Soltei-me de Pedro com uma força que não sabia que tinha e corri em direção à porta dos fundos. Ele me seguiu, parecendo finalmente alarmado.
A cena no quintal era um pesadelo.
Tia Lúcia estava na beira da piscina, com as mãos na cabeça, gritando histericamente.
E boiando na água, com o rostinho para baixo, estava um pequeno corpo, com um vestido sujo.
Sofia.
Um som desumano escapou da minha garganta. Eu não pensei, apenas pulei na água gelada. A água encheu meus pulmões, minha roupa pesou, mas eu não me importei. Nadei com desespero até ela, virei seu corpo e a puxei para fora da piscina.
Seu corpo estava mole, seus lábios, azuis.
"Sofia! Sofia, meu amor, fale com a mamãe! Acorda!"
Eu pressionei seu peito minúsculo, fiz respiração boca a boca, as lágrimas se misturando com a água da piscina no seu rosto.
Nada.
O mundo ao meu redor se tornou um borrão de sons abafados. A sirene da ambulância ao longe, os gritos de Tia Lúcia, a voz de Pedro ao telefone, falando com calma e frieza com alguém.
A única coisa real era o peso morto da minha filha nos meus braços.
No hospital, o tempo se arrastou em uma tortura sem fim. Eu estava encharcada, tremendo de frio e de choque, mas me recusava a soltar a mãozinha fria de Sofia enquanto os médicos tentavam de tudo.
Finalmente, um médico veio até mim, com o rosto cansado e cheio de pena.
Não precisei que ele dissesse nada. Eu já sabia.
Meu mundo, que eu estava tentando reconstruir com tanto esforço, desabou em um milhão de pedaços.
Pedro chegou muito tempo depois. Ele não estava lá quando o médico deu a notícia. Ele não estava lá quando eu precisei de um ombro para chorar.
Ele entrou no corredor silencioso do hospital, o terno ainda impecável, e a primeira coisa que perguntou foi:
"Onde está a Clara? Ela deve estar arrasada."
Eu o encarei, incrédula. Minha filha estava morta, e ele estava preocupado com a mulher que deveria estar cuidando dela.
"Ela não está aqui" , eu disse, a voz vazia. "E a Sofia... ela se foi, Pedro."
Ele piscou, como se processasse uma informação de negócios. Nenhuma lágrima. Nenhuma dor em seu rosto. Apenas um incômodo.
"Foi um acidente" , ele disse, como se estivesse se convencendo. "Essas coisas acontecem."
Nesse momento, a última ilusão que eu tinha sobre nosso casamento se quebrou.
Nosso casamento nunca foi sobre amor. Foi um contrato. A família dele precisava dos contatos e do prestígio do meu pai, que na época estava no auge de sua carreira. E eu precisava de um marido, de uma família, de uma vida que parecesse normal. Sofia não era a prova do nosso amor. Para ele, ela era apenas uma herdeira, uma peça no tabuleiro. E agora, a peça estava fora do jogo.
Uma clareza gelada tomou conta de mim. A dor ainda estava lá, um buraco negro no meu peito, mas ao lado dela, uma nova emoção nasceu: a determinação.
Eu olhei para o homem que um dia chamei de marido.
"Pedro" , eu disse, com a voz firme e clara, sem nenhum tremor. "Eu quero o divórcio."
Ele pareceu surpreso, até ofendido. "Agora não é hora para isso, Juliana. Tenha um pouco de respeito."
Respeito. A palavra soou como um insulto vindo dele.
Quando voltamos para a mansão para pegar alguns documentos, encontramos Clara na sala. Ela chorava nos braços de Dona Silva, a mãe de Pedro. Um choro teatral, alto e cheio de soluços.
"Foi tudo tão rápido! Eu só a deixei sozinha por um minuto, um único minuto!" , ela dizia, entre soluços falsos.
Meu luto se transformou em uma fúria incandescente. Eu andei até ela. Ela me viu chegando e seu choro vacilou.
Eu não disse uma palavra. Apenas levantei a mão e dei um tapa em seu rosto com toda a força que eu tinha.
O som ecoou na sala silenciosa.
Clara gritou, mais de surpresa do que de dor.
Antes que eu pudesse fazer qualquer outra coisa, Pedro me agarrou por trás, me puxando com violência.
"Você ficou completamente louca? Bater na Clara? Ela já está sofrendo o suficiente!"
Ele me empurrou para o lado e foi consolar Clara, abraçando-a, protegendo-a. Como se ela fosse a vítima ali.
Dona Silva se levantou, me olhando com puro desprezo.
"Que vergonha, Juliana. Minha neta acaba de morrer e você está aqui, agredindo uma convidada. Você não tem classe, não tem decência."
Eu olhei para os três. Pedro, o marido indiferente. Clara, a assassina dissimulada. Dona Silva, a matriarca fria e calculista. Minha família.
Eu ri. Uma risada seca, sem humor.
"Acabou" , eu disse, olhando diretamente para Dona Silva. "Eu não faço mais parte desta farsa. Eu vou embora. E quero o divórcio o mais rápido possível."
Virei as costas para eles e saí daquela casa, sem olhar para trás. Eu não tinha mais nada ali. Minha filha estava morta. Meu casamento, uma mentira. Mas pela primeira vez em muito tempo, eu me senti livre.