Ponto de Vista: Helena
No carro, a caminho de casa, um silêncio sufocante preenchia o espaço entre nós. Eu agarrava o volante, meus nós dos dedos brancos.
"Precisamos conversar sobre o que aconteceu hoje à noite, Caio", comecei, tentando manter minha voz firme. "Esse tipo de comportamento não é-"
"Deixa pra lá, tá bom?", ele retrucou, olhando pela janela.
Então, ele se virou para mim. Por um segundo fugaz, sua expressão se suavizou, e ele usou um nome que não me chamava há anos.
"Mamãe..."
Uma centelha de esperança se acendeu no meu peito. Talvez meu menino ainda estivesse ali em algum lugar.
"... a culpa é toda sua", ele terminou, e a esperança morreu tão rápido quanto nasceu.
Eu o encarei, boquiaberta. "Minha culpa? Caio, você foi preso."
"Se você fosse mais como a Camila, talvez o pai não fosse tão infeliz o tempo todo!", ele cuspiu, suas palavras uma torrente de ressentimento guardado por muito tempo. "Talvez nossa família não fosse uma piada!"
Ele não parou por aí. A crueldade jorrou dele, um veneno que ele vinha guardando por anos.
"O que você faz, afinal? Você me leva pra escola, vai ao supermercado, planeja as festas idiotas do pai. A Camila tem uma empresa! Ela tem um milhão de seguidores! Ela é legal. Você... você é só... a mãe."
A palavra "mãe", antes um termo de carinho, agora era um insulto. Uma demissão. Um veredito sobre toda a minha existência.
Um zumbido estranho encheu meus ouvidos. O mundo parecia inclinar, as luzes da rua se transformando em borrões dourados. Parecia que meu coração estava sendo espremido por uma mão invisível, a pressão tão intensa que eu mal conseguia respirar.
Lágrimas, quentes e imparáveis, começaram a escorrer pelo meu rosto. Não eram apenas por suas palavras, mas pelos dezessete anos de sacrifício, de amor, de devoção que ele acabara de tornar insignificantes.
Tiffany, sentada no banco de trás, soltou um bufo de escárnio. "Meu Deus, ela tá chorando."
"É o que ela faz", disse Caio, sua voz plana e desprovida de qualquer emoção. "Ela chora. É tão dramático."
"Minha mãe diz que é porque ela é insegura", acrescentou Tiffany, sua voz pingando falsa simpatia. "Porque seu pai é tão bem-sucedido e ela... não é."
"Para de chorar", ordenou Caio, sem olhar para mim. "Você é tão velha. Por que tá chorando que nem um bebê? É patético."
As lágrimas pararam.
Assim, de repente. Foi como se um interruptor tivesse sido acionado dentro de mim. O peso imenso e esmagador da minha dor foi subitamente substituído por uma calma fria e vazia.
Eu olhei para o meu filho, olhei de verdade para ele, e pela primeira vez, eu vi o pai dele. A mesma inclinação arrogante da cabeça. O mesmo curvar desdenhoso do lábio. A mesma visão fria e transacional do amor.
Eles não me viam. Eles viam uma função. Um papel. Uma coisa que deveria servi-los, e quando falhava em atender às suas expectativas, deveria ser descartada.
Eu estava tão cansada. Um cansaço que ia até os ossos se instalou em mim. Eu queria parar o carro, sair e simplesmente ir embora. Ir embora da casa estéril e sem amor, do homem que me desprezava e do menino que era um estranho.
Quando entramos na longa e sinuosa entrada da nossa propriedade, outro carro já estava lá. Um conversível branco e elegante.
Camila Kirby saiu. Ela estava vestida com um terninho creme, parecendo ter acabado de sair de uma sessão de fotos de revista, mesmo à uma da manhã.
"Ah, Helena, graças a Deus!", ela exclamou, correndo em nossa direção, o rosto uma máscara de preocupação perfeitamente encenada. "Fiquei tão preocupada quando soube. O Ricardo está numa teleconferência com Tóquio, mas eu disse a ele que precisava vir."
Caio imediatamente saiu do carro e foi até ela, sua postura mudando de adolescente mal-humorado para filho obediente.
"Está tudo bem, Camila", disse ele, com a voz suave. "Eu estou bem."
"Coitadinho de você", ela arrulhou, acariciando seu cabelo. Ele se inclinou em seu toque como um girassol buscando o sol. Um gesto que ele não me oferecia há anos.
Eu os observei, um quadro perfeito de uma família amorosa. A madrasta bem-sucedida, o filho adorador. E eu, a mãe biológica inconveniente, constrangedora, do lado de fora, olhando para dentro.