A Esposa Que Ele Chamava de Babá
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Capítulo 4

Ponto de Vista: Graça Lobo

O auditório da escola zumbia com o murmúrio baixo da conversa dos pais. Entrei discretamente, meu rosto obscurecido por uma simples máscara preta e um lenço de seda sobre o cabelo. Escolhi um assento no canto dos fundos, um nicho sombrio que me dava uma visão perfeita do palco e da entrada. Eu era um fantasma na minha própria vida, esperando.

Meu celular vibrou no bolso do casaco. Uma mensagem do Heitor.

"Oi, ainda na casa da sua mãe? Espero que ela esteja melhor. Pensando em você."

A hipocrisia era tão descarada, tão espantosamente audaciosa, que quase me fez rir. Digitei uma resposta evasiva.

"As coisas estão estáveis. Focando nela."

A resposta dele foi instantânea. Um único emoji: um gatinho de desenho animado com olhos brilhantes, piscando.

O mesmo gatinho da foto de perfil de Carina Campos.

Uma onda de náusea me atingiu. Era o sinal deles. Um pequeno segredo, bem debaixo do meu nariz. Senti que ia vomitar.

Virei o celular, com a tela para baixo no meu colo, e não respondi. Deixe-o pensar que eu estava a mais de quatro mil quilômetros de distância, feliz e ignorante.

Alguns minutos depois, Carina Campos subiu ao palco. Ela trocou seu cardigã sem graça por um suéter de caxemira rosa suave e uma saia branca esvoaçante. Seu cabelo estava solto, estilizado em ondas suaves. Ela parecia a figura gentil e maternal que tanto desejava ser. Uma performance completa.

Minhas mãos se fecharam em punhos nos bolsos. A vontade de invadir o palco, de arrancar o microfone de sua mão e expô-la ali mesmo, era uma força física. Mas eu me contive. As palavras do meu pai ecoaram em minha mente: "Deixe seu inimigo construir a própria forca. Tudo o que você precisa fazer é fornecer a corda."

Carina bateu no microfone, um sorriso tímido e ensaiado no rosto. "Boa noite a todos! Bem-vindos à Reunião de Pais e Mestres do primeiro ano do Colégio Morumbi Sul. É maravilhoso ver todos vocês. Como professora, acredito que uma unidade familiar forte e harmoniosa é a base para o sucesso de uma criança..."

Ela continuou, falando clichês sobre valores familiares e envolvimento dos pais. Eu a observava, uma espectadora distante de um desastre iminente. Ela estava construindo sua plataforma, tijolo por tijolo falso.

Então, ela fez uma pausa, batendo os nós dos dedos no púlpito com um gesto falsamente tímido. "E falando nisso", disse ela, um rubor subindo por seu pescoço, "tenho um pequeno anúncio pessoal. Como alguns de vocês devem saber, meu próprio filho está nesta turma."

Um murmúrio percorreu a multidão. Era agora.

"E esta noite", ela continuou, sua voz crescendo de orgulho, "estou muito feliz que o pai dele pôde se juntar a nós para se apresentar como uma família. Por favor, deem as boas-vindas a Heitor e Bento Magalhães!"

Todas as cabeças na sala se viraram para a entrada. Uma onda de sussurros e suspiros se seguiu.

E lá estava ele.

Heitor. Meu marido. Ele segurava a mão do nosso filho, conduzindo-o para o auditório como se fosse uma coroação. Ele usava o terno sob medida que comprei para nosso aniversário e o relógio caro que lhe dei em seu quadragésimo aniversário. Ele parecia bonito, bem-sucedido e completamente fraudulento.

Mas foi o Bento que partiu meu coração.

Meu filho. Seu moletom favorito de dinossauro estava amassado, e seu cabelo, geralmente tão cuidadosamente penteado por mim todas as manhãs, estava úmido e grudado na testa. Suas bochechas estavam vermelhas de febre, e seus pequenos ombros caídos. Ele parecia exausto e doente.

Ele segurava a mão de Heitor, mas seus olhos percorriam a sala, arregalados e assustados. Ele parecia perdido.

Uma onda primal e feroz de fúria materna me atingiu. Eu queria correr até ele, arrancá-lo das mãos de Heitor e abraçá-lo até que ele parasse de tremer.

Mas me forcei a ficar parada. Meus nós dos dedos estavam brancos onde eu agarrava o assento. Ainda não. Não até que eles tivessem subido até o topo da forca que construíram para si mesmos.

Heitor sorriu para a multidão, um pai orgulhoso e parceiro devotado. Ele levou Bento para a primeira fila e sentou-se, depois se virou para a plateia.

"Obrigado a todos", disse Heitor, sua voz suave e confiante. Ele gesticulou em direção ao palco. "Eu só quero dizer o quão orgulhoso estou da Carina. Ela não é apenas uma professora maravilhosa, mas a mãe mais incrível para o nosso filho."

Ele então se virou para Bento. Sua voz, embora baixa, ecoou na sala silenciosa. "Bento, diga olá para a Mamãe Carina."

Bento balançou a cabeça, enterrando o rosto no lado de Heitor. Ele não olhava para ela.

"Não", Bento sussurrou, sua voz pequena, mas clara. "Ela não é minha mamãe."

Um pai na fileira à minha frente se virou para o marido. "Espera, eu pensei que a mãe do Bento era aquela mulher que organiza as festas? A bonita... Graça?"

A pergunta pairou no ar. O rosto de Carina ficou branco. Ela olhou para Heitor, seus olhos arregalados de pânico. O roteiro estava dando errado.

Este era o momento de seu triunfo, e nosso filho de sete anos o estava arruinando.

            
            

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