"Ele também está vendendo a descoberto nossa posição na Bio-Gen, aproveitando as informações que obteve enquanto trabalhava aqui."
Ela permaneceu em silêncio, o olhar fixo no horizonte.
"E, Sra. Franco", Marcos continuou, sua voz hesitante pela primeira vez. "Há mais uma coisa."
Ele fez uma pausa.
"As licenças de demolição para a ala leste do Sírio-Libanês foram aprovadas esta manhã."
O Doberman choramingou, sentindo a tensão súbita em sua mão.
A ala leste.
A Ala Pediátrica de Oncologia Esperança Franco.
A ala que eles haviam financiado em memória de sua filha.
O aperto de Glória se intensificou na coleira do cachorro, um espasmo involuntário de raiva. O Doberman latiu de dor.
Ela imediatamente soltou o aperto, sua respiração presa na garganta.
"Repita isso", disse ela, a voz perigosamente baixa.
"O Sr. Arruda usou sua posição no conselho do hospital para acelerar a demolição", relatou Marcos, com o rosto sombrio. "Ele está citando problemas de integridade estrutural, mas é mentira."
"Por quê?", a palavra foi quase um sussurro.
"Ele está construindo um spa e centro de bem-estar de luxo de última geração. Um presente... para a Sra. Contreras."
Um som escapou dos lábios de Glória, algo entre um suspiro e um rosnado.
Ela se levantou tão abruptamente que sua cadeira voou para trás e bateu na parede.
O copo de cristal Baccarat em sua mesa, cheio de água, tremeu e depois se estilhaçou no chão de mármore.
"Prepare o carro", disse ela, a voz como gelo.
O trajeto até o Sírio-Libanês foi um borrão. Quando ela chegou, a destruição já havia começado.
Um guindaste com uma bola de demolição balançava preguiçosamente em direção ao prédio, arrancando pedaços de tijolo e vidro.
A grande placa de bronze que dizia "Ala Esperança Franco" havia sido arrancada da parede e jazia descartada em uma pilha de escombros.
E ali, em meio à poeira e ao caos, estava Kaila.
Ela usava um capacete amarelo brilhante e dirigia os operários com gestos alegres e expansivos.
Ela segurava um buquê de balões cor-de-rosa.
Caio estava por perto, encostado em seu Bentley, um sorriso afetuoso no rosto enquanto a observava. Pareciam um casal feliz supervisionando a construção da casa dos seus sonhos.
O carro de Glória parou com um rangido.
Ela saiu, foi até o porta-malas e o abriu. Pegou a espingarda que guardava para viagens à sua fazenda.
Ela bateu o porta-malas. O som foi como um trovão no canteiro de obras barulhento.
Kaila se virou, seu sorriso vacilando ao ver Glória se aproximando.
"Glória! Que surpresa", ela chilreou, tentando parecer casual.
Glória ergueu a espingarda.
Ela não mirou em Kaila.
Ela mirou nos balões.
Ela atirou.
A explosão ecoou nos prédios ao redor. Os balões cor-de-rosa se desintegraram em pedaços de borracha.
Kaila gritou e se escondeu atrás de uma pilha de entulho.
"Você está louca?", Caio berrou, correndo para a frente.
Glória o ignorou. Ela engatilhou a espingarda, o som agudo e ameaçador, e atirou novamente para o ar.
Desta vez, a equipe de demolição largou suas ferramentas e correu para se proteger. O operador do guindaste congelou, com as mãos para o alto.
O silêncio caiu sobre o local.
"Todos que não são Caio Arruda ou Kaila Contreras", a voz de Glória soou, clara e imponente, "têm cinco segundos para sair. Depois disso, vou considerá-los um alvo."
Os trabalhadores não precisaram ouvir duas vezes. Eles fugiram.
Kaila espiou por trás dos escombros, o rosto pálido.
"Você é só uma velha amargurada que não suporta vê-lo feliz", ela cuspiu.
Caio se moveu para ficar na frente dela, protegendo-a com seu corpo. Foi um gesto protetor que revirou algo profundo dentro de Glória.
"Acabou, Glória", disse Caio, sua voz tingida de uma pena cruel. "Temos que seguir em frente do passado. Kaila é o meu futuro agora. Ela vai me dar um filho. Um novo começo."
Ele estendeu a mão para trás e pegou a de Kaila.
"Você sempre foi tão obcecada por trabalho, por controle. Talvez se você não fosse, Esperança ainda estaria aqui."
As palavras a atingiram com a força de um golpe físico.
"Kaila é pura", ele continuou, sua voz cheia de uma sinceridade doentia. "Ela não está manchada por todo o... pecado que nós estávamos. Este lugar... guarda muitas memórias ruins. É hora de construir algo novo. Algo lindo."
As mãos de Glória tremeram. Por um segundo, sua visão embaçou, e ela não conseguiu focar a mira da espingarda.
"Senhora?", Marcos estava ao seu lado, sua voz um murmúrio baixo de preocupação.
Ela balançou a cabeça, afastando-o gentilmente.
Ela abaixou a espingarda.
Ela passou por eles, em direção aos escombros onde a placa de bronze jazia. Ela se abaixou, seus movimentos rígidos, e ordenou que dois de seus homens a levantassem.
"Estamos de saída", disse ela, a voz rouca.
Ela se virou e começou a caminhar de volta para o carro, seus homens a seguindo com a placa pesada.
Um padre do departamento de pastoral do hospital, Padre Miguel, que esteve lá na dedicação da ala, correu até ela. Ele colocou em suas mãos a pequena caixa da pedra fundamental que havia sido deslocada. Continha uma foto dela e de Caio, e uma mecha de seu próprio cabelo.
Ela apertou a caixa contra o peito. A memória daquele dia era tão clara. Caio, com o braço ao redor dela, sorrindo para as câmeras. Ele havia prometido a ela que a memória de sua filha seria um farol de esperança para outras crianças doentes.
"Espere", Caio chamou atrás dela.
Ela parou, mas não se virou.
"Você não pode simplesmente levar isso", disse ele. "Faz parte da história do hospital. Nós podemos... incorporá-lo ao novo design do spa. Uma homenagem."
"Sim!", Kaila acrescentou ansiosamente. "Poderíamos colocar na sala de banho de lama!"
Glória não respondeu. Ela apenas continuou andando.
Caio se lançou sobre ela, tentando pegar a caixa.
Seus guarda-costas o interceptaram instantaneamente, prendendo seus braços atrás das costas.
Ela finalmente se virou para encará-lo, seus olhos tão mortos quanto um céu de inverno.
"Isso nunca foi sobre negócios, Caio", disse ela, sua voz plana e uniforme. "Mas você transformou em extermínio."
"A partir de agora, cada vez que você respirar será um presente meu. E eu virei cobrar."