Do Sequestro ao Romance Ardente
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Capítulo 2

A primeira ligação foi um desastre.

Usei um celular descartável e um aplicativo para distorcer a voz, mas minhas mãos tremiam tanto que quase deixei o aparelho cair. Do outro lado da linha, a voz do pai de Pedro, o Sr. Almeida, era exatamente como eu imaginava: fria, cortante e impaciente.

"Alô? Quem fala?"

"Eu... eu estou com seu filho," gaguejei, a voz robótica do aplicativo soando ridícula.

Houve uma pausa.

"E daí?"

Fiquei sem ar. "E daí? Ele foi sequestrado! Eu quero um resgate."

"Quanto?"

Meu coração parou. Era a hora. "Trezentos e cinquenta mil reais."

Silêncio. Um silêncio tão longo que achei que a ligação tinha caído.

"É só isso?" ele finalmente perguntou, e o desprezo em sua voz era palpável. "Você sequestra o meu filho por uma quantia que eu gasto em adubo pra fazenda?"

Ele desligou.

Fiquei encarando o celular, o som da linha morta ecoando no porão. Eu me senti uma idiota. Uma completa e total idiota.

Do outro lado do cômodo, Pedro começou a rir. Não era uma risada alta, mas um som baixo, de quem está se divertindo com a desgraça alheia.

"Eu te avisei," ele disse, balançando a cabeça. "Trezentos e cinquenta mil. Ele achou que era um trote. Provavelmente pensou que era um dos amigos dele pregando uma peça."

A vergonha queimou no meu rosto. Eu queria gritar, queria bater em alguma coisa, mas tudo que consegui fazer foi sentar no chão frio, derrotada.

"O que eu faço agora?" sussurrei para mim mesma.

"Primeiro, você vai me desamarrar," disse Pedro, com uma naturalidade assustadora. "Depois, a gente vai pedir um valor decente."

"A gente?" Eu o encarei, incrédula. "Não existe 'a gente' . Eu sequestrei você!"

"E está fazendo um péssimo trabalho, se me permite dizer. Eu estou tentando te ajudar. Pense em mim como um... consultor de crimes. Meu valor de mercado é muito maior que essa mixaria. Isso é ofensivo."

Ele parecia genuinamente ofendido. A vaidade dele era tão grande que até mesmo em um sequestro, ele se preocupava com o seu preço. Era absurdo, mas, no fundo, eu sabia que ele tinha razão.

"Por que você me ajudaria?" perguntei, desconfiada.

"Porque eu quero sair daqui. E, francamente, estou entediado," ele respondeu, dando de ombros. "E porque, se meu pai pagar pouco, meu status social vai lá pra baixo. Imagina a vergonha? O filho do Coronel do Café valendo menos que um trator usado."

Hesitei por um momento. O plano estava ruindo. Eu não tinha outra opção. Com um suspiro de derrota, peguei a faca que usava para cortar frutas e me aproximei dele. Cortei as cordas que prendiam seus pulsos e tornozelos.

Ele se levantou, esticando os braços e as pernas, fazendo uma careta.

"Finalmente. Achei que meu sangue não ia mais circular."

Ele andou pelo porão, examinando o lugar com um olhar crítico.

"Ok, vamos ao trabalho," ele disse, parando na minha frente. "Não vamos mais ligar. Ligações são rastreáveis e amadoras. Vamos escrever uma carta. É mais clássico, mais dramático."

Ele pegou um pedaço de papel e uma caneta que eu tinha deixado sobre uma caixa.

"Exija um milhão e meio," ele começou a ditar. "Não, melhor. Dois milhões. E não peça em dinheiro. Peça em diamantes não rastreáveis ou algo do tipo. Dá mais impacto."

Eu o observava, atônita. Ele estava completamente envolvido, como se estivesse planejando uma festa de aniversário, não o próprio resgate. Ele me instruiu sobre as palavras a usar, o tom a adotar, como criar um senso de urgência sem parecer desesperado.

"E não esqueça de colocar uma ameaça. Algo como 'se a polícia for envolvida, as consequências serão terríveis' . Meu pai adora um bom clichê."

No final, tínhamos uma carta de resgate que parecia saída de um filme. Era assustadora, profissional e convincente.

"Agora, como vamos entregar isso?" perguntei.

"Deixe em um lugar público. Na caixa de correio da capela no centro da cidade. É neutro, poético até," ele sugeriu, com um sorriso satisfeito.

Depois que tudo estava planejado, um silêncio estranho se instalou entre nós. Eu o observava, tentando entender o que se passava em sua cabeça. Ele não parecia um refém. Ele parecia... um parceiro.

O cansaço finalmente me venceu. Me encolhi em um colchão velho no canto e fechei os olhos, exausta demais para ficar de guarda.

Naquela noite, eu tive um pesadelo. Eu estava em um banco, tentando depositar o dinheiro do resgate na conta do hospital. Mas toda vez que eu digitava o número da conta, os dígitos se embaralhavam, se transformavam em símbolos sem sentido. O gerente do banco ria de mim, o rosto dele se transformando no rosto do Sr. Almeida.

Acordei em um pulo, o coração disparado. O porão estava escuro e silencioso, exceto pela respiração calma de Pedro, que dormia tranquilamente na cadeira, agora sem amarras.

Uma sensação terrível me invadiu. A sensação de que, mesmo com a ajuda do meu refém, eu estava prestes a cometer um erro ainda maior.

            
            

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