A Rainha Inabalável Retorna
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Capítulo 2

O ar no carro era um peso físico, denso e escaldante. A garganta de Alina parecia uma lixa e seus pulmões ardiam a cada respiração superficial. O calor era uma lembrança constante dos últimos momentos de Léo, uma tortura planejada pelo homem que havia prometido amá-la e protegê-la.

O rosto de Bernardo era uma máscara de fria satisfação enquanto ele digitava os números no celular dela. "1-8-0-5", ele murmurou. "Boa menina."

Ele jogou o celular dela no painel, a tela agora inútil para ela. Sua conexão com o mundo, com a ajuda, havia desaparecido. Sua visão turvou, pontos escuros dançando diante de seus olhos. Ela se lembrou do dia do casamento, a mão de Bernardo na dela, sua voz sincera enquanto ele jurava cuidar dela, estar ao seu lado em qualquer situação. Aquele homem se fora, substituído por este monstro frio e calculista.

"Pare", ela grasnou, tentando agarrar a maçaneta da porta, suas unhas raspando inutilmente no plástico. "Me deixe sair."

"Ele era só uma criança, Bê", ela chorou, as palavras rasgando sua garganta ferida. "Ele era nosso filho. Nosso menininho."

"Não se atreva a chamá-la assim", Bernardo retrucou, seus olhos brilhando com um fogo protetor que ela não via há anos. Um fogo que não era para ela, nem para o filho morto deles, mas para uma estagiária de vinte anos. "Não chame a Karina de monstro."

Ele se virou para o celular em sua mão, seus dedos se movendo rapidamente. "Você estava sempre tão ocupada com o trabalho, Alina. Sempre em um avião, em uma reunião. Quando foi a última vez que você passou um dia inteiro com ele? A Karina era ótima com ele. Ele a amava."

A acusação foi um golpe físico, tirando o último resquício de ar de seus pulmões. Era uma mentira, uma mentira cruel e distorcida. Ela havia estruturado sua vida inteira, toda a sua carreira como COO da empresa que eles construíram juntos, em torno de Léo. Ela pegava voos noturnos para estar em casa no café da manhã, trabalhava até tarde da noite depois que ele dormia e sacrificou promoções para evitar se mudar. Sua vida era um ato de equilíbrio constante e exaustivo, que ele nunca havia reconhecido.

"Ele era só uma criança", disse Bernardo novamente, a voz mais suave agora, mas com uma falta de preocupação arrepiante. "É uma tragédia. Mas a Karina é jovem. Ela tem a vida inteira, uma carreira inteira pela frente. Não podemos deixar um erro arruinar isso."

Alina o encarou, uma clareza horrível cortando sua dor e a névoa induzida pelo calor. Suas palavras não eram uma defesa de Karina; eram uma admissão. Ele não estava apenas protegendo uma estagiária. Ele estava protegendo sua amante.

A percepção a atingiu com a força de um impacto físico. As noites tardias que ele alegava serem reuniões do conselho. Os "retiros de trabalho" de fim de semana. O cheiro de um perfume diferente em seus ternos. Tudo se encaixou, um mosaico de traição que estava sendo construído há anos.

"Você está dormindo com ela", ela sussurrou.

Um lampejo de algo - irritação, talvez vergonha - cruzou seu rosto antes de ser substituído por uma fria indiferença. "Isso não vem ao caso agora."

A última gota de sua força se esgotou. Ela esmurrou a janela com os punhos, um ritmo desesperado e sem esperança. "Me deixe sair! Me deixe ver meu pai!"

Suas mãos estavam em carne viva, os nós dos dedos sangrando, mas ela não sentia a dor. Tudo o que sentia era uma raiva ardente e avassaladora.

"Eu vou te matar, Bernardo", ela sibilou, as palavras com gosto de veneno. "Juro por Deus, vou ver você e aquela vadiazinha queimarem por isso."

Por um momento, ele olhou para ela, para as marcas de sangue que ela deixava na janela, e um toque de inquietação cruzou suas feições. Mas desapareceu tão rápido quanto veio.

Ele clicou em um botão em seu celular, e o som de um homem gritando encheu o carro. Era o pai dela.

"Pare! Por favor!", ela implorou, o corpo amolecendo.

Com um toque final e decisivo em seu próprio celular, Bernardo ergueu os olhos. "Está feito", disse ele. "O arquivo na nuvem foi apagado. O cartão original da câmera já foi destruído."

Uma onda de oxigênio fresco a atingiu quando ele finalmente abaixou os vidros. Ela ofegou, os pulmões doendo.

"Viu?", disse ele, a voz tingida de uma calma condescendente. "Todo esse drama, por nada. Você deveria ter cooperado desde o início."

Ele os afastou da casa de repouso, deixando o destino de seu pai em suspenso.

"Eu quero ver meu pai", disse ela, a voz uma casca oca.

"Os médicos estão com ele agora", disse Bernardo com desdém. "Ele teve um pequeno susto, só isso. Você pode vê-lo amanhã. Agora, precisamos nos concentrar nos preparativos para o Léo."

Ele estava organizando o funeral de seu filho. O filho a quem ele acabara de negar justiça. A hipocrisia era de tirar o fôlego.

"E Alina", disse ele, o tom um aviso claro. "Esta conversa nunca aconteceu. Para todos os efeitos, a morte de Léo foi um trágico acidente. Uma trava de carro com defeito, talvez. Não sabemos. Não há provas. Não há ninguém para culpar. Você entende?"

Ela não respondeu. Apenas olhou pela janela, o coração uma pedra fria e pesada no peito. Ela não havia perdido apenas seu filho. Havia perdido seu marido, sua vida e sua fé em tudo o que já acreditara.

E naquele momento, no silêncio estéril e climatizado do carro, um novo sentimento começou a florescer no deserto de sua dor. Era frio, afiado e duro como diamante.

Era ódio.

            
            

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