O clima aliviou, e os debates começaram. Julietta, dedicada, rabiscava números sem parar. Montou um esboço de orçamento e o entregou a Ribeiro, buscando aprovação. Mas o olhar dele a fez estremecer.
- Julietta... você acha que isso é o melhor que pode apresentar? - a voz dele era calma, mas carregada de crítica. - Sinto dizer que não. E garanto: o Sr. Vasconcellos também não ficará satisfeito.
O choque estampou-se no rosto dela. Ribeiro continuou, mais sério:
- Trabalhando ao lado de Heitor por tantos anos, aprendi uma coisa: ele sempre escolhe a pessoa certa para cada tarefa. Se ele confiou a você essa proposta, é porque enxerga um potencial que você ainda não descobriu. Agora, quanto a esse projeto... pense além das barreiras. O nome "Vasconcellos" estará nesse edital. Entenda a responsabilidade que carrega.
Julietta abaixou os olhos, sentindo o peso de cada palavra.
- Acredite - acrescentou Ribeiro -, quando lhe entregou o arquivo, Heitor já tinha os custos calculados em sua mente. Cabe a você superá-los. Volte ao trabalho e traga o melhor que puder. O Sr. Vasconcellos reagendou a reunião para amanhã, após o almoço. Troquem contatos e trabalhem como equipe. Este projeto é estratégico. Nosso CEO foi recentemente nomeado "Bilionário Jovem Mais Influente" e pode ser indicado ao cargo de embaixador da juventude, para incentivar startups no país. Isso trará prestígio a ele e à empresa. Façam jus à confiança que ele deposita em nós.
Ribeiro conhecia como ninguém a cultura da Vértice Global e sabia usar as palavras certas para motivar a equipe.
***
Julietta passou a noite debruçada sobre os cálculos com Rita e Theo. O engenheiro estrutural Paulo, jovem, entusiasmado e com domínio técnico, também se juntou ao grupo. Ele trouxe clareza às soluções e logo conquistou a confiança de Julietta, que sentiu nele um parceiro acessível e com energia positiva.
Na manhã seguinte, já na sala de conferências, Julietta ajeitou seus papéis. O coração batia acelerado, mas ela estava mais confiante de que Ribeiro aprovaria, desta vez, suas ideias. Expôs suas propostas diante dele.
Mas antes que o executivo reagisse, a porta se abriu e Heitor Vasconcellos entrou.
O ambiente gelou em um instante. Todos se endireitaram nas cadeiras. Do alto da mesa, ele percorreu cada rosto com olhar penetrante, até soltar um leve sorriso - apenas o suficiente para quebrar a tensão sufocante que dominava a sala.
- Então, como ficou a proposta? Srta. Sampaio, está pronta? - A voz de Heitor soou firme, implacável.
- Sim, senhor. - Julietta deslizou o arquivo sobre a mesa.
Ele folheou o documento em silêncio por alguns minutos. Então, fechou-o com um estrondo seco que fez todos se sobressaltarem. O som ecoou pela sala como um raio. Julietta sentiu o sangue sumir do rosto.
- Novecentos e cinquenta milhões para este projeto? - A voz dele carregava incredulidade. - Os números estão altos demais.
Virou-se para Paulo:
- Quanto custou o Marina Bay Sands, em Singapura?
- Aproximadamente 5,7 bilhões, senhor.
- E o World Trade Center? O Burj Khalifa?
- 3,9 bilhões e 1,5 bilhão, respectivamente.
Heitor apoiou as mãos sobre a mesa, os olhos faiscando.
- Então vamos comparar. Entendam a magnitude dessas construções e seus propósitos.
Durante uma hora inteira, ele guiou o grupo em análises intensas. Ao final, todos compreendiam melhor a visão e as expectativas de Heitor Vasconcellos.
- Este é apenas um centro de convenções - disse ele, pausado. - Mas, com o espaço limitado, transformaremos em um marco, um ponto que atraia atenção global. Agora me digam: que adições podemos incluir para torná-lo um lugar único?
Julietta respirou fundo e arriscou:
- Senhor, o lago malcuidado é um problema... mas também pode ser a solução. Podemos transformá-lo em um espaço recreativo: show de luzes, passeios de barco para crianças, caiaque, flyboard... atividades que atraiam famílias.
- Podemos acrescentar um complexo comercial, áreas de jogos - sugeriu Andréia, da arquitetura.
- Para ser mundialmente relevante, - acrescentou Paulo, - o centro deve acolher visitantes de todo o planeta. Podemos incluir um espaço cultural para celebrar a arte local, festivais e museus.
- Gastronomia internacional também é essencial - completou. - A comida é uma das maiores atrações.
Julietta voltou a falar, empolgada:
- Poderíamos criar um Centro de Caridade, um palco aberto para artistas de rua - música, dança, mágica - com a renda dividida entre eles e instituições beneficentes. Seria um espaço vivo, inclusivo, que traria público espontâneo.
Augusto Ribeiro sorriu, orgulhoso, diante da ousadia dela.
A sessão de brainstorming ganhou força, e Heitor observava em silêncio, satisfeito por ter provocado aquele ambiente criativo. Lançou um sorriso discreto a Ribeiro, que captou sua aprovação.
- Muito bem. As ideias são excelentes. Agora... incluam todas no orçamento já apresentado.
- O quê?! - o grupo reagiu em uníssono.
Julietta ficou boquiaberta.
- Senhor... isso é impossível.
Paulo tentou intervir:
- Talvez possamos adquirir o terreno do lixão e das terras baldias ao lado. Assim, teríamos espaço para essas novas estruturas. Mas, naturalmente, os custos disparariam.
Heitor virou-se novamente para Julietta, incisivo:
- Srta. Sampaio, você calculou tudo com base nos preços de mercado. Mas este é um projeto governamental. Teremos subsídios. Reduza os custos em dez por cento.
Julietta engoliu em seco.
- Está bem, senhor.
- E mais... corte a margem de lucro. De quinze, para quatro por cento.
- O quê?! - ela não conseguiu conter a incredulidade. - Isso não faz sentido!
O canto da boca dele se ergueu num sorriso calculado.
- Como já disse: é um projeto governamental. Teremos concessões, benefícios fiscais, taxas de royalties. Não trabalharemos de graça, Srta. Sampaio. - Pausou, cravando o olhar nela. - Mas trabalharemos com inteligência.