Depois de um tempo que pareceu uma eternidade, ela ouviu a porta do banheiro se abrir. E então, ouviu vozes. A voz de Pedro e a voz de Juliana.
Eles achavam que o banheiro estava vazio.
"Você acha que fomos longe demais?" , perguntou Pedro, a voz baixa e preocupada.
"Longe demais? Não seja ridículo, Pedro. Ela mereceu" , respondeu Juliana, a voz dura e sem remorso. "Ela precisava aprender o seu lugar. Uma ninguém tentando se agarrar a um homem como você. É patético."
Sofia prendeu a respiração, o coração batendo forte contra as costelas.
"Eu sei, mas... empurrá-la..." , ele hesitou.
"Você fez o que tinha que fazer" , ela o cortou. "Você mostrou a ela, e a todo o escritório, de que lado você está. Do meu lado. Do lado vencedor." Houve uma pausa, e Sofia imaginou Juliana tocando o rosto dele. "Não se preocupe, meu amor. Foi a coisa certa a fazer."
O estômago de Sofia se revirou. Ele não estava preocupado com ela. Ele estava preocupado com a própria imagem.
"Eu nunca a amei de verdade, sabe?" , a voz de Pedro soou, e cada palavra foi como um caco de vidro no coração de Sofia. "Ela era... conveniente. Bonitinha, ingênua, não me dava trabalho. Mas, sinceramente, Ju, ela era tão sem graça. Sem ambição, sem brilho. Contente em viver naquela vidinha medíocre. Eu estava apenas esperando a oportunidade certa para me livrar dela. Você e o bebê foram a desculpa perfeita."
A crueldade casual daquelas palavras a deixou sem ar. Então, tudo tinha sido uma mentira. Desde o começo. Ele nunca a amou. Ele a via como um fardo, uma coisa sem graça da qual precisava se livar.
Flashbacks de seu relacionamento inundaram sua mente. As vezes em que ele criticou suas roupas, chamando-as de "simples demais" . As vezes em que ele zombou de seu sonho de abrir uma pequena livraria, dizendo que era "pouco ambicioso" . As vezes em que ele se recusou a conhecer seus amigos de longa data, alegando que eram "gente comum" .
Tudo fazia sentido agora. Não eram críticas construtivas. Era desprezo. Ele a desprezava o tempo todo.
"Eu sei, querido" , disse Juliana, a voz satisfeita. "É por isso que estamos juntos. Nós dois queremos as mesmas coisas. Poder, sucesso, dinheiro. Coisas que aquela ratinha de biblioteca nunca entenderia."
Eles riram juntos. Uma risada fria e conspiratória.
Sofia sentou-se imóvel na cabine, o som da risada deles ecoando em seus ouvidos muito depois de eles terem saído do banheiro. A dor era tão intensa que se tornou algo físico, uma pressão insuportável em seu peito. A humilhação, a traição, o desprezo... era demais.
Ela não chorou mais. As lágrimas secaram, substituídas por um vazio gelado.
Ela saiu da cabine e se olhou no espelho. A mulher que a encarava de volta tinha os olhos vermelhos e o rosto pálido, mas havia algo novo em seu olhar. Uma dureza que não existia antes.
A garota ingênua que amava Pedro estava morta. Em seu lugar, havia uma mulher com o coração partido, mas com uma resolução de ferro.
Ela não voltou para o escritório. Ela deixou sua caixa com seus pertences debaixo de uma pia e saiu do prédio pela porta dos fundos, como uma fugitiva.
Ela caminhou sem rumo pelas ruas da cidade, o barulho do trânsito um zumbido distante. Havia um lugar para onde ela precisava ir. Um lugar que representava a última fagulha de um sonho compartilhado.
Ela e Pedro haviam economizado por um ano para uma viagem romântica para a Costa do Sol, para se hospedarem no mais luxuoso hotel da região, o Solaris, parte da rede Luxos. Era para ser a viagem de noivado deles.
Com o coração pesado, ela foi até a estação de trem e comprou uma passagem só de ida. Ela iria sozinha. Ela precisava ir. Talvez para se despedir do fantasma do que eles poderiam ter sido. Talvez para tentar se encontrar novamente.
No trem, enquanto a paisagem da cidade dava lugar a campos verdes, seu celular vibrou. Era uma mensagem de Pedro.
"Sofia, me desculpe pelo que aconteceu hoje. Juliana está muito sensível por causa da gravidez. Espero que você entenda. Para compensar, estou transferindo cinco mil reais para a sua conta. Considere um presente de despedida. Fique bem."
Cinco mil reais. O preço que ele colocou na humilhação dela. O preço do silêncio dela.
Sofia olhou para a mensagem, um sorriso amargo se formando em seus lábios. Ele ainda não entendia. Ele não fazia a menor ideia.
Ela bloqueou o número dele sem responder.
Ela olhou pela janela do trem, a raiva e a dor se misturando em uma nova e perigosa determinação. Ele a chamou de sem ambição. Ele e Juliana a chamaram de ninguém.
Eles estavam prestes a descobrir o quão errados estavam. A viagem para o Solaris não era mais sobre luto. Era sobre renascimento. Era o começo de sua vingança.