Ele entrou no quarto com um ar cansado e irritado. Tinha a roupa suja e o cabelo molhado.
"Finalmente", disse ele, sem sequer olhar para mim. "Não imaginas o caos que está lá fora. A casa da Clara ficou destruída. Tive de a levar a ela e ao Max para um hotel."
Ele falava como se tivesse sido o herói de uma grande aventura.
A minha mãe olhou para ele, depois para mim, e para a minha barriga lisa. A sua expressão endureceu.
"Tiago", disse a minha mãe com uma voz fria que eu raramente ouvia. "Onde estavas quando a tua mulher quase morreu?"
Ele finalmente olhou na minha direção. A sua expressão mudou de irritação para uma ligeira surpresa, como se só agora tivesse reparado no ambiente do quarto.
"O que se passa? Estás bem, Sofia? Os médicos disseram alguma coisa?"
Ele aproximou-se da cama.
Eu olhei para ele. O homem com quem me casei. O pai do meu filho morto.
"O bebé morreu, Tiago."
Disse as palavras de forma clara e sem emoção. Queria que elas o atingissem com a força de um soco.
Ele parou. Piscou os olhos, confuso.
"O quê? Como assim, morreu? O que é que fizeste?"
O que é que eu fiz?
A pergunta ecoou no silêncio do quarto. A minha mãe deu um passo em frente, furiosa, mas eu levantei a mão para a impedir.
Isto era entre mim e ele.
"Eu liguei-te, Tiago. Pedi ajuda. Disse que estava presa e que a água estava a subir. E tu desligaste o telefone para ires salvar a Clara e o cão dela."
"Isso não é justo!", ele explodiu, a sua voz a encher o pequeno quarto. "Eu disse-te para ligares para os bombeiros! Como é que eu podia adivinhar que isto ia acontecer? A Clara também estava em perigo!"
"Ela estava em casa dela, do outro lado da cidade. Eu estava a afogar-me num túnel com o teu filho na minha barriga!", a minha voz subiu pela primeira vez. "Mas o cão dela era mais importante."
"Não fales assim! Não sejas dramática", ele disse, passando as mãos pelo cabelo, frustrado. "Foi uma situação terrível para todos. Não podes culpar-me por isto."
Olhei para ele, para o seu rosto que de repente se tornara o de um estranho. Não havia tristeza nos seus olhos. Não havia remorso. Apenas irritação por estar a ser acusado.
"Quero o divórcio, Tiago."
As palavras saíram calmas e firmes.
Ele riu. Uma risada curta e incrédula.
"Divórcio? Estás a brincar? Estás a passar por um choque, não estás a pensar bem. Vamos para casa, descansamos e depois falamos."
"Não há nada para falar", respondi. "Acabou."