Há uma frase que sempre falamos antes de acontecer algo, mas jamais pensei que ela definiria tão bem o que está por vir:
"Não pode piorar, pode?"
Quando finalmente termino de apertar inúmeras mãos e beijar vários rostos, apresentando a mim e ao meu trabalho, as crianças chegam para participar do evento.
Elas não ficarão muito tempo, apenas até o jantar, pois não queremos que se assustem ou saiam da sua rotina regrada.
Recebo as crianças junto com Aghata, enquanto todos se sentam em suas cadeiras. Levamos as crianças aos seus lugares e começamos a distribuição dos presentes. Admito que ver o olhar de felicidade e o sorriso de cada uma delas é a melhor sensação de realização do mundo.
Há um palco na cor vermelha com algumas cadeiras e, ao centro, um púlpito preto e um microfone nos aguardam para o início do evento. Converso com algumas freiras e com a madre superiora, deixo o número do meu telefone e afirmo que se precisarem de algo, devem me ligar.
Ao olhar para as crianças, percebo que uma está com os olhinhos avermelhados devido ao choro. Não quero ser indelicada e perguntar o que está acontecendo, mas amanhã entrarei em contato com o orfanato para obter mais informação. Por ora, as irmãs saberão cuidar melhor da situação.
Neste instante, percebo que a primeira-dama está me chamado para dar início ao evento.
- Boa noite a todos! Hoje estamos reunidos aqui em prol desses anjinhos, graças à autora Jasmin, que teve a ideia brilhante de unir duas coisas extremamente importantes: leitura e caridade. Darei a ela a palavra para que se dê início ao leilão e, enquanto isso, nosso pessoal estará nas mesas posicionadas ao fundo da tenda, vendendo seus livros. Após o jantar, essa autora excepcional distribuirá autógrafos a todos os presentes - a primeira-dama me apresenta muito bem, parecendo estar orgulhosa de si mesma.
- Obrigada, primeira-dama. É um prazer estar aqui esta noite. Fico muito feliz em ajudar as crianças e nada melhor que expandir nossos pensamentos com todos aqui presentes. - Faço uma pequena pausa e observo que muitos dos presentes se levantam para irem às mesas adquirirem os livros. - E para darmos início ao leilão, peço que todos olhem embaixo de suas cadeiras e peguem a plaquinha com um número de identificação. Elas deverão ser usadas para dar lances pelos lotes que iremos leiloar. - Aponto para a outra ponta e as moças trazem as peças a serem leiloadas. Percebo como alguns se animam e o burburinho começa. - O quadro "Os jogadores de Carta", do pintor Paul Cezanne; o quadro "Nu, Folhas e Busto", do pintor Pablo Picasso; um vaso Chinês de porcelana da Dinastia Qianlong e um vaso de porcelana da Dinastia Song, doados por almas caridosas que apreciam nossa causa. Iremos começar nosso leilão com uma viagem com tudo pago, cedida pela primeira-dama, para uma ilha paradisíaca, praticamente uma segunda lua de mel! - Saio do púlpito e deixo que Aghata conduza o leilão.
Ela é a mais indicada para isso.
- Agradeço a presença e a paciência de todos. Vamos começar leiloando a viagem, que será de dois dias em uma ilha paradisíaca com tudo que se têm direito! - A mulher levanta as passagens para que todos vejam. - O lance mínimo e inicial é de mil dólares! - fala animada, enquanto lentamente as placas são levantadas dando valores sempre maiores que o último lance dado. - Temos $2.500,00 do cavalheiro número cinquenta e cinco; agora temos $3.000,00 do cavalheiro número oitenta e sete. Vamos, senhores, é para as crianças! - incentiva animadamente enquanto observa cada lance dado.
Em menos de cinco minutos, já temos mais de vinte mil dólares e ela bate um martelinho pequeno, dando vitória a uma senhora muito bem-vestida e de sorriso agradável, que sobe ao palco para entregar o cheque e receber o prêmio.
Cada lance dado é uma nova vida para as crianças. As vendas dos livros tanto na festa quanto online estão ótimas e com isso poderemos atender a mais de uma instituição.
A próxima peça a ser leiloada é um quadro de "Cezanne" e equivale ao valor que a entidade precisa para não perder a casa, segundo o que foi avaliado.
Emily me chama em um canto para me mostrar as vendas online dedicadas à causa e observo que batemos a terceira meta em menos de uma hora.
Estou tão distraída que não vi quem arrematou o quadro.
Somente quando o som das palmas começa a ecoar pelo ambiente é que percebo que todos estão de pé e sorrio, fingindo que nada me distraiu por um instante. Noto que uma bela moça loira sobe no palco, entrega um cheque para Aghata, sussurra algo em seu ouvido e olha intensamente na minha direção. Observo que a loira não leva a pintura.
Me aproximo de Aghata enquanto observo a mulher sorrir para mim, voltando para o seu lugar.
- Por que ela entregou o cheque, mas não levou a pintura? - pergunto para Aghata.
- Ela disse que o dono virá buscar, mas ele quer que seja entregue pelas suas mãos. Parece que é um admirador!
Fico sem graça, viro para pegar o quadro e a moça me ajuda a entregar para o homem bem-vestido que possui cavanhaque e um estilo próprio.
Ele recebe o quadro e aperta minha mão.
- Obrigada pela generosa doação - agradeço a ele.
- Não fui eu, apenas vim pegar o quadro. - Ele aponta para trás e meus olhos seguem na direção do seu dedo. - Foi ele que comprou, senhorita Jasmin!
Meu sorriso vai sumindo lentamente quando percebo quem é o homem que se aproxima. Ele parece ter saído dos meus sonhos, está usando um terno bem-alinhado e é muito bonito.
Ele não deve ser real.
Não há fuga para mim, sinto que estou tendo uma alucinação e quando nossos olhos se encontram, ele sobe no palco vindo em minha direção.
Eu não sei como agir, estou sem fala e minha respiração está pesada. Sinto meu corpo tremer ao ver esse homem na minha frente.
Ele cumprimenta a primeira-dama e em seguida acena para Emily, que está visivelmente feliz com sua presença. Já eu, estou totalmente perdida!
- Espero não ter me atrasado tanto, meu amor! - ele fala com sua voz grave e rouca.
Seu olhar é indecifrável, mas é a distância sendo findada e seus lábios se apoderando dos meus que me fazem entender que estou perdida.
Não posso contrariá-lo, estamos na frente da imprensa e ao vivo. Sendo assim, preciso continuar com o teatro e depois conversar com ele para saber como sairemos dessa.
Ele tem uma pegada intensa e é bom demais. O beijo é saboroso e não há tempo para protestos, pois sua mão segura a minha cintura, colando ainda mais nossos corpos. Dou apenas um suspiro e entrelaço minhas mãos em seu pescoço, deixando que o momento defina o agora, para que não me perca no amanhã.
Eu me meti em uma enrascada enorme e meu namorado fictício acabou de se materializar na minha frente. O mais estranho é que ele está me beijando e estou gostando, e muito, disso!