O Segredo Enterrado
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Capítulo 3

Apesar do meu desejo por uma solução rápida e sem alardes, meus sogros insistiram em um funeral.

"É uma questão de respeito, de imagem!" minha sogra, Beatriz, choramingou ao telefone, "O que as pessoas vão pensar?"

"Eu não me importo com o que as pessoas pensam," respondi friamente.

"Maria, por favor," meu sogro, Afonso, interveio, sua voz sempre oleosa e conciliadora, "É importante para a família, para a memória de João."

Eu cedi, não por eles, mas porque vi uma oportunidade, um funeral seria o palco perfeito para o próximo ato do meu teatro.

"Tudo bem," eu disse, "Mas eu cuidarei dos arranjos."

Chamei o evento de "a colheita final".

Eles queriam um enterro no mausoléu da família, um lugar pomposo e caro no cemitério mais exclusivo da cidade.

Eu recusei.

"João será enterrado no cemitério municipal," informei a eles, "Comprei um lote simples, com uma bela vista para o muro."

Beatriz quase teve um colapso.

"Você enlouqueceu? Um homem da posição do meu filho, enterrado com a ralé?"

"Foi o que o orçamento permitiu," menti, "Depois que ele transferiu cinco milhões para a amante, as finanças ficaram um pouco apertadas."

O silêncio do outro lado da linha foi delicioso.

O dia do funeral chegou, um dia cinzento e úmido, perfeito para a ocasião.

Eu vesti um vestido preto, elegante e discreto, e um véu que escondia meu rosto, não de tristeza, mas para que ninguém visse o meu sorriso.

Eu parecia a viúva perfeita, sofrendo em silêncio, recebendo os pêsames de sócios comerciais, amigos falsos e parentes distantes.

Eu apertava suas mãos, agradecia suas palavras vazias e, mentalmente, calculava o valor dos presentes e das coroas de flores.

A cerimônia foi um exercício de hipocrisia, o padre falava de um João que eu não conhecia, um homem bom, generoso, um marido amoroso.

Eu quase ri alto.

Meus sogros estavam ao meu lado, Beatriz com o rosto banhado em lágrimas, Afonso com uma expressão solene de dor.

Patéticos.

Quando o caixão estava prestes a ser baixado, um tumulto começou na entrada do cemitério.

E então, ela apareceu.

Isabela.

Ela marchava em nossa direção como uma tempestade, vestida de preto, mas com um ar desafiador.

E ela não estava sozinha.

Pela mão, ela trazia um menino de uns quatro ou cinco anos, com grandes olhos castanhos e cabelos cacheados.

Todos os olhares se voltaram para eles, o murmúrio da multidão crescendo como um enxame de abelhas.

Ela parou bem em frente ao túmulo aberto, encarando a mim e aos meus sogros.

O menino se escondeu atrás de suas pernas, assustado com a atenção.

"O que você está fazendo aqui?" Beatriz sibilou, seu rosto pálido de raiva.

Isabela levantou o queixo, uma expressão de desafio trágico no rosto.

Ela ignorou minha sogra e olhou diretamente para mim.

"Eu vim para que o filho do João pudesse se despedir do pai," ela anunciou, sua voz alta e clara para que todos ouvissem.

O silêncio que se seguiu foi absoluto, quebrado apenas pelo choro do vento.

Então, o caos explodiu.

Beatriz soltou um grito agudo. Afonso parecia ter envelhecido dez anos em dez segundos.

Isabela olhou para o menino e disse, com uma ternura encenada.

"Diga olá para a sua avó, Zeca."

Meu sogro e minha sogra olharam para o menino, seus rostos uma mistura de choque, horror e uma centelha de esperança desesperada.

Isabela então se virou para a multidão de enlutados, que agora mais parecia uma plateia de teatro.

"Este é Zeca, o filho de João," ela proclamou, sua voz embargada de uma falsa emoção, "O único herdeiro de sangue do homem que vocês estão enterrando hoje! Ele tem direito a tudo que era do pai dele!"

A plateia ofegou coletivamente.

Eu permaneci imóvel, observando a cena se desenrolar exatamente como eu previra.

Isabela finalmente fixou seus olhos em mim, um brilho de triunfo presunçoso neles.

Ela achava que tinha me encurralado, que tinha me derrotado.

Eu levantei meu véu lentamente, revelando meu rosto.

Eu não estava chorando.

Eu não parecia chocada.

Eu a encarei com uma calma glacial e disse apenas uma palavra, uma palavra que cortou o ar como uma lâmina de gelo.

"Prove."

            
            

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