A Vingança da Alma Esquecida
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Capítulo 3

A reação do público aos arranhões na parede foi majoritariamente cética.

"Ah, para com isso, Ricardo. Isso aí é armação sua."

"Qualquer um pode fazer uns arranhões na parede pra fingir que é assombrado."

"Essa Lia devia ser maluca mesmo, se coçava nas paredes que nem um gato."

Flutuando no canto do quarto, eu senti uma pontada de ironia. Eles riam das marcas do meu sofrimento, transformando minha agonia em piada. Se eles soubessem... se eles pudessem sentir um por cento da dor que me levou a fazer aquilo, não estariam rindo. Estariam chorando.

"Vocês podem zombar", eu sussurrei para o vazio, minha voz um eco que ninguém podia ouvir. "Mas essas paredes sabem a verdade."

Ricardo, ignorando os céticos e focando nos comentários mais assustados, continuou a explorar o quarto. Havia uma pequena escrivaninha de madeira no canto, coberta por uma grossa camada de poeira. A maioria das gavetas estava vazia, revirada anos atrás pela minha "família" em busca de qualquer coisa que pudessem usar contra mim.

Mas eles não encontraram tudo.

Uma rajada de vento inexplicável entrou pela janela quebrada, forte o suficiente para balançar as cortinas rasgadas e soprar a poeira da escrivaninha.

Um pequeno caderno de capa dura, que estava preso entre a parte de trás da gaveta e a madeira da escrivaninha, caiu no chão com um baque surdo.

Ricardo se assustou com o barulho repentino.

"Opa! O que foi isso?"

Ele se aproximou com cautela, a lanterna focada no objeto caído.

"Ué, um diário?"

Ele se agachou e pegou o caderno. A capa estava desbotada, mas ainda era possível ler meu nome, Lia, escrito em caligrafia caprichada.

"Bingo, galera! Achamos o diário da Lia Oliveira!", ele anunciou para a live, a excitação em sua voz. "Será que a gente lê um trechinho?"

O chat explodiu em um misto de "SIM!", "LEIA TUDO!" e "Isso é invasão de privacidade!".

Ricardo, claro, optou pela audiência. Ele se sentou no chão empoeirado, abriu o diário na primeira página e começou a ler em voz alta.

"Data: 15 de março de 2014. Hoje é o dia mais feliz da minha vida. Eu finalmente tenho uma família. O Sr. e a Sra. Silva são tão elegantes, e a casa deles é um palácio. Mas a melhor parte é o Pedro. Ele sorriu pra mim e disse que agora eu sou a irmãzinha dele. Ele me mostrou o quarto, que é maior que a casa toda onde eu morava. Ele disse que ia me proteger de tudo e de todos. Eu acho que finalmente vou ser amada."

A voz de Ricardo ecoou pelo quarto silencioso.

Na mansão dos Silva, a transmissão continuava ligada na TV. Pedro, que estava tentando consolar Sofia, parou de repente. Ele ouviu as palavras do diário, as minhas palavras, e seu rosto se transformou. A raiva deu lugar a uma expressão confusa, quase dolorosa.

Ele se lembrava daquele dia. Lembrava da garotinha magra e assustada com olhos enormes que ele pegou pela mão e levou para o novo quarto. Lembrava de ter prometido protegê-la.

Uma promessa que ele quebrou de forma espetacular.

Ele ficou em silêncio, a mente subitamente invadida por uma memória que ele havia se esforçado tanto para enterrar. A sensação de sua mãozinha na dele. O sorriso tímido dela.

"Isso...", ele murmurou, a voz baixa. "Isso é mentira. Ela devia estar mentindo desde aquela época."

Mas seu tom não tinha a convicção de antes. Pela primeira vez em cinco anos, uma pequena rachadura apareceu na muralha de certezas que ele construiu ao redor de seu coração.

A sensação era estranha, desconfortável.

Era a sensação de uma verdade esquecida tentando vir à tona.

            
            

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