Renascer das Cinzas: O Voo de Clara
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Capítulo 3

O silêncio na sala do hospital era mais pesado do que o betão que me tinha prendido.

Inês olhou para mim como se eu tivesse blasfemado.

"Divórcio? Tu perdeste o juízo? Depois de tudo o que o Leo fez?"

"O que é que ele fez?" perguntei, a minha voz perigosamente calma. "Ele deixou o meu pai morrer e o nosso filho por nascer morrer para poder salvar a amiga."

"Não sejas tão dramática," disse Inês, agitando a mão com desdém. "A Sofia estava sozinha e aterrorizada. Tu tinhas o teu pai contigo."

Tinha o meu pai comigo. A morrer.

"Ela é uma menina frágil," continuou Inês, a sua voz a suavizar quando falava de Sofia. "Ela precisa de proteção. Tu sempre foste a forte, Clara. Eu pensei que tu entenderias."

Eu entendia perfeitamente.

Eu era a esposa conveniente, a forte, a que aguentava tudo. Sofia era a donzela em perigo, a que merecia ser resgatada.

Leo ficou ao lado da sua mãe, o seu silêncio uma concordância. Ele deixou-a lutar as suas batalhas.

"Onde está a Sofia agora?" perguntei, a minha pergunta a pairar no ar.

"Ela está no quarto ao lado," disse Leo, evitando o meu olhar. "A mãe dela está a caminho. Ela partiu o tornozelo."

Um tornozelo partido.

O meu pai estava no necrotério. O meu filho nunca chegou a respirar.

"Quero que saiam," disse eu.

"Clara, não sejas assim," começou Leo.

"Saiam," repeti, a minha voz a ganhar uma força que eu não sabia que tinha. "Peguem nas vossas desculpas e na vossa heroína e saiam do meu quarto."

Inês bufou. "Vês, Leo? Eu disse-te. Ela nunca te apreciou. Sempre a pensar nela mesma."

Ela agarrou no braço do Leo e puxou-o para a porta.

"Vamos, querido. Deixa-a ter o seu ataque de nervos. Ela vai voltar a rastejar quando perceber o que perdeu."

A porta fechou-se atrás deles.

Eu olhei para a parede branca. Para o lençol liso sobre o meu ventre.

Rastejar?

Não.

Eu ia aprender a andar de novo. Sozinha.

Peguei no meu telemóvel, o ecrã partido um reflexo do meu próprio estado. Encontrei o contacto de uma advogada de divórcios que uma colega me tinha recomendado há anos, por uma piada.

Enviei uma mensagem.

"Preciso de ajuda. Quero o divórcio."

A resposta veio quase imediatamente.

"Estou aqui para si. Quando estiver pronta."

Eu estava pronta.

                         

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