Uma estrada escura e congelada. O som do nosso bebê, tão pequeno, tão doente, seus choros ficando mais fracos no banco de trás. Eu estava no telefone, implorando. "Por favor, Caio, volte. Ele não está respirando direito."
A voz dele, distante, distraída. "Não posso, Eva. A Bianca disse que tem um homem seguindo ela. Ela está apavorada. Tenho que ter certeza de que ela está segura."
Ele desligou. Ele nos deixou lá. Nosso filho morreu em meus braços uma hora depois, seu corpinho esfriando contra o meu.
Outro acidente. O guincho de pneus. Ele estava me perseguindo depois de outra briga sobre Bianca. Ele desviou para evitar um cervo, jogando seu carro em um barranco para me salvar. Ele perdeu as duas pernas. A culpa disso me acorrentou a ele. Ele usava a cadeira de rodas como um trono de martírio, uma acusação constante e silenciosa. "Você me deve", seus olhos sempre diziam. E eu paguei, cumprindo minha sentença em um casamento sem amor até o dia em que ele finalmente acabou com tudo.
Agora, aqui estava ele, sangrando de um ferimento superficial, clamando vitória. Meu salvador.
O pensamento era tão repulsivo que me deu vontade de gritar.
Antes que eu pudesse, um grito diferente cortou o ar. "Caio!"
Bianca veio correndo, o rosto uma máscara perfeita de terror. Ela me empurrou de lado, fazendo-me tropeçar e cair no chão. Meu braço quebrado bateu no asfalto, e uma nova onda de agonia me atravessou.
"O que você fez com ele?" ela gritou, me dando um tapa no rosto, com força. E de novo. "Sua bruxa! Fique longe dele! Ele me pertence!"
Ela se virou para Caio, sua expressão derretendo-se em um cuidado terno enquanto ela gentilmente limpava o ferimento dele com a barra de seu suéter caro.
"Bianca, pare", Caio murmurou, os olhos em mim. "Peça desculpas para a Eva."
O lábio inferior de Bianca tremeu. Uma única lágrima rolou por sua bochecha. "Mas... ela te machucou."
Instantaneamente, a determinação de Caio desmoronou. "Eu sei, eu sei", ele a acalmou, puxando-a para um abraço. "Está tudo bem. Eu estou bem."
Observei a cena patética, meu rosto ainda ardendo. Levantei-me, ignorando a dor latejante no meu braço, e me preparei para sair. Este era o circo deles, e eu estava farta de ser uma das palhaças.
"Não se atreva a ir embora!" Bianca rosnou, a voz pingando triunfo. Ela se agarrou ao braço de Caio como um prêmio. "O Caio não vai deixar você me machucar nunca mais."
Quando me virei, vi Caio instintivamente se mover, colocando-se ligeiramente na frente de Bianca. Foi um movimento pequeno e inconsciente, mas que dizia muito. Depois de tudo, ele ainda me via como a ameaça, e ela como a que precisava de proteção.
Eu parei. Olhei-o diretamente nos olhos.
"Farias, Almeida e Sampaio", eu disse, minha voz neutra. "E os números são 40.7128 e 74.0060."
Bianca parecia confusa. "Do que você está falando, sua louca-"
Mas Caio empalideceu. Seu rosto ficou flácido de choque. Ele sabia exatamente do que eu estava falando. Farias, Almeida e Sampaio eram os nomes de três investidores-chave com quem seu pai estava prestes a fechar negócio, um acordo que, em nossa primeira vida, levou o Grupo Monteiro à falência. E os números, eram as coordenadas de GPS de um terreno pelo qual a empresa da família Monteiro estava prestes a pagar um preço exorbitante, com base em um laudo geológico fraudulento.
Era uma informação que eu passei anos da minha primeira vida desenterrando para tentar salvar nossa empresa, informação que ele ignorou porque estava ocupado demais lidando com um dos dramas de Bianca.
"Como...?" ele sussurrou, a voz trêmula.
"Considere um presente de agradecimento pela pedra na sua cabeça", eu disse friamente. "Agora estamos quites. Fique longe de mim."
Seu rosto se contraiu. O horror que surgia em seus olhos era absoluto. Não era apenas sobre a empresa. Ele finalmente, verdadeiramente, entendeu. Não era que eu precisava ser salva. Era que eu não o queria mais.
Eu só queria ir embora.