"Por favor. Eu só quero explicar. Não quero ser a causa do vosso sofrimento."
Suspirei. Parte de mim queria dizer-lhe exatamente o que pensava dela. A outra parte sabia que não valia a pena.
Escolhi o silêncio.
No sábado, fui visitar a minha avó. Ela estava sentada na varanda, a apanhar sol. Parecia muito melhor.
"O teu telemóvel não para de tocar," ela disse, apontando para a minha mala.
Era o Léo. Recusei a chamada.
"Ele tem ligado todos os dias," eu disse.
"Persistência não é o mesmo que arrependimento," disse a minha avó sabiamente.
Ficámos em silêncio por um tempo, a observar os pássaros no jardim.
"Sabes," ela começou, "o teu avô, quando o conheci, ele trabalhava nas docas. Um dia, ele prometeu levar-me ao cinema. Mas houve um acidente no trabalho, um amigo dele magoou-se gravemente."
Ela fez uma pausa, a sua mente a viajar no tempo.
"Ele não apareceu. Fiquei furiosa. Mas uma hora depois, um rapazinho veio a correr com um bilhete dele. Estava sujo de graxa. Dizia apenas: 'Não posso ir. O Manuel precisa de mim. Mas estou a pensar em ti. Amo-te'."
Ela sorriu com a lembrança.
"Ele não me deixou à espera sem uma palavra, Inês. Ele encontrou uma maneira de me dizer que eu era importante, mesmo quando ele não podia estar lá. Isso é a diferença."
As lágrimas encheram os meus olhos. Era exatamente isso.
Eu não era importante o suficiente para o Léo sequer pensar em enviar uma mensagem.
Quando voltei para o apartamento da minha avó, havia alguém à minha espera na porta do prédio.
Era a Bia.
Ela parecia pequena e frágil, com grandes olhos tristes.
"Inês," ela disse, a sua voz a tremer. "Eu precisava de falar contigo."
Senti uma onda de irritação.
"Bia, eu não tenho nada para te dizer."
Tentei passar por ela, mas ela bloqueou o meu caminho.
"Por favor. O Léo está a destruir-se. Ele não come, não dorme. Ele ama-te tanto."
"Se ele me amasse, não estaria contigo enquanto a minha avó desmaiava."
As palavras saíram mais duras do que eu pretendia.
Os olhos dela encheram-se de lágrimas.
"Não foi culpa dele! Eu tive um ataque de pânico! Eu pensei que ia morrer! Ele salvou-me!"
"Ótimo para ti," eu disse, a minha paciência a esgotar-se. "Agora, se me dás licença."
"Tu não entendes," ela soluçou. "Eu não tenho ninguém. Desde que os meus pais morreram, o Léo é tudo o que eu tenho. Ele é o meu porto seguro."
"Ele era o meu noivo," retorqui. "Ele devia ser o meu porto seguro. Mas o teu porto parece que tinha prioridade."
Ela olhou para mim, as lágrimas a escorrerem pelo seu rosto.
"Tu és tão fria. Como podes ser tão insensível?"
Eu ri. Uma risada curta e amarga.
"Eu sou insensível? Eu passei cinco anos a ver o meu noivo a correr para ti por cada pequeno problema. Eu consolei-o quando tu estavas triste. Eu aceitei-te na nossa vida porque ele pediu. E agora eu sou a insensível porque finalmente me cansei? Não, Bia. Eu não sou insensível. Eu apenas comecei a valorizar-me."
Dei a volta e entrei no prédio, deixando-a a chorar na calçada.