Seis dias. Era tudo o que restava para evitar o colapso completo. A notificação do governo não deixava dúvidas: ou pagava, ou perdia tudo.
Sua irmã mais velha, Anna, com um recém-nascido nos braços, havia mandado mensagem perguntando se estava tudo bem.
Helena respondeu que sim.
Uma mentira gentil.
Contar a verdade significava vê-la largar tudo e correr para ajudar - e Helena se recusava a ser mais um peso.
Bocejou.
A noite anterior fora um turbilhão de pensamentos, todos girando ao redor de Joseph Zhang.
Sabia tudo o que era público sobre ele: CEO de um império industrial, 33 anos, entre os homens mais ricos do País Z.
E sabia o que poucos sabiam: ele quase fora morto em uma conspiração silenciosa - e ela havia impedido.
Foi a única a notar a sabotagem na medicação.
E depois... sumiu.
Salvou sua vida. Perdeu a própria.
E agora, ele havia voltado.
Ainda estava digerindo isso quando a porta da loja se abriu com um tilintar suave.
- Boa noite, cliente. Posso ajudar? - disse automaticamente, sem nem erguer os olhos.
Mas quando olhou, a palavra morreu em sua garganta.
Era ele.
Joseph Zhang, de novo.
De pé, impecável, com aquele terno sob medida e o olhar calmo que disfarçava um mar revolto por trás.
- Creio que sim. - disse ele, com um meio sorriso. A voz era grave, serena, mas havia tensão ali.
Eles se encararam por longos segundos.
Os dedos de Helena fecharam-se automaticamente sobre a pequena faca que usava para cortar embalagens. O gesto era mais instintivo do que ameaçador, mas ela estava tensa.
Joseph ergueu levemente as mãos.
- Eu não represento perigo. - disse com calma.
- Isso sou eu quem decido. - respondeu ela, seca.
Ele desviou o olhar e caminhou até uma das prateleiras. Fingiu examinar os bombons, mas a observava pelo reflexo do vidro.
Ser encarado com hostilidade numa loja de chocolates... ironia pura.
- Sei da sua situação. - começou ele. - Sei que você tem seis dias para levantar uma quantia impagável. E que isso é só o começo.
Ela não respondeu. Apenas o observava.
- Tenho uma proposta. - disse ele, virando-se. - Case-se comigo e eu pago todas as suas dívidas.
Helena piscou, como se não tivesse entendido.
Depois soltou uma risada seca.
- Você está brincando.
- Falo sério. Um casamento de conveniência. Com contrato, prazos e cláusulas claras. Sem expectativas sentimentais.
Ela recuou um passo.
- Você invadiu minha loja pra me pedir em casamento?
- Invadir é uma palavra forte.
- É exatamente o que você fez.
- Estou tentando te oferecer uma saída. Você está encurralada, Helena. E eu também.
- Você não sabe nada sobre mim. - disse, a raiva crescendo na voz.
- Sei que você salvou minha vida. E que está prestes a perder a sua. Eu só estou oferecendo um caminho.
Ela largou a faca sobre o balcão e cruzou os braços.
- E o que você ganha com isso?
- Acesso à verdade. A chance de entender o que realmente aconteceu comigo no hospital. Você é a única que sabe. E além disso... - ele hesitou - eu preciso estar casado. Por razões políticas, pessoais e estratégicas.
- E não tem nenhuma modelo disponível pra isso?
- Tenho muitas opções. Mas só confio em você.
Ela arqueou as sobrancelhas.
- Você confia em mim?
- Você salvou minha vida. E não pediu nada em troca. Isso é raro, Helena.
Ela respirou fundo, sem saber o que dizer.
A proposta era absurda... mas a tentação de respirar alívio era real.
- E se eu disser sim... você some depois? Me abandona com tudo isso em cima?
- O contrato será claro. Você terá proteção jurídica. E, ao final, liberdade total. Nada emocional. Apenas... mútuo benefício.
Helena hesitou.
Joseph viu o conflito nos olhos dela.
- Me desculpe. - ela disse, por fim. - Mas isso... isso parece um novo tipo de prisão.
Joseph tirou um cartão do bolso e o pousou sobre o balcão com firmeza.
- Você tem 24 horas. Depois disso, talvez não haja mais saída.
Ela não se moveu. Apenas o observou sair.
Joseph cruzou a calçada. Estacionado à sua espera, discreto e letal, estava o Bugatti La Voiture Noire - preto como breu, com curvas futuristas e elegância feroz.
Adrian já o aguardava ao volante. Abriu a porta com precisão.
Joseph entrou no carro em silêncio.
O interior era silencioso e luxuoso: couro preto, alumínio escovado, madeira polida. Minimalista, moderno, impecável.
- Você demorou. Como foi? - perguntou Adrian, ligando o motor.
- Eu... não sei. Ela ficou hesitante.
- Você foi direto?
- Disse tudo. Falei que posso resolver a vida dela. Quitar dívidas. Salvar a loja, a fábrica. Colocar advogados à disposição. Dar tranquilidade, proteção. - Joseph passou a mão no rosto. - E em troca, só quero a verdade. E uma assinatura.
Adrian olhou brevemente pelo espelho retrovisor.
- Cê percebe que isso soa como uma proposta de vilão, né?
Joseph sorriu, exausto.
- Talvez. Mas é tudo que tenho agora.
- E se ela disser não?
- Ela não pode.
- Você sabe que ela pode. Aliás, com aquela cara, ela provavelmente vai.
Joseph encarou o teto com as pequenas luzes do forro.
- Espero que ela seja mais racional do que parece.
Adrian soltou um longo "hmmm".
- Quer uma cerveja? Hoje é por minha conta.
Joseph olhou de lado, surpreso.
- Você pagando?
- Se você acabou de propor casamento a uma mulher que quase te cortou com uma faca... sim, você merece.
Joseph riu.
O La Voiture Noire desapareceu entre as luzes da cidade, deixando para trás mais do que uma proposta: deixava Helena com um dilema.