, os céus se abriram.
O primeiro ataque veio do lado solar.
As Espadas de Luz, moldadas nas Fornalhas Interiores, cortaram a escuridão. Raios dourados atravessaram a atmosfera lunar, tentando quebrar as barreiras encantadas. As muralhas brilharam, absorvendo parte da energia, mas uma rachadura se formou no escudo exterior.
Nas torres de vigilância, sentinelas lunares convocavam as tropas com tambores de vento.
Lunara apareceu no alto da cidadela, os braços erguidos.
- Estrelas da Noite! Protejam nossa casa! Que a Lua não se curve ao Sol novamente!
Milhares de guerreiras de prata tomaram os céus, formando formações geométricas que reluziam como flocos de neve. Cada uma empunhava lanças feitas de poeira estelar e escudos de marfim lunar.
O impacto foi imediato.
Luzes colidiram em todas as direções. Raios contra lâminas. Ondas de calor contra escudos de gelo. O céu virou palco de um espetáculo devastador. Constelações próximas apagaram-se, ofuscadas pela guerra. Cometas mudaram de curso, e buracos de energia se abriram nas dobras do espaço.
Elios, enquanto isso, avançava pelas cavernas internas da Lua com Lyara e seus aliados. Eles usavam rotas esquecidas, criadas na época da Rebelião das Três Coroas.
- Por aqui - sussurrou Lyara, abrindo um véu encantado com as mãos. - A cela dela está próxima.
Elios correu.
Nayla sentiu quando a prisão tremeu.
- Ele está aqui...
A cela brilhou de um modo diferente. Um canto da parede cintilou. E então, como se o universo a escutasse, um rasgo de luz surgiu.
Elios emergiu do brilho, suado, ferido, mas inteiro.
- Nayla!
Ela correu para ele. O campo de energia ainda os separava.
- Toque a parede com o coração. Literalmente - gritou Lyara atrás.
Nayla encostou o peito contra a barreira. Elios fez o mesmo. E a cela se desfez em partículas brilhantes, como se o amor fosse a chave final.
Eles se abraçaram com força, como quem volta para casa. O beijo veio depois - intenso, desesperado, mas terno.
- Você veio - disse Nayla.
- Sempre virei.
- Temos que sair. Lunara vai sentir.
- Então vamos voar.
Mas o tempo não era mais aliado.
Lunara já sabia.
Ela apareceu diante deles envolta em véus de lua crescente, os olhos fervendo em lágrimas que não caíam.
- Você veio, Elios.
- Não por guerra. Mas por ela.
- Você libertou minha filha.
- E ela me libertou de tudo o que eu fui forçado a ser.
Lunara hesitou.
- Eu não quero perder você, Nayla...
- Então me aceite com quem eu amo, mãe. Não tente me apagar.
- Você é feita de sombra e ternura, minha filha... mas a guerra já começou. E não há mais como impedi-la.
Nayla segurou a mão de Elios com mais força.
- Então nos deixe ir.
Lunara se virou, os olhos marejados.
- Fujam. Pelo corredor das marés. Mas corram.
Elios e Nayla saíram, seguidos por Lyara. E enquanto atravessavam o corredor de cristais, a guerra no céu se intensificava.
No espaço próximo à Lua, o confronto explodia em ondas de poder.
As tropas solares tentavam invadir as camadas externas. Guerreiros de luz pura abriam brechas, mas eram repelidos por miríades de guerreiras lunares.
Um guerreiro solar avançou demais, rompendo a barreira prateada. Uma lança de gelo o atingiu no peito, e sua luz se apagou.
Gritos ecoaram. Explosões pulsavam como batidas de um coração violento.
No alto, Solaris surgiu montado em sua Esfera Solar. Seu corpo inteiro reluzia como um sol em miniatura.
- Lunara! Entregue-me o traidor do meu sangue! Ou sua Lua será feita cinzas!
Lunara, flutuando acima de sua torre, respondeu com a voz firme:
- Então venha, Solaris. E tente me apagar.
E então, os dois antigos amantes, agora inimigos mortais, avançaram um contra o outro.
Enquanto isso, Elios, Nayla e Lyara chegaram ao final do corredor. Um portal se abria diante deles - o caminho para o Éter Silencioso, onde talvez pudessem construir sua própria luz, longe da guerra.
Mas atrás deles, passos.
Solaris os havia seguido.
- Não! - bradou Nayla, tentando proteger Elios.
- Saia da frente, garota da Lua. Ele está sob teu feitiço.
- Não há feitiço, pai - gritou Elios. - Só amor. E coragem.
- Então prove - disse Solaris, e lançou uma onda de fogo estelar.
Elios ergueu os braços, mas Nayla se colocou à frente dele, criando uma barreira de sombra e luz. O impacto explodiu ao redor, mas o casal permaneceu de pé.
- Ela me salvou - disse Elios, ofegante. - Como pode chamar isso de traição?
Solaris hesitou. Pela primeira vez, viu algo em seus olhos que não era raiva. Era medo.
- Eu não quero perder você - murmurou.
- Então me deixe ir. Ou verá sua luz me destruir.
Solaris ficou imóvel. Depois, abaixou o braço.
Mas ao longe, as tropas continuavam lutando. A guerra já era maior do que eles.
E então, Nayla e Elios atravessaram o portal.
No céu, a guerra prosseguia, mas algo havia mudado. As estrelas começavam a questionar.
- Por que lutamos mesmo? - perguntavam os soldados errantes, os cometas antigos, os mundos esquecidos.
E uma resposta sussurrava entre as constelações:
- Por orgulho. Não por justiça.
Lunara e Solaris voltaram às suas fortalezas. Ambos sabiam: perderam seus filhos... mas talvez tenham dado a eles um novo céu.
E Nayla e Elios, agora livres, desapareceram no Éter, prontos para criar um lar onde amor não fosse crime, onde a luz e a sombra pudessem dançar juntas - como sempre desejaram.