A Virada Do Destino Na Festa
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Capítulo 3

A droga me manteve em um estado de torpor por horas, mas não conseguiu apagar a clareza aterrorizante que agora dominava meus pensamentos.

Flutuando na névoa do sedativo, minha mente viajou de volta no tempo.

Lembrei-me dos primeiros anos com Ricardo. Os jantares caros, as viagens surpresa, os presentes extravagantes. Lembrei-me de como ele me incentivou a criar minha marca, a "Sofia Mendes", como ele comemorou cada pequena vitória minha como se fosse dele.

"Você merece o mundo, meu amor", ele costumava dizer.

Agora, eu entendia.

Não era amor. Era investimento. Cada sucesso, cada prêmio que eu ganhava, cada artigo de revista que elogiava meu talento, apenas aumentava o meu "valor de mercado" para o leilão dele. Ele não estava me dando o mundo, estava me engordando para o abate.

A "compensação" era a parte mais doentia. Ele me cobria de luxo como um pagamento adiantado pela vida que ele sabia que Isabella iria me tomar. Era a consciência culpada de um carrasco que mima sua vítima antes da execução.

O despertar foi brutal. O amor que eu achava que era a base da minha vida era a mais elaborada das mentiras.

Quando os efeitos do sedativo finalmente diminuíram, uma determinação fria se instalou em mim. Eu não podia contar com médicos, nem com enfermeiras. Eles viam o que Ricardo queria que eles vissem.

Eu só tinha uma pessoa.

Professora Ana Lúcia. Minha mentora. A única figura materna que eu tive além das cuidadoras do orfanato. Ela era forte, influente e, o mais importante, ela nunca gostou de Ricardo. Ela sempre dizia que ele era "liso demais para ser real".

Eu precisava de um telefone.

Passei o dia fingindo. Fingi estar calma, dócil, resignada. Comi a comida do hospital sem reclamar. Agradeci à enfermeira com um sorriso fraco.

"Eu me sinto um pouco melhor", menti para ela à tarde. "Eu poderia... poderia usar o telefone por um minuto? Só para ligar para o orfanato, para avisar a diretora que estou bem. Ela se preocupa comigo."

A enfermeira hesitou, mas meu olhar suplicante e minha barriga de grávida a convenceram.

"Só um minuto, e não diga que eu deixei", ela sussurrou, me entregando o telefone sem fio do posto de enfermagem.

Minhas mãos tremiam enquanto eu discava o número que sabia de cor.

"Alô?" A voz de Ana Lúcia era inconfundível.

"Professora, sou eu", sussurrei, virando de costas para a porta. "Sofia."

"Sofia! Querida, eu vi as notícias. Onde você está? Eu tentei te ligar..."

"Não tenho tempo", interrompi. "Ele me prendeu. Ricardo. Estou no Hospital Santa Mônica, quarto 302. Ele está me drogando. Ele... ele fez uma coisa horrível."

Houve um silêncio do outro lado da linha, e então a voz de Ana Lúcia voltou, firme como aço.

"Sofia, ouça com atenção. Não reaja. Não discuta com ele. Apenas finja. Eu vou te tirar daí. Você confia em mim?"

"Sim", respondi, as lágrimas finalmente escorrendo pelo meu rosto.

"Bom. Eu tenho contatos. Vou resolver isso. Apenas aguente firme. Estou a caminho."

Devolvi o telefone à enfermeira com um agradecimento silencioso. Pela primeira vez em dias, uma pequena chama de esperança se acendeu em mim.

Naquela noite, eu não consegui dormir. Fiquei deitada, ouvindo os sons do hospital, esperando. Cada passo no corredor fazia meu coração disparar. Seria Ana Lúcia? Ou seriam os capangas de Ricardo?

A exaustão acabou me vencendo. Entrei em um sono leve e agitado.

E foi então que eles vieram.

A porta do quarto se abriu sem um som. Não era a luz suave do corredor, mas a escuridão.

Duas silhuetas masculinas, grandes e ameaçadoras, entraram no quarto.

Antes que eu pudesse gritar, uma mão áspera e fedendo a cigarro cobriu minha boca. Outra mão pressionou um pano sobre meus olhos, me jogando na escuridão total.

Senti meu corpo ser levantado da cama com uma força bruta. Eu me debati, mas era inútil. Meus braços foram presos atrás das costas.

Uma picada aguda no meu braço. Outra agulha.

O mundo começou a se dissolver em um zumbido distante. O medo deu lugar a uma sensação de queda livre no vazio.

Acordei com um cheiro de mofo e umidade.

Minha cabeça doía. Eu estava sentada em uma cadeira de madeira dura, minhas mãos e pés amarrados. O pano ainda estava sobre meus olhos.

"Olha só quem acordou. A princesinha."

A voz era oleosa, cheia de um prazer cruel.

Alguém arrancou o pano dos meus olhos. A luz fraca de uma única lâmpada pendurada no teto me cegou por um momento.

Quando meus olhos se ajustaram, vi um homem parado na minha frente. Ele era gordo, com o cabelo ralo e um sorriso que mostrava dentes amarelados.

"Bem-vinda, Sra. Mendes. Ou devo dizer, a impostora?", ele zombou. "Parabéns. Seu marido é um homem de palavra. Eu dei o maior lance no leilão dele. E mal posso esperar para começar a 'arruinar' sua vida."

Meu estômago se revirou. Então era isso. O leilão tinha acontecido. Eu era o prêmio.

"Quem é você?", perguntei, a voz trêmula.

"Ah, você não se lembra de mim? Marco. Marco Abreu. Meu ateliê de design faliu há cinco anos. Uma pequena empresa que seu querido marido fez questão de esmagar para abrir caminho para a sua marca. Agora, é a minha vez de me divertir."

Ele se aproximou, seu hálito azedo me atingindo.

O pânico tomou conta de mim. Eu olhava para os cantos escuros do cômodo, um porão ou um armazém abandonado, procurando desesperadamente por uma saída, uma esperança.

E então, eu vi.

No canto superior da parede, quase escondida na sombra, uma pequena luz vermelha piscava em intervalos regulares.

Uma câmera.

Meu coração congelou.

Ricardo não tinha apenas me vendido. Ele não tinha apenas me entregado a um inimigo para ser torturada.

Ele estava assistindo.

Ele estava em algum lugar seguro e confortável, talvez com Isabella ao seu lado, assistindo a tudo em tempo real, como um filme doentio. A humilhação, o medo, a dor... tudo era parte do espetáculo que ele havia orquestrado.

Aquele pequeno ponto vermelho era mais aterrorizante do que o homem à minha frente. Era a prova final da profundidade de sua depravação.

            
            

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