Uma Borboleta Azul, Paz Eterna
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Capítulo 3

A reação da minha família à minha oferta de entregar tudo foi exatamente como eu esperava. Após o choque inicial, veio a aceitação gananciosa, disfarçada de preocupação.

"Filha, você tem certeza?" perguntou minha mãe, a mão no peito, os olhos brilhando de cobiça. "Isso é muito generoso da sua parte. Mostra que você realmente se importa com o bem-estar desta família."

"A Luana sempre teve um bom coração, só estava um pouco perdida," disse meu pai, dando um tapinha no ombro de Sofia. "Ainda bem que ela percebeu que você é a pessoa certa para administrar tudo."

Sofia, a mestre da dissimulação, choramingou. "Eu não sei se mereço... mas se é para o bem do Pedro e do João, eu aceito esse sacrifício."

Sacrifício. A palavra me fez sorrir por dentro.

Naquela noite, enquanto ajudava a dar a medicação a Pedro, senti uma dor aguda no peito, que me deixou sem ar por um instante. Apoiei-me na parede, tentando disfarçar.

Quando me recuperei, olhei para minha mãe, que estava arrumando as flores no vaso ao lado da cama, e decidi testar as águas uma última vez.

"Mãe," eu disse, a voz um pouco trêmula pela dor. "Se eu ficasse muito doente... se eu morresse... você sentiria minha falta?"

Ela parou o que estava fazendo e me olhou com impaciência, como se eu tivesse feito a pergunta mais inoportuna do mundo.

"Que besteira é essa, Luana? Não fale de desgraça. E pare de tentar chamar atenção," ela repreendeu. "Temos que nos concentrar na recuperação do Pedro. E veja a Sofia, coitada, ela está exausta de tanto cuidar de tudo. É com ela que temos que nos preocupar."

Ela nem respondeu à minha pergunta. Fui completamente ignorada. A última e minúscula brasa de esperança que eu talvez ainda nutrisse por ela se apagou, virando cinzas frias.

Estava feito. Não havia mais nada a ser salvo ali.

No dia seguinte, chamei João. Ele veio até mim, um pouco hesitante. Desde que Sofia se tornara o centro do universo da casa, ele se mantinha distante de mim.

Ajoelhei-me para ficar na altura dele, ignorando a pontada de dor nas minhas costas.

"João, querido," eu disse, com a voz mais doce que consegui. "A partir de agora, a tia Sofia vai cuidar de você como uma mãe. Você deve chamá-la de 'mãe', está bem? Ela vai te amar muito."

Ele me olhou, os olhinhos confusos. "Mas você é a minha mãe."

"E eu sempre vou te amar," eu disse, engolindo o nó na garganta. "Mas eu preciso que você seja um bom menino para a sua nova mãe, a mamãe Sofia. Promete?"

Ele assentiu lentamente. Naquele momento, Sofia entrou no quarto.

"Mamãe Sofia!" disse João, correndo para ela. "A mamãe Luana disse que agora você é minha mãe!"

O sorriso de Sofia foi tão largo e genuíno que por um segundo sua máscara caiu. Era o sorriso de quem acaba de ganhar o prêmio máximo. Ela me lançou um olhar de puro triunfo por cima da cabeça do meu filho. Meus pais, que assistiam da porta, sorriam com aprovação, emocionados com a cena "tocante".

Eu tinha entregado meu filho. Tinha entregado meu patrimônio. Tinha entregado meu marido. Não havia mais nada para mim ali.

Naquela noite, arrumei uma pequena mala com algumas roupas e meus documentos. Não deixei bilhete. Eles não mereciam uma despedida. Enquanto a casa dormia, mergulhada na sua nova e feliz realidade, eu saí pela porta da frente, sem olhar para trás.

Andei por horas, sem rumo, até que a cidade grande ficou para trás e eu estava em uma estrada poeirenta, sob a luz da lua. O ar fresco enchia meus pulmões, mas a dor no meu corpo se intensificava a cada passo. O remédio estava perdendo o efeito.

Senti a tontura voltar, mais forte desta vez. Sabia que não tinha muito tempo. Com os dedos trêmulos, peguei meu celular. Havia apenas um contato para quem eu podia ligar. Carolina. Minha melhor amiga desde a infância, a única que nunca me julgou, a única que sempre esteve lá.

Enviei uma única mensagem de texto com a minha localização.

"Me ajuda."

Assim que o 'enviado' apareceu na tela, minhas forças se esvaíram completamente. O celular caiu da minha mão. A escuridão me engoliu antes mesmo de eu atingir o chão.

            
            

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