O Segredo Enterrado
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Capítulo 1

O telefone tocou exatamente às dez da noite, e a voz do outro lado era formal e fria, como a de um robô.

"Senhora Maria?"

"Sim."

"Lamentamos informar que seu marido, o senhor João, sofreu um grave acidente de barco, ele não resistiu."

Eu fiquei em silêncio por um momento, processando a informação, não a morte em si, mas o fato de que finalmente aconteceu.

O policial do outro lado da linha pareceu desconfortável com meu silêncio e continuou, "Senhora, ele estava tentando salvar a senhorita Isabela quando a lancha virou, foi um ato heroico, mas infelizmente..."

"Entendi," eu o interrompi, minha voz calma, sem nenhum tremor, "Onde está o corpo?"

O policial pareceu surpreso com a minha pergunta direta, "Ele está no necrotério central, a senhora precisa vir para identificar o corpo e..."

"Não precisa," eu disse, cortando-o novamente, "Eu confio no seu julgamento profissional, apenas me diga quais papéis eu preciso assinar para autorizar a cremação o mais rápido possível."

Houve uma pausa do outro lado da linha, uma longa pausa.

"Senhora, a senhora tem certeza? Normalmente a família..."

"Eu sou a família dele," eu afirmei, com uma frieza que parecia gelar até o fio do telefone, "E eu quero que ele seja cremado, o mais rápido possível, sem velório, sem cerimônias, apenas o essencial."

Desliguei o telefone antes que ele pudesse dizer mais alguma coisa, e olhei pela janela do meu apartamento de luxo, as luzes da cidade brilhavam lá embaixo, indiferentes.

Peguei meu celular e disquei o número do meu advogado.

"Dr. Alves, é a Maria," eu disse, sem rodeios, "João está morto, preciso que você prepare toda a papelada da herança, quero tudo resolvido até o final da semana."

Do outro lado, ouvi o som de papéis sendo remexidos.

"Maria, meus pêsames," ele disse, com um tom profissional, mas com uma ponta de surpresa, "Isso foi muito repentino."

"A vida é assim," respondi, "Apenas faça o que eu pedi, por favor."

Desliguei e me servi de uma taça do vinho mais caro que João guardava na adega, um vinho que ele nunca me deixava tocar.

Caminhei até a varanda, o ar da noite estava fresco, e dei um gole longo e profundo.

Um brinde.

Um brinde à minha liberdade, e ao começo da minha colheita.

No dia seguinte, passei a manhã no escritório do Dr. Alves, assinando uma montanha de documentos, a burocracia da morte é impressionante.

Meu sogro e minha sogra não apareceram, provavelmente estavam ocupados demais consolando Isabela, a mulher pela qual meu marido morreu.

A mídia noticiava o acidente como uma tragédia, o empresário influente João, que morreu como um herói para salvar sua ex-namorada, uma história digna de um filme romântico.

Eles não sabiam de nada.

Eles não sabiam que João planejava se divorciar de mim na semana seguinte, ele já tinha os papéis prontos, eu os encontrei na sua pasta de couro italiano.

Ele ia me deixar sem nada, ou pelo menos era o que ele achava.

Ele ia se casar com Isabela, o amor da sua vida, e viver feliz para sempre com a fortuna que construiu, em parte, com o dinheiro da minha família.

Mas o destino, às vezes, tem um senso de humor macabro.

Ele morreu como um herói para ela, e me deixou como a única herdeira de tudo.

A lei é clara, enquanto o divórcio não é finalizado, a esposa herda tudo.

Eu olhei para o extrato bancário que o Dr. Alves me entregou, os números eram tão grandes que pareciam irreais.

João era um homem desprezível, egoísta, infiel e, acima de tudo, um criminoso.

Mas ele era um criminoso rico, e agora, a riqueza dele era minha.

Eu não senti tristeza, não senti luto, senti apenas uma calma fria, uma satisfação calculista.

O plano que eu tracei por anos, o motivo pelo qual eu me casei com esse homem, estava finalmente se concretizando.

A morte dele não foi o fim, foi apenas o começo.

À noite, voltei para o apartamento que agora era só meu, peguei a caixa de cinzas que a funerária entregou, uma caixa simples, barata, exatamente como eu pedi.

Fui até o banheiro e despejei as cinzas na privada.

Puxei a descarga.

Enquanto a água levava os últimos vestígios de João, eu não senti nada além de alívio.

Adeus, João.

Que você apodreça no inferno.

            
            

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