O guarda bateu na porta. "Dois minutos!"
Sofia se apoiou na pia suja, a água fria em seu rosto não conseguindo apagar a queimação da vergonha. Ela olhou para seu reflexo no espelho quebrado, um mosaico de uma mulher que ela mal reconhecia. O rosto pálido, os olhos inchados de choro, o corpo marcado pela violência de Thiago.
A mulher no espelho não era a estilista poderosa e confiante. Era uma vítima.
As lágrimas vieram, um dilúvio silencioso de dor e raiva. Ela socou a parede azulejada, a dor aguda em seus nós dos dedos um alívio bem-vindo da dor emocional.
Não. Ela não seria uma vítima.
Ela não deixaria Thiago vencer.
Seu pai. O pensamento veio como um relâmpago. Seu pai, que morrera em um trágico acidente de avião há cinco anos. Ele sempre lhe dissera: "Sofia, o mundo pode ser um lugar cruel. Você precisa sempre ter um plano de fuga, um ás na manga que ninguém conhece."
Um dia, ele lhe dera um pequeno pendrive em forma de um antigo camafeu. "Isso é para uma emergência real. Use-o apenas se perder tudo. As instruções estão dentro. Memorize-as e destrua o pendrive."
Ela tinha 18 anos na época. Achou que era o exagero de um pai superprotetor. Mas ela fez o que ele pediu. Memorizou a sequência de números e palavras, um código de acesso para algo que ela nunca entendeu completamente. E destruiu o pendrive.
Ao longo dos anos, a sequência permaneceu adormecida em sua memória, um eco do amor de seu pai.
Seria possível? Depois de tanto tempo?
O guarda bateu na porta novamente, com mais força. "Seu tempo acabou!"
Sofia respirou fundo, secando as lágrimas. A determinação endureceu suas feições.
Ela abriu a porta. O guarda a agarrou pelo braço e a arrastou de volta para o palco.
A multidão ficou em silêncio quando ela reapareceu. A mulher que voltou não era a mesma que tinha saído. Havia um fogo frio em seus olhos.
Thiago a olhou com desprezo. "Pronta para o grand finale?"
Ele a forçou a se virar de costas para a plateia.
"Como podem ver, a pele é impecável. Perfeita para qualquer tipo de marcação que o novo dono desejar."
A voz do leiloeiro, um homem contratado por Thiago, começou.
"Vamos começar os lances pelos direitos de marcar suas costas. Lance inicial, cem mil reais!"
As placas subiram. A humilhação atingiu um novo nível de degradação. Eles estavam leiloando pedaços de seu corpo, de sua identidade.
"Duzentos mil!"
"Trezentos mil!"
Isabella, sentada na primeira fila como uma rainha em seu trono improvisado, ria com prazer.
Thiago se aproximou de Sofia, sua respiração quente e fétida em seu pescoço.
"Sabe, Sofia, estou me sentindo generoso. Se você implorar agora, de joelhos, e beijar os pés da Isabella, talvez eu te venda para alguém menos... criativo."
Ele queria que ela se quebrasse. Queria ver sua alma esmagada.
Foi o erro dele.
Sofia se virou lentamente para encará-lo, o fogo em seus olhos agora uma chama visível.
Ela olhou para Thiago, para Isabella, para a multidão de rostos gananciosos. E então, ela fez algo que ninguém esperava.
Ela riu.
Um riso baixo, amargo, mas forte.
Ela olhou para o leiloeiro e, com a voz clara e ressonante, que cortou o ar como vidro, ela fez seu anúncio.
"Eu cubro todos os lances."
O salão ficou em silêncio absoluto.
"Eu vou acender a lanterna celestial. Eu compro a mim mesma."