Sacrificou Tudo Por Um Homem Desalmado
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Capítulo 2

Ponto de Vista: Beatriz Alencar

Fomos à capela no aniversário da morte dos meus pais. Foi ideia de Leonardo, um grande gesto de arrependimento. Ele se ajoelhou diante das placas memoriais deles, seu rosto bonito uma máscara de tristeza, sua voz embargada por uma dor que parecia ensaiada.

"Eu sinto muito, Sr. e Sra. Alencar", ele murmurou, as mãos unidas. "Eu juro a vocês, vou passar o resto da minha vida compensando a Bia. Nunca mais vou machucá-la."

As palavras eram quase idênticas às que ele usara um ano atrás, quando descobri sobre a Carla. A lembrança fez meu estômago revirar.

"Eles não podem te ouvir, Léo", eu disse, minha voz vazia. "E mesmo que pudessem, duvido que gostariam de ouvir você profanar este lugar com suas mentiras."

Ele se encolheu, um lampejo de culpa cruzando suas feições antes de ser substituído por um remorso praticado. "Bia, por favor. Eu sei que errei. Juro, acabou com a Carla. Não significou nada."

"Significou o suficiente para você demolir a ala do hospital deles."

A promessa tinha gosto de ácido na minha boca. Era uma performance, e eu era a plateia relutante. Já tínhamos passado por isso. No ano passado, depois que encontrei as mensagens de Carla, fiz minhas malas. Ele me seguiu até o túmulo dos meus pais, caindo de joelhos na chuva, implorando, suplicando, prometendo que morreria sem mim. Ele até segurou um caco de um vaso quebrado no pulso, um ato dramático e desesperado que, para minha eterna vergonha, funcionou. Eu fiquei. Eu perdoei. E ele recompensou minha fé passando um trator por cima do meu coração.

"Eu já te disse, foi uma decisão de negócios. Não teve nada a ver com ela."

Seu telefone vibrou então, uma vibração baixa e insistente contra a reverência silenciosa do local. Ele olhou para o aparelho, o maxilar tenso.

"É a Carla, não é?" perguntei, embora já soubesse a resposta.

Ele não negou. Apenas me olhou, seus olhos suplicando por uma compreensão que eu não tinha mais para dar. "Ela... não está se sentindo bem. A gravidez dela tem sido difícil."

A palavra 'gravidez' foi um golpe físico. Sugou o ar dos meus pulmões, deixando um vácuo frio e cortante em seu lugar.

"Então você está indo embora", afirmei. Não era uma pergunta.

"Eu volto logo. Prometo. Podemos terminar nossas orações então." Ele se levantou, limpando a poeira de suas calças caras, sua atenção já a quilômetros de distância. Deixou o livro de orações que segurava no chão, esquecido.

Eu o observei ir, um gosto amargo enchendo minha boca. Este era o homem que uma vez passou uma noite inteira rezando terços pela minha mãe quando ela estava doente, orando por sua recuperação com uma sinceridade que me levara às lágrimas. Agora, ele não conseguia nem dedicar uma hora à memória deles.

Fiquei lá a noite toda, o frio do chão de pedra se infiltrando nos meus ossos, uma dor oca que espelhava a da minha alma. Rezei até minha voz ficar rouca, não por ele, mas por meus pais, pela força para fazer o que eu deveria ter feito um ano atrás.

Quando finalmente voltei para casa ao amanhecer, exausta e emocionalmente entorpecida, ele estava esperando. Cheirava a uísque e ao perfume enjoativo de Carla. Ele não disse uma palavra, apenas me puxou para seus braços, seu toque áspero e exigente. Ele me empurrou para a cama, seu peso me esmagando, seus lábios silenciando qualquer protesto antes que pudesse se formar.

Foi desesperado e punitivo, uma posse em vez de um ato de amor. Eu estava cansada demais para lutar, quebrada demais para me importar. Apenas fiquei ali, uma boneca em seus braços, esperando que acabasse. Depois, enquanto ele dormia, notei que ele não havia usado proteção.

A percepção foi um banho de água gelada.

"Léo", eu disse, sacudindo-o para acordar. "Você não..."

Ele resmungou, virando-se. "O quê?"

"Você não usou nada."

Ele ficou em silêncio por um momento, depois soltou uma risada áspera. "Qual a diferença? Não é como se você pudesse engravidar mesmo."

As palavras foram um tapa, mais forte e mais doloroso do que qualquer golpe físico. Minha mão reagiu antes que minha mente pudesse, o estalo da minha palma contra sua bochecha ecoando no quarto silencioso.

Meu coração parecia estar sendo espremido. Anos atrás, um acidente de carro me deixou com lesões internas. Os médicos foram gentis, mas firmes. *Conceber seria um milagre, Sra. Monteiro.* Leonardo tinha sido tão cuidadoso depois, tão terno, sempre consciente da dor que o assunto me causava.

Agora, ele o usava como uma arma. Em seu estupor bêbado, a verdade havia escapado, feia e venenosa. Ele me via como quebrada. Defeituosa.

Uma dor aguda e lancinante atravessou meu baixo-ventre. Eu arquejei, dobrando-me. Uma sensação quente e úmida se espalhou entre minhas pernas. Olhei para baixo.

Sangue. Muito sangue.

A última coisa que vi antes que a escuridão me consumisse foi o lampejo de pânico nos olhos de Leonardo enquanto eu desmaiava.

            
            

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