Ele estava sentado atrás de sua mesa, uma montanha de papelada à sua frente.
Ele parecia diferente da última vez que o vi.
O charme descontraído que ele exibia em eventos sociais havia desaparecido, substituído por uma máscara de foco frio e distante.
Ele era, à sua maneira, tão formidável quanto Damião.
Sua cabeça estava inclinada sobre um documento, a testa franzida em concentração.
Ele não levantou o olhar quando entrei.
"Deixe na mesa", disse ele, com a voz monótona, presumindo que eu era uma empregada.
Sua assistente fechou a porta silenciosamente atrás de mim, nos deixando sozinhos.
O silêncio era pesado.
Hesitei, a caixa de doces parecendo ridiculamente leve em minhas mãos. "Sr. Reis?"
Ele ergueu os olhos e, por um momento, seus olhos, de um tom de cinza surpreendentemente claro, estavam completamente vazios.
Então, o reconhecimento surgiu e sua expressão mudou.
As linhas duras de seu rosto suavizaram-se quase imperceptivelmente.
"Alina", disse ele, sua voz perdendo a aspereza. "O que você está fazendo aqui?"
"Eu... eu trouxe algo para você", gaguejei, colocando a caixa em sua mesa. "Da Bianca Monteiro. Ela, uh, queria se desculpar por... esta manhã."
O olhar de Heitor caiu para a caixa, depois voltou para o meu rosto.
Ele não parecia surpreso, nem mesmo interessado.
Em vez disso, seus olhos se fixaram em outra coisa.
Ele se levantou, e meu coração deu um pulo na garganta.
Ele ia me dispensar.
Minha missão era um fracasso antes mesmo de começar.
Ele contornou a mesa, e eu me preparei para a rejeição.
Comecei a balbuciar, tentando salvar a situação. "Ela sente muito, ela espera que você venha ao baile, ela realmente quer-"
Ele não passou por mim.
Ele parou bem na minha frente.
Em sua mão havia uma pequena caixa de veludo.
Ele estava tão perto que eu podia sentir o cheiro limpo e fresco de sua camisa.
"Aqui", disse ele, estendendo a caixa para mim.
Olhei para ela, confusa. "O que é isso?"
"Um presente."
"Para a Bianca?", perguntei, minha mente acelerada. Isso fazia parte do estranho cortejo deles?
Ele não respondeu.
Simplesmente abriu a caixa.
Dentro, aninhada, havia uma delicada pulseira de ouro branco, adornada com um único e impecável diamante azul que parecia capturar a luz e mantê-la refém.
Era requintada.
Mais bonita, até, do que o colar que Damião me dera.
"É para você", disse ele suavemente.
Fiquei tão atordoada que não consegui me mover.
Ele tirou a pulseira da caixa, seus dedos roçando os meus ao fazê-lo.
Um choque estranho, como eletricidade estática, subiu pelo meu braço.
Ele pegou meu pulso gentilmente e prendeu a pulseira.
Parecia fria contra minha pele.
Lembrei-me então.
Ele havia enviado um presente uma vez antes, um par de brincos de diamante, após uma negociação particularmente tensa entre ele e Damião que eu ajudei a mediar.
Eu presumi que era um gesto formal de negócios, um agradecimento pelo meu papel.
Damião ficou furioso, acusando Heitor de tentar roubar seu "ativo mais valioso".
Eu devolvi os brincos imediatamente.
Agora, olhando para o cinza frio e claro de seus olhos, eu não tinha tanta certeza.
"Você estará no baile dos Monteiro?", perguntei, minha voz mal um sussurro, forçando-me a voltar à missão.
Ele me interrompeu, seu olhar intenso. "Você estará lá?"
Fiquei tão surpresa com a franqueza da pergunta, com o foco em seus olhos, que só consegui assentir mudamente.
Um sorriso lento se espalhou por seu rosto, transformando suas feições de severas para devastadoramente bonitas. "Então eu estarei lá."
Meu coração deu um salto estranho e desconhecido no peito.
Era um calor que eu não sentia há anos, uma pequena centelha de luz na escuridão.
Isso me aterrorizou.
Virei-me e fugi de seu escritório sem outra palavra, o pequeno sino da pulseira tilintando suavemente a cada passo em pânico.
Eu praticamente corri para fora do prédio, minha compostura em frangalhos.
Ao sair pelas portas principais para a rua, colidi com um peito duro.
"Opa, qual é a pressa?"
Era Damião.
Ele agarrou meus braços para me firmar, seu rosto gravado com uma urgência estranha e frenética. "Você está bem? Ele te tocou? Ele fez alguma coisa?"
Seus olhos, selvagens e possessivos, percorreram meu corpo, e então pararam.
Eles se fixaram na delicada pulseira em meu pulso.
O calor em seu rosto desapareceu, substituído por uma escuridão trovejante e aterrorizante.
Toda a sua postura mudou em um piscar de olhos.
"O que", ele rosnou, sua voz um ronco baixo e perigoso, "é isso?"
Eu me encolhi. "É... um presente. Do Sr. Reis."
Seu aperto em meus braços se intensificou, seus dedos cravando em minha carne como garras.
Com um movimento rápido e violento, ele arrancou a pulseira do meu pulso.
A corrente delicada se partiu, e o belo diamante azul caiu no pavimento.
"Agh!", gritei quando as bordas afiadas do fecho quebrado arranharam minha pele, tirando sangue.
Damião nem olhou para mim.
Ele latiu uma ordem para um de seus homens que estava por perto. "Descubra o que é isso. Compre dez deles. Envie para o escritório do Heitor Reis com um bilhete."
Ele se virou para mim, seus olhos ardendo com uma fúria que era ainda mais aterrorizante por sua frieza.
Ele agarrou meu pulso sangrando, me puxando para perto.
"Minha mulher", ele rosnou, sua voz um sussurro venenoso, "não usa presentes de outros homens."