"Eu quero o divórcio."
As palavras saíram da minha boca, diretas e sem hesitação.
O silêncio no quarto do hospital foi pesado e súbito.
O Tiago olhou para mim como se eu tivesse enlouquecido. "O quê? Divórcio? Estás a falar a sério?"
O Artur deu um passo à frente, o rosto vermelho de fúria. "Eva! Que raio de disparate é este? Depois de tudo o que o Tiago fez por ti? Depois desta tragédia, é assim que reages? Com egoísmo?"
"Egoísmo?" Ri, um som seco e sem alegria. "Ele deixou-me afogar para ir ter com a irmã. O meu filho morreu por causa disso. E eu sou a egoísta?"
"Isso é uma acusação horrível!" gritou o Tiago, a sua fachada de calma a estilhaçar-se. "Eu salvei uma vida! A Lia podia ter morrido naquela estrada!"
"E eu? E o teu filho? Não contávamos?"
"Para de ser tão dramática!" rosnou o Artur. "O Tiago é um herói! Tu devias estar orgulhosa dele, não a tentar destruir a família por causa de um acesso de raiva!"
Olhei para a minha mãe. Ela continuava em silêncio, a cara pálida. O seu silêncio era uma faca no meu peito. Ela estava a escolher o marido em vez da filha.
"A família já está destruída," disse eu, a minha voz firme. "Foi destruída no momento em que ele desligou o telefone na minha cara."
Virei-me para o Tiago. "Saiam. Os dois. Quero que saiam daqui agora."
"Eva, não sejas ridícula," começou o Tiago.
"Eu disse para saírem!" gritei, a minha voz a ecoar no quarto estéril. "Se não saírem, eu chamo a segurança."
O Artur olhou para mim com puro desprezo. "Vais arrepender-te disto, miúda. Vais ficar sozinha e não vais ter nada."
Ele agarrou no braço do Tiago e puxou-o para a porta.
"Vamos, filho. Ela não está a pensar bem. Deixa-a acalmar."
Antes de sair, o Tiago olhou para trás, não com tristeza, mas com raiva. "Não penses que vou facilitar as coisas para ti. Tu é que estás a começar esta guerra."
A porta fechou-se, deixando-me sozinha com a minha mãe.
Ela finalmente olhou para mim, com lágrimas nos olhos. "Eva, talvez devesses reconsiderar... O Artur..."
"Não," cortei-a. "Não digas o nome dele. E se não me vais apoiar, também podes sair."
Ela recuou como se eu lhe tivesse batido. Depois de um momento, levantou-se e saiu do quarto sem dizer mais uma palavra.
O silêncio que se seguiu foi absoluto.
Eu tinha perdido o meu filho, o meu marido, o meu padrasto e a minha mãe, tudo no mesmo dia.
Mas, pela primeira vez em muito tempo, senti que conseguia respirar.