Tarde Demais Para Seu Amor
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Capítulo 3

Ponto de Vista: Alina

A visão de Bernardo beijando Carla em nossa sala de estar foi como um golpe físico. O ar saiu dos meus pulmões, deixando uma dor oca em seu lugar. Fiquei paralisada, uma espectadora silenciosa do desmantelamento final e brutal da minha vida.

Guiei Júlio gentilmente escada acima até seu quarto. "Fique aqui e brinque com sua nova estação espacial, ok, meu amor? A mamãe precisa conversar com o papai um pouco."

Ele olhou para mim, seu pequeno rosto gravado com preocupação. "Você prometeu que iríamos embora. Em três dias."

"Eu prometo", sussurrei, beijando sua testa. "Três dias. Só você e eu."

Fechei a porta dele e desci a grande escadaria, cada passo parecendo mais pesado que o anterior. Bernardo estava me esperando na entrada do escritório. Ele agarrou meu braço, seus dedos cravando em minha carne, e me puxou para dentro, batendo a porta atrás de nós.

O escritório, antes nosso santuário compartilhado, agora era território alienígena. Meus livros sobre mecânica quântica e teoria computacional haviam sumido das prateleiras, substituídos por revistas de moda e romances. Uma manta rosa e fofa estava jogada sobre a poltrona de couro onde eu costumava sentar. O cômodo cheirava fracamente ao perfume enjoativo dela.

Foi aqui que começamos tudo. Foi aqui que esbocei a arquitetura inicial do Núcleo Prometeus em um quadro branco, com Bernardo me observando com um olhar de pura admiração. "Você é um gênio do caralho, Alina Wade", ele sussurrou, me beijando até eu ficar tonta. "Meu gênio." Aquela memória, antes uma fonte de conforto, agora parecia uma piada cruel.

"Que porra é essa?", ele rugiu, jogando um arquivo na mesa. Era a papelada de transferência de Carla.

"Eu te disse", falei, minha voz estranhamente calma. "Eu estava consertando sua bagunça."

Ele caminhou em minha direção, o rosto uma máscara de fúria. "Você acha que pode simplesmente se livrar dela? Como se ela fosse algum tipo de... inconveniência?" Ele apontou um dedo para o meu rosto. "Deixe-me ser claro. Você não vai tocar nela. Você não vai falar com ela. Você não vai nem olhar para ela. Entendido?"

"E os papéis do divórcio?", perguntei, as palavras com gosto de cinzas.

"Não haverá divórcio", ele zombou. "Você é a Sra. Bernardo Monteiro. Você permanecerá Sra. Bernardo Monteiro. Você fará o papel da esposa feliz e solidária, e não causará mais problemas."

Minha determinação se fortaleceu. O Núcleo Prometeus. Eu precisava dele. "Tudo bem", eu disse, minha voz plana. "Mas há uma falha crítica no último conjunto de dados. Preciso entrar no laboratório para fazer diagnósticos. Preciso de você para a autorização."

Ele me olhou, os olhos semicerrados de desconfiança. Por um momento, pensei que ele recusaria. Mas a ideia de sua preciosa empresa estar em risco era um motivador poderoso.

"A Carla tem uma consulta médica amanhã de manhã. Eu a levarei", ele disse, suas prioridades doentiamente claras. "Posso estar no escritório ao meio-dia. Você vai esperar."

Ele já estava perdido. Ele me via como uma megera ciumenta e vingativa, e Carla como uma vítima indefesa. Ele estava cego para a verdade, perdido em uma fantasia que ela havia tecido com tanta perícia.

Naquela noite, fui acordada por um grito agudo. Era Carla.

Antes que eu pudesse processar o que estava acontecendo, a porta do meu quarto se abriu e Bernardo entrou furioso. Ele me agarrou pelos cabelos, me arrastando para fora da cama e para o chão frio.

"O que você fez com ela?", ele berrou, o rosto contorcido de raiva.

Júlio, acordado pela comoção, saiu correndo de seu quarto. "Mamãe!", ele chorou, tentando puxar a mão de Bernardo do meu cabelo. Bernardo o empurrou, fazendo nosso pequeno filho tropeçar para trás e bater na parede.

Dor e fúria lutavam dentro de mim. Levantei-me com dificuldade, posicionando-me entre Bernardo e Júlio. "Não se atreva a tocar nele!"

"Eu devia saber", Bernardo cuspiu, seus olhos selvagens. "Ela é inocente demais. Ela nunca faria isso consigo mesma."

Ele me arrastou pelo corredor até o quarto de hóspedes onde Carla estava. A porta estava aberta. Ela estava no chão, o pulso sangrando no tapete branco imaculado. Um caco de um copo de água quebrado jazia ao lado dela. Ela estava soluçando, um lamento patético e teatral.

"Me desculpe, Bernardo", ela chorou, olhando para ele com os olhos cheios de lágrimas. "Eu só... eu não aguento mais. Ela disse... ela disse que você acabaria se cansando de mim. Que eu deveria acabar com tudo..."

Protegi os olhos de Júlio, virando seu rosto para o meu lado para que ele não pudesse ver a cena horrível. Mas eu vi. Vi o corte superficial, o caco de vidro cuidadosamente colocado, as lágrimas de crocodilo. Era uma performance, uma peça de chantagem emocional perfeitamente executada.

E Bernardo comprou cada segundo.

Ele correu para o lado dela, envolvendo-a em seus braços. "Está tudo bem, meu passarinho. Eu te peguei." Ele me fuzilou por cima do ombro dela, seus olhos cheios de puro ódio. "Você fez isso."

Ele a carregou para fora do quarto, gritando ordens para a equipe da casa chamar uma ambulância. Um par de seus guarda-costas me flanqueou, suas expressões sombrias. Eu era uma prisioneira em minha própria casa.

Eles me escoltaram até o hospital, com Júlio agarrado à minha mão. A sala de emergência era um borrão caótico de ruído e luz. Bernardo andava de um lado para o outro, um destroço perturbado, enquanto Carla era levada por uma equipe de médicos. Ele havia comprado a atuação dela tão completamente que estava genuinamente apavorado por ela. Teria sido risível se não fosse tão patético.

Ele finalmente parou de andar e se virou para mim, seu rosto uma máscara fria e dura.

"Você está gostando disso, não está?", ele disse, sua voz pingando veneno.

Antes que eu pudesse responder, ele se lançou sobre mim. No meio do corredor lotado do hospital, ele agarrou o colarinho do meu pijama de seda e o rasgou. Botões se espalharam pelo chão de linóleo.

Eu ofeguei, instintivamente tentando cobrir meu peito exposto. Ele agarrou meus pulsos, segurando-os com um aperto de torno.

"Deixe todo mundo ver", ele sibilou, o rosto a centímetros do meu. "Deixe que vejam o monstro feio e ciumento que você se tornou."

"Bernardo, pare com isso", supliquei, minha voz mal um sussurro. "As pessoas estão olhando."

O flash das câmeras disparou ao nosso redor. A imprensa, provavelmente avisada por sua própria equipe de relações públicas, havia chegado. Eles nos cercaram como abutres, suas lentes famintas pela minha humilhação.

"Quem sou eu?", ele exigiu, sua voz perigosamente baixa. "Diga."

Lágrimas embaçaram minha visão. "Você é meu marido", engasguei.

"E o que eu faço?"

"Você me protege", sussurrei, as palavras um eco oco de um passado há muito morto.

Com um puxão final e brutal, ele rasgou completamente minha blusa, deixando-me nua da cintura para cima sob a luz fluorescente e dura. Os flashes das câmeras eram implacáveis, um estroboscópio ofuscante de degradação pública.

"Eu vou te destruir, Alina", ele zombou, sua voz uma promessa fria. "Vou te despojar de tudo. Seu nome, sua dignidade, sua reputação. Quando eu terminar, você não será nada."

Ele costumava traçar a curva da minha clavícula com as pontas dos dedos, seu toque reverente. "Perfeita", ele murmurava. "E toda minha." Ele era obcecado pelo meu corpo, possessivo e territorial. Agora, era ele quem o expunha ao mundo, usando-o como uma arma contra mim. A ironia era um ácido amargo e ardente em minha garganta.

Caí no chão, tremendo incontrolavelmente enquanto tentava puxar os restos esfarrapados da minha blusa ao meu redor.

Ele se inclinou, sua voz um sussurro frio em meu ouvido. "As fotos já estão online. Bem-vinda à sua nova vida, Sra. Monteiro."

Ele se endireitou e se afastou sem olhar para trás, deixando-me exposta e quebrada no chão frio do hospital. Consegui dar uma risada fraca e trêmula que soou mais como um soluço. Apertei meu peito, uma dor física florescendo ali, aguda e insuportável. O homem que um dia jurou me proteger do mundo acabara de me jogar aos lobos.

                         

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