Com um grito gutural que foi arrancado das profundezas da minha alma, eu me levantei cambaleando. Peguei o caco de vidro mais próximo do chão e avancei contra a mulher que segurava o telefone.
Ela gritou quando eu ataquei, o vidro cortando uma linha limpa em seu antebraço. O telefone caiu no chão de mármore, o vídeo ainda tocando.
Outro convidado gritou. O círculo de espectadores, que se aproximava como turistas mórbidos, recuou em terror.
Eu me virei, meus olhos selvagens, o caco de vidro ensanguentado estendido como uma garra. Vi a mulher que cortei, o rosto pálido de choque, olhando para o sangue que brotava de seu braço como se fosse uma substância estranha. A visão de sua dor trouxe um lampejo de satisfação sombria. Era uma obra-prima bela e carmesim contra a tela de sua pele pálida.
Os sussurros morreram instantaneamente. O salão ficou tão quieto que eu podia ouvir a batida frenética do meu próprio coração. Ninguém se moveu. Ninguém ousou sequer respirar muito alto. Todos estavam olhando para mim, para a mulher "louca" com sangue nas mãos e loucura nos olhos.
E pela primeira vez naquela noite, eles estavam com medo de mim. Ótimo.
Os seguranças, que estavam se aproximando, pararam. Eles trocaram olhares incertos, seu treinamento profissional falhando diante de uma fúria tão crua e imprevisível. Eles sabiam que eu era o problema de Fernando Albuquerque, mas também sabiam que um animal encurralado é o mais perigoso.
- Lixo inútil - murmurei, meu lábio se curvando em desprezo. Eles não eram uma ameaça. Eram apenas parte do cenário.
Meu alvo era Fernando.
Passei pelas estátuas congeladas da equipe de segurança e caminhei em direção ao lounge privado onde eu sabia que ele havia levado Cassandra. Os sons do salão de festas desapareceram atrás de mim, substituídos pelo rugido em meus ouvidos.
A porta do lounge estava entreaberta. Eu podia ouvir suas vozes lá de dentro.
- Chame o Dr. Evans aqui agora - Fernando dizia, a voz tensa de raiva controlada. - E diga a ele para ser discreto.
Houve um fungado suave.
- Nando - Cassandra choramingou. - Ela está mais louca do que antes. Você viu os olhos dela? Parecia que ela queria me matar.
Pressionei meu ouvido contra a porta.
- Naquele dia... depois do vídeo... ela veio para cima de mim com o atiçador - a voz de Cassandra tremia. - Se você não a tivesse parado, ela teria me cegado. Ou pior. Você tem que fazer alguma coisa, Nando! Você não pode deixá-la escapar com isso de novo!
- Eu sei, querida. Eu vou resolver - Fernando acalmou. Houve uma pausa. Quando ele falou novamente, sua voz era um murmúrio baixo e arrepiante, destinado apenas a ela, mas alto o suficiente para eu ouvir. - Ela é um brinquedo quebrado que só precisa ser colocado de volta em sua caixa. Eu gostei de quebrá-la uma vez. Vou gostar de novo.
Ele riu, um som sombrio e feio.
- Ela sempre teve tanto fogo. Tanta luta. Especialmente quando se tratava daquele cavalo estúpido. Ela realmente me desafiou por ele. A mim. Você acredita nisso?
Minha mão tremeu. Lembrei-me daquele dia. Ele tinha vindo ao meu quarto, seus olhos brilhando com uma luz estranha. Ele tentou me beijar, me tocar. Cometa sentiu meu medo. Meu lindo e corajoso cavalo arrombou a porta de sua baia e avançou, colocando-se entre mim e Fernando, com os dentes à mostra.
A memória era tão vívida que eu quase podia sentir a madeira áspera da parede nas minhas costas, o terror que me dominou. Fernando queria mais do que apenas minha obediência. Ele queria me possuir, corpo e alma. Ele queria colocar seu filho dentro de mim, me acorrentar a ele para sempre. Cometa me salvou. E Fernando nunca o perdoou por isso. O ataque me deixou estéril, incapaz de conceber. Um fato que enfureceu Fernando ainda mais.
O rugido em meus ouvidos se intensificou. Meu celular vibrou na minha bolsa. Olhei para a tela. João Pedro.
Meu dedo pairou sobre o botão de ignorar, mas então eu atendi.
- Bia? Você está bem? Minha segurança acabou de me dizer o que aconteceu. Fique aí. Estou chegando. - Sua voz era uma tábua de salvação de sanidade no meu mar de loucura.
- João Pedro - sussurrei, minha própria voz soando estranha e quebrada. - Ele está aqui. Eu... eu vou matá-lo.
- Não faça nada, Bia. Espere por mim. Por favor.
Mas eu não podia esperar. A raiva era uma coisa física, uma besta arranhando para sair do meu peito.
- Me ajude, João Pedro - engasguei, uma única lágrima escapando e traçando um caminho pela sujeira na minha bochecha. - Venha me buscar.
Encerrei a chamada.
Respirei fundo, o ar queimando minha garganta ferida. Então, com um grito que continha cinco anos de dor, raiva e luto, eu chutei a porta do lounge.
Ela bateu contra a parede com um estrondo ensurdecedor.
Fernando e Cassandra se viraram, seus rostos uma imagem de choque.
Eu não hesitei. Avancei, a faca que peguei dele ainda na minha mão. Ele tentou empurrar Cassandra para o lado, mas não foi rápido o suficiente.
Cravei a pequena lâmina fundo em seu ombro.
Ele gritou, um som agudo e gutural de dor.
Eu torci a faca, meus olhos fixos nos dele.
- Isso - rosnei, meu rosto a centímetros do dele - é pelo Cometa. Agora, vá para o inferno.