Levantei-me, minhas pernas instáveis. "Sou Clara Menezes", corrigi-o automaticamente. Eu não usava o nome de Franco há meses, não desde que nosso mundo supostamente desmoronou.
Ele não pareceu notar. "Seu filho está estável por enquanto, mas a condição dele é crítica. É um evento neurológico de início súbito, provavelmente ligado ao autismo dele. É muito raro e muito agressivo."
Eu apenas o encarei, sem entender os termos médicos, apenas o pavor em sua voz.
"Do que ele precisa?", perguntei, minha voz mal um sussurro.
"Ele precisa de um procedimento imediato", disse o médico, seus olhos evitando os meus. "Chama-se Intervenção Neurovascular. É complexo e requer um especialista. E... é extremamente caro."
Ele mencionou um número que me deixou sem ar. Duzentos mil reais. À vista.
"Somos um hospital público, Sra. Menezes", ele continuou gentilmente. "Não temos o equipamento nem os especialistas para isso. Você precisaria transferi-lo para uma instituição privada, como o Sírio-Libanês. Mas eles não o admitirão sem o pagamento."
Duzentos mil reais. Poderia muito bem ser duzentos milhões. Eu tinha setenta e três reais na minha conta bancária.
O médico viu a expressão no meu rosto. "O pai dele... ele está presente?"
A imagem de Franco naquele terraço, jogando dinheiro fora, passou pela minha mente. O helicóptero. A amante grávida.
"Ele está... indisponível", engasguei.
A memória era tão vívida, tão nítida, que parecia estar acontecendo de novo. O confete de notas de cem reais. O sorriso triunfante de Janine. A mentira fácil de Franco.
Estou escondido de credores num motel em Osasco.
A mentira era uma coisa física, uma pedra na minha garganta.
Senti uma onda de algo frio e duro substituir o pânico. Era fúria. Uma fúria pura e focada.
Ele tinha o dinheiro. Ele tinha, e estava gastando em uma festa enquanto nosso filho morria.
Olhei para o médico, minha determinação se solidificando. "Eu vou conseguir o dinheiro."
Ele pareceu duvidoso, mas assentiu. "Você não tem muito tempo. Algumas horas, talvez."
Algumas horas.
Saí da sala de espera, minha mente uma lousa em branco, exceto por um único pensamento ardente: Franco.
Saí do hospital para a tarde cinzenta. Não peguei meu carro. Peguei o metrô, o chiado metálico do trem uma trilha sonora para a tempestade na minha cabeça.
Eu estava indo para o prédio do Grupo Viana. A reluzente torre de vidro perto da Faria Lima, onde Franco construiu seu império. O lugar que eu uma vez o ajudei a decorar, o lugar onde levei um Léo bebê para visitar seu pai.
Agora eu estava indo como uma mendiga. Um fantasma de uma vida que ele tentou apagar.
Ao me aproximar da entrada grandiosa, vi que estavam montando algo para um evento. Uma coletiva de imprensa. Havia vans de reportagem e jornalistas.
Uma grande faixa estava sendo desenrolada sobre as portas. Lia-se: "GRUPO VIANA: UMA NOVA ERA DE PROSPERIDADE."
Abri caminho pela multidão que se formava, meu coração uma pedra fria e pesada no peito. Ele não estava mentindo apenas para mim. Ele estava mentindo para o mundo inteiro. E eu estava prestes a entrar no meio de sua grande performance para exigir a vida de nosso filho.