O rosto da senhora Silva ficou pálido. O suor brotou em sua testa.
"DNA? Que teste de DNA? Isso é um engano! Um absurdo! Ela é a garota! Eu sei que é!"
Ela gaguejava, os olhos indo do rosto furioso do senhor Fernandes para a figura imóvel de Patrícia na van. A negação era seu único refúgio, mas era um refúgio frágil.
"Chega de mentiras!", o senhor Fernandes gritou, perdendo a paciência. Ele agarrou o braço da senhora Silva com uma força que a fez gemer de dor. "Onde está a outra? A que estava aqui quando viemos da primeira vez? A que você escondeu na cozinha?"
"Eu não sei do que você está falando! Não havia outra garota!", ela mentiu, o pânico em sua voz.
"Você quer mesmo que eu acredite nisso?", ele a sacudiu. "Meus homens viram vocês a empurrando. Acham que somos idiotas?"
O desespero tomou conta dela. Ela tentou se soltar, mas o aperto dele era de ferro.
Foi nesse momento que eu decidi agir.
Eu saí da cozinha, caminhando lentamente para a luz do sol. Todos os olhares se viraram para mim. O do senhor Fernandes, surpreso. O da senhora Fernandes, calculista. E o da senhora Silva, cheio de puro ódio.
"Eu sou a garota que vocês procuram", eu disse, minha voz firme, apesar do meu coração estar batendo descontroladamente no peito. "Eu sou Ana."
"Cale a boca, sua desgraçada!", a senhora Silva gritou, tentando se virar para mim. "Não dê ouvidos a ela! Ela é louca! É só uma órfã que recolhemos da rua!"
Ela me fuzilava com os olhos, negando minha existência, tentando me apagar com seu olhar venenoso.
Mas eu não recuei. Eu olhei diretamente para o casal Fernandes.
"Eu me lembro de coisas", eu disse, minha voz ganhando força. "Eu me lembro de ser muito pequena, de estar enrolada em um cobertor macio. E eu me lembro de uma mulher com um cheiro doce me dando um beijo na testa. Ela estava chorando."
Eu pausei, deixando as palavras fazerem efeito. Eu podia ver uma faísca de interesse nos olhos da senhora Fernandes.
"E ela colocou algo no meu pulso. Algo frio e pesado."
Eu levantei minha mão esquerda.
Mesmo depois de todos esses anos, ele ainda estava lá. Escondido sob as mangas compridas que eu era forçada a usar, para que os Silva não o roubassem para vender.
Era uma pulseira de ouro. Simples, mas de um ouro puro e brilhante. Tinha um pequeno pingente, um sol em miniatura.
O pingente que minha mãe biológica tinha deixado comigo antes de eu ser roubada.
O último vestígio da minha verdadeira família.