Não fui para casa. A nossa casa. A casa onde o quarto do Leo estava exatamente como ele o tinha deixado de manhã, com os seus carrinhos espalhados pelo chão.
Não conseguia.
Fui para um hotel barato no centro da cidade. Paguei em dinheiro. Não queria que o Pedro me encontrasse.
O quarto cheirava a mofo e a tristeza antiga. Sentei-me na beira da cama e finalmente chorei.
Não foram soluços altos, mas lágrimas silenciosas que rolavam pela minha cara, deixando rastos frios na minha pele suja.
Chorei pelo meu filho. Pela sua risada, pelo seu cheiro, pelo calor da sua mão na minha.
Chorei pela vida que me foi roubada.
Chorei pelo homem que amei, que se revelou um estranho.
No dia seguinte, o meu telemóvel não parava de tocar. Chamadas do Pedro, mensagens da Elvira.
"Inês, volta para casa. Precisamos de organizar o funeral."
"Onde estás? Estás a ser egoísta. Isto não é só sobre ti."
"A Sofia acordou. Ela está a perguntar por ti e pelo Leo. Não lhe contámos ainda. Não queremos perturbá-la."
Essa última mensagem fez o meu sangue gelar.
Não queriam perturbá-la.
A assassina do meu filho estava a ser protegida da verdade, para que pudesse recuperar em paz.
Uma raiva, pura e dura, substituiu a minha dor.
Desliguei o telemóvel.
Precisava de um plano. O divórcio era o primeiro passo. Mas não era suficiente.
Eu queria justiça.
Se o sistema não lha desse, eu encontraria uma maneira.
Liguei a um velho amigo da faculdade, o Tiago, que agora era advogado. Expliquei-lhe a situação, a minha voz surpreendentemente firme.
"Quero o divórcio," disse-lhe. "E quero processar a Sofia Alves por homicídio por negligência."
Houve um silêncio do outro lado da linha.
"Inês," disse o Tiago, cautelosamente. "Isso vai ser difícil. Provar que ela estava ao telemóvel... a menos que tenhas uma testemunha..."
"Eu era a testemunha," respondi.
"A palavra de uma esposa em processo de divórcio contra a irmã do marido... O advogado deles vai destruir-te em tribunal. Vão dizer que estás a agir por vingança."
"E não estou?" perguntei, a minha voz cheia de veneno. "Ela matou o meu filho, Tiago. Vingança parece-me pouco."
"Ok, Inês. Ok. Encontra-nos no meu escritório amanhã. Vamos ver o que podemos fazer."
Desliguei e senti a primeira centelha de controlo em dias.
Eles pensavam que eu era fraca. Que eu ia desmoronar.
Estavam enganados.
Tinham tirado tudo de mim. Não me restava nada a perder.