Escolhendo o Meu Alfa
img img Escolhendo o Meu Alfa img Capítulo 4 Sistema de classes
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Capítulo 6 Servidão img
Capítulo 7 A casa do herdeiro img
Capítulo 8 Tormento img
Capítulo 9 Potencial img
Capítulo 10 Esforço em vão img
Capítulo 11 Nevasca img
Capítulo 12 Abominável img
Capítulo 13 Passarinho prateado img
Capítulo 14 Falsa empatia img
Capítulo 15 Heroi ou vilão img
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Capítulo 4 Sistema de classes

Por algum motivo, o dia estava ensolarado, tão diferente da neve torrencial que despencou da tempestade noite passada. Um cheiro amadeirado subia no ar, à medida que a neve nos galhos das árvores derretia.

Eu me sentia estranhamente feliz aqui, sozinha. Raios luminosos adentraram pela janela, em um dos dias mais iluminados do ano. Ryan deixou que eu me refugiasse em seu chalé, e eu tinha roupa quentinha e comida. Pela primeira vez, poderia me ocupar com as coisas que eu queria fazer, não com o que eu precisava.

Desci até a biblioteca e peguei alguns livros para lê-los enquanto tomava uma xícara de chá e biscoitos. Com os dias contatos, eu precisava conhecer mais deste mundo, pois conhecimento era fundamental para a sobrevivência. Terrenos, topografias, mapas, fenômenos naturais, fauna, agricultura...

Quando se completava dezoito anos, ocorria o despertar do lobo, sendo também a idade de dispensa do orfanato. Uma vez lobos, os órfãos eram considerados aptos a sobreviver no mundo exterior e suportar as temperaturas congelantes, já que a forma de lobo era mais resistente ao frio do que a humana. Além disso, lobos eram muito mais fortes e hábeis, podendo sobreviver da caça.

Havia algumas categorias na hierarquia que eram definidos pelo nascimento e o sangue. O imperador, também proprietário da região central possuía o poder de decisão não só sobre o seu domínio, mas sobre todo o continente. Contudo, com sua ausência, as terras centrais estavam tão gélidas que mesmo os lobos tinham dificuldades de suportar aquela temperatura, motivo pelo qual as terras imperiais se tornaram desabitadas.

Em torno da região central, alcateias comandadas pelos alfas, os lobos mais fortes, cujo sangue lhe conferia poder de conexão com seus subordinados e controle. Os alfas eram os governantes de seus clãs, cujas terras foram demarcadas territorialmente de acordo com seu número populacional e força. Os limites territoriais alteravam de tempos em tempos, pois os líderes continuamente travavam batalhas em busca de expansão. Felizmente, a alcateia em que me encontrava, a Lua Prateada, estava em acordo de paz com seus vizinhos, após várias baixas e perdas enfrentadas no início da crise climática.

Abaixo dos alfas na hierarquia, estavam os betas, guerreiros formidáveis com lobos poderosos, aquele que estava ao lado direito do alfa para a resolução de problemas devido ao seu intelecto desenvolvido e racionalidade. O beta também era o responsável por proteger e aconselhar o líder, pelo gerenciamento financeiro do clã, aplicando medidas legais e investindo os impostos para a infraestrutura, dos projetos que eram aprovados e assinados pelo alfa.

Ao lado esquerdo do alfa e não menos importante, estava o gama, um lobo poderoso com instintos apurados, responsável por gerenciar a defesa do clã. O gama era responsável por recrutar e supervisionar o treinamento de soldados lupinos, por manter a ordem dentro do clã e também o responsável por tomar a frente em casos de guerras e conflitos, sob o comando Alfa.

Todos abaixo dessa hierarquia eram considerados ômegas, lobos que deveriam se submeter aos seus líderes e servir seu clã. Dentre estes, havia uma hierarquia à parte, com diferentes níveis de domínio.

No topo dessa hierarquia dos ômegas estavam os nobres. Eram as famílias ricas e proeminentes, aqueles cujos ancestrais carregavam medalhas e honras e cujo sobrenome transmitido possuía o poder de se fazer ser respeitado. Era uma posição de nascimento, determinada pelo sangue ou raramente alcançado a muito custo pelos mais fortes através de feitos significativos.

Abaixo, a classe média, lobos trabalhadores, fortes, mas não o suficiente para entrar em posições de destaque na guarda e subir de posição. Eram os mais numerosos e, graças ao seu trabalho duro, a alcateia ainda estava de pé.

A classe baixa eram lobos fracos, os aleijados ou mesmo os que nasceram sem sorte. Mas abaixo delas, ainda havia uma pior; os tardios e os não despertos. Aqueles que não possuíam força mágica suficiente para despertar seu lobo na idade correta geralmente nem sobreviviam para compor a baixa classe, uma vez que o mundo era extremamente cruel com eles. Sem força, sem lobo e sem apoio, desfaleciam rapidamente de frio ou de fome.

Em poucos dias, eu seria classificada assim, a pior categoria possível, uma posição de desgraça e humilhação. Para a dispensa oficial do orfanato e obtenção de auxílio e oportunidades de trabalho, era necessário mostrar seu lobo para avaliação. No entanto, para um não desperto, o destino era o descarte, uma vez que o critério mínimo para ser contrato era ter um lobo. Pior que ser olhado com desdém por ser um órfão, seria ser olhado com nojo e ódio por ser um não desperto inútil. Aos descartados, cabia o abandono completo e uma morte solitária.

Se não fosse a certidão de nascimento pega erroneamente em meu abrigo anterior, todos já saberiam que já fiz dezoito há quase três semanas. Lembrava-me perfeitamente do dia em que nasci, assim como lembrava de tudo desde então. É devido a isso que eu sabia que meu verdadeiro nome não era Mia.

Mia se parecia comigo, brincávamos juntas mas ela morreu, junto com todos os funcionários e crianças do abrigo naquele grande massacre. Naquele dia, os soldados do alfa levaram o que sobrou de útil da aldeia massacrada, sendo documentos, itens de utilidade que ainda poderiam ser aproveitados e o menos importante, eu.

Eles não deram importância a coleta de documentos no abrigo, apenas identificaram pela minha aparente idade e descrição que eu deveria ser Mia. Eles não se importaram nem comigo, quanto mais em me perguntar a veracidade das informações recolhidas. Em silêncio fui recolhida, e em silêncio fui colocada no orfanato que se tornou meu inferno nos últimos treze anos.

Uma pessoa sem lobo não tinha o direito de ter companheiro, pois companheiros predestinados tinham suas almas ligadas entre si através de um vínculo mágico entre seus lobos. Ryan logo perceberia que sou uma fraude. Com isso em mente, perguntava-me se seria seguro continuar neste lugar.

Por vezes, pensava que deveria recolher o máximo de comida possível e tentar fugir o mais longe possível deste clã e dele, mas isso me causava uma dor invisível, e eu odiava sentir dor. Não sabia dizer se isso era tolice ou fraqueza, mas eu queria esperar, acreditar que ele realmente me amava e que não me deixaria.

- O que realmente devo fazer? - perguntei-me, pesando os prós e contras das minhas opções.

Eu ainda não estava preparada para uma jornada pelo mundo e trilhar o desconhecido, pois sabia que, em meu estado atual, as taxas de sobrevivência seriam mínimas. Além disso, a capacidade de rastreio de um lobo, ainda mais do calibre dele, era imbatível, sem mencionar a diferente absurda de velocidade de um lobo para um humano. Talvez, a única forma de seguir em segurança era se ele me deixasse ir.

No fim, eu realmente precisava esperar, mas isso não significava que eu ficaria sem fazer nada. Desci para o escritório de Ryan, um pequeno cômodo nos fundos da cabana. Uma mesa pequena com folhas e material de escrita faziam a fachada de escritor dele parecer autêntica, e um armário no fundo com diversos livros tornava o ambiente aconchegante. Eu adorava o fato dele aumentar continuamente essa coleção por minha causa, adorava os poemas que ele escrevia e principalmente nossos momentos, em que ele se dedicava a lê-los para mim.

Sondei visualmente cada uma das estantes, selecionando os livros úteis. Se ele me abandonasse e me forçasse a uma jornada precoce, eu precisaria ter memorizado tudo o que pudesse ser útil. Geografia e mapas, biologia, química, física, e mesmo questões sobre plantas; tudo era conhecimento, e conhecimento era a chave para a sobrevivência. Mesmo sem um lobo, eu precisava fazê-lo, com o meu próprio poder!

Minha capacidade de decorar cada palavra para sempre, apenas por colocar o olho nas páginas podia ser considerado um dom raro, mas a capacidade de compreendê-las eu considerava ainda mais importante. Eu não tive muita oportunidade de estudo no orfanato, então precisava me esforçar muito mais se quisesse ser mais inteligente.

Sem perceber, vi-me adormecendo sobre o livro, sendo acordada ao som de batidas persistentes na porta. O medo se apoderou de mim, quando pensei na possibilidade da senhora Ilda ter vindo me buscar. O ambiente estava escuro, indicando que era noite. Pensei que talvez devesse simplesmente fingir que não tinha ouvido nada e ficar escondida na escuridão deste cômodo.

- Ryan, abra a porta! É urgente! Ryan! - Uma voz feminina chamava de forma persistente, alcançando-me. Quem é que fosse, gritava muito alto, parecendo desesperada. A contragosto, forcei-me a ficar de pé e caminhei silenciosamente para a parte frontal da casa.

Tal chamado logo se tornou um lamento, e pensei que talvez eu devesse abrir a porta e dizer àquela estranha que Ryan não estava, que passaria os próximos dias na cidade. Dei alguns passos em direção à porta, mas então meu corpo estremeceu. Os dedos finos e pálidos da minha pequena mão tremiam, a ansiedade aos poucos entrando e me consumindo. Agachei-me no chão, tampei meus ouvidos e recusei-me a ouvir. Não queria abrir, não queria encarar quem quer que estivesse ali.

Um silvo agudo soou momentos depois, o som do vento atravessando as canaletas externas do telhado. O tempo parecia ter escurecido ainda mais, enquanto uma tempestade de neve se aproximava, afugentando a estranha presença.

Incapaz de me mover, permaneci agachada, chorando silenciosamente, ansiando por uma presença que me dissesse que estava tudo bem, que eu estava segura agora. Apenas senti alívio ao perceber a neve caindo, cobrindo completamente a visão do mundo exterior. O vento cessou e o frio tornou-se um tipo de silêncio reconfortante.

Respirando e expirando profundamente diversas vezes, levantei-me e aproximei-me das cortinas, abrindo uma greta e mirando o exterior em estado de alerta. Não havia sinais de presença próximos. Inesperadamente, meus olhos captaram um cesto próximo à entrada, e perguntei-me o motivo daquela mulher ter deixado tal objeto ali.

Tentei varrer a área visualmente mais uma vez. Assim, tive a certeza de que se abrisse a porta para checar, ninguém me veria, uma vez que a densa neve que caía e a escuridão da noite impediriam olhares de longo alcance.

Com muito cuidado, destranquei a porta e abri uma greta. Após puxar a cesta para dentro cautelosamente, tornei a trancá-la. Suspirei aliviada quando percebi que não havia armadilhas e carreguei o cesto até a sala, acendendo a lareira antes de abri-la e checar seu conteúdo. Dentro, um cachecol vermelho e uma variedade de alimentos frescos. Eu não teria tido coragem de retirar nada, se não fosse uma carta no topo com a letra de Ryan, que dizia:

"Eu posso não estar por perto, mas continuarei de olho em você. Considere esses itens um presente por ter me ouvido e não ter aberto a porta. Até que eu volte, não importa quem seja, ou o que diga, não confie em ninguém."

            
            

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