Na aristocracia, os casamentos arranjados eram utilizados como alianças estratégicas para fortalecer laços familiares, consolidar o poder e perpetuar dinastias. A decisão de quem se casaria foi tomada pelas nossas famílias. Mesmo no século atual, eu teria que manter o acordo se quisesse perpetuar e alastrar o legado da família Trevisani.
- Talvez você queira jogar o nome da sua família na sarjeta quando os tabloides publicarem que o magnata tem um caso com a babá da sobrinha. - Aquela constatação de Bianca soou mais como uma ameaça velada.
Um toque suave nos interrompeu.
- O que foi? - gritei, irritado.
- O detetive Rivera está aqui, senhor... - a voz da governanta ecoou do outro lado.
- Mande ele entrar.
Mantendo a pose elegante e aquele olhar que atravessava a alma, Bianca continuou me analisando.
- Falamos sobre o casamento depois...
- Como quiser, querido. - Enviou um beijo no ar e saiu.
Assim que abriu a porta, ela cruzou com o detetive, que a cumprimentou com sorriso polido.
- Entre e feche bem a porta, detetive - pedi.
Por dentro, eu já não sabia se esperava ter certeza de que a babá era culpada ou inocente.
Ponto de vista de Vitória.
Na manhã em que fui chamada ao escritório, soube que algo havia acontecido.
Todos os funcionários estavam tensos. Maximus estava com o semblante mais duro do que nunca. E Bianca, sorrindo como se tivesse vencido alguma guerra secreta.
- Na noite do acidente de Helena, as joias da minha irmã desapareceram - ele disse, olhando direto nos meus olhos. - Do cofre que só alguns têm acesso.
Meu coração errou uma batida.
- Sim... e o que tenho a ver com isso?
- Alguém deve responder pela morte da minha querida cunhada - disse Bianca, cruzando os braços. - E convenhamos, você não está aqui por caridade. Meu noivo já estava desconfiado, mas tinha que ter certeza de que era você quem estava roubando Helena.
Olhei para Maximus. Ele não disse uma palavra.
- Eu não peguei nada da sua irmã, senhor Trevisani - sussurrei, sentindo a garganta fechar.
Mas ninguém me ouviu.
- Aqui estão os recibos do colar de diamantes e dos brincos que você vendeu na loja de penhor.
- A sua irmã me deu quando eu pedi um adiantamento para pagar a dívida atrasada do hospital onde minha avó está internada - O detetive Rivera mencionou.
- Tenho certeza de que foi na mesma noite do acidente - Bianca acrescentou.
Encolhi os meus ombros; a única que poderia me defender era a senhora Helena Trevisani, mas já estava morta.
- Não roubei... - repeti, na esperança de que Maximus acreditasse na minha palavra.
- Há imagens da senhora dando três comprimidos para a irmã do senhor Trevisani.
- Sim, eram as medicações que ela tomava.
- Eram os calmantes que o médico da senhora Helena receitou... - Meus lábios tremiam quando falei.
- Não há qualquer receita médica dada para aqueles tranquilizantes, senhorita. - Enfático, o detetive deu a última cartada.
- Vou chamar a polícia. A babá é uma ladra e tem que ir direto para a cadeia.
- Espere. - O tom gutural do senhor Trevisani a interrompeu. - Os seus serviços nesta casa não são mais necessários, senhorita Clark. - A voz dele era tão fria quanto gelo. - Aconselho a sair desta cidade, pois nunca mais arrumará trabalho por aqui. - Arrume suas coisas e saia da minha casa.
- Mas eu...
- Basta - ele interveio, não permitindo que eu terminasse de falar. - Saia dessa casa ou vou fazer questão de te colocar na cadeira! - As palavras saíram entre dentes.
Naquela tarde, fui dispensada como uma engrenagem inútil e sem qualquer serventia. Nem mesmo tive a chance de me despedir da pequena Allegra.
Depois que peguei minha mala, desci as escadas sob os olhares condenatórios dos empregados que passavam por mim. Chegando ao primeiro piso, estava a caminho da saída quando senti um forte solavanco em minha perna. Olhei para baixo e vi Allegra.
- Quero ir viajar com você... - a menina se recusava a me soltar.
- Não posso te levar, querida.
- Mas eu quero ir. - Os olhinhos castanhos já começavam a marejar. - Não quero ficar com meu tio Max. - As bochechas de Allegra estavam vermelhas quando começou a chorar.
- Vem com a tia... - Bianca tentou puxá-la, mas a garotinha mordeu o braço dela.
- Allegra - O senhor Trevisani a chamou num tom mais rude. - Vá para o seu quarto.
A pobre criança não tinha culpa e, além de sentir falta da mãe, agora tinha que me ver partir. Se continuasse ali, Maximus me mandaria para a cadeia e eu não podia deixar a minha avó sozinha naquele momento tão delicado.
Agachei-me e sequei o pequeno rosto da menina.
- Allegra, vá arrumar sua mala, já vou subir pra te ajudar. - Forcei o riso para ludibriar a criança inocente que acreditou e obedeceu de imediato.
- O que pensa que está fazendo? - interpelou Bianca.
- Cuidem bem dela... - articulei antes de partir sem carta de recomendação e sem tempo para me defender.
Apesar do medo de ser presa, eu estava me sentindo mal por ter enganado a garotinha. Dentro do carro, olhei para cima e chorei ao ter um último vislumbre do quarto de Allegra.