Capítulo 4 Um concurso velado

O escândalo de Vitória havia sido enterrado com a precisão de um cirurgião político. O governador Henrique Valença estava oficialmente divorciado, e a narrativa construída em torno da "primeira-dama doente" já não despertava mais interesse no público. O que antes era escândalo agora era silêncio.

Mas a equipe sabia: havia um vazio. Sem esposa, Henrique parecia incompleto diante das câmeras. Uma liderança carismática precisava de alguém ao lado - uma figura capaz de suavizar sua imagem, dar calor humano às aparições públicas e transmitir estabilidade familiar.

Naquela noite, no gabinete particular, Henrique reuniu seus conselheiros mais próximos. Heitor Andrade, como sempre, conduziu a discussão.

- Os números não mentem - disse ele, batendo com o dedo sobre uma pasta de gráficos. - Nossas pesquisas mostram que a população gosta de líderes "humanizados". Famílias completas, esposas participativas. A ausência de uma primeira-dama pesa contra a sua imagem.

Um dos assessores completou:

- Influenciadores já começam a explorar isso. Os concorrentes vão usar essa brecha. Precisamos preencher esse espaço antes que vire fraqueza.

Henrique encostou-se na cadeira, os olhos semicerrados.

- Vocês estão sugerindo que eu... case de novo?

Heitor sorriu.

- Não apenas casar, governador. Estamos falando de estratégia. Uma nova esposa, escolhida a dedo, pode ser a maior jogada política da sua carreira.

O plano começou a tomar forma. Não seria anunciado como uma "busca" oficial - seria discreto, envolto em glamour e filantropia. A narrativa pública seria de que Henrique buscava alguém "verdadeiramente comprometida com o povo, com causas sociais e humanitárias".

Critérios foram listados em segredo:

1. Jovens mulheres, preferencialmente elegantes, articuladas e bem apresentadas.

2. Que não viessem da elite tradicional - ao contrário, que carregassem uma história de superação, para gerar identificação com a população.

3. Capazes de transitar entre o luxo dos salões e a simplicidade das comunidades, sem perder credibilidade.

- O povo gosta de acreditar em contos de fadas - comentou uma das consultoras de imagem. - Uma jovem de origem simples que conquista o coração do governador... quem não vai se comover com isso?

Heitor riu, satisfeito.

- Transformaremos a nova primeira-dama em símbolo. A história perfeita para as redes sociais: "a escolhida do povo".

Enquanto as ideias circulavam, pesquisas eram encomendadas a institutos de opinião. Perguntas disfarçadas sobre a imagem de figuras femininas em cargos de poder, sobre os valores que a população admirava em mulheres públicas. Influenciadores receberam pautas sutis: posts exaltando a importância de líderes terem ao lado companheiras fortes, exemplos para a sociedade.

O terreno estava sendo preparado. A cidade ainda não sabia, mas uma "caça" silenciosa começava - não por amor, mas por estratégia.

E, em meio às engrenagens frias do poder, uma jovem comum logo seria puxada para o centro de um jogo do qual não poderia escapar.