Ela ainda estava trancada lá dentro, e Tania havia ordenado que ninguém a soltasse até o fim da audição - e agora, o próprio Henrique Ballmer exigia a abertura da porta.
Sem alternativa, a gerente engoliu em seco e, com mãos trêmulas, enfiou a chave na fechadura.
O som metálico ecoou no silêncio como um trovão, e a porta se abriu lentamente. E, no instante seguinte, todos prenderam a respiração.
Uma mulher jazia no chão - inconsciente, o rosto pálido banhado pela luz fria que descia da claraboia.
O contraste entre o branco da pele e a sombra do ambiente fazia dela uma visão quase etérea.
- O que é isso?! - rugiu o dono do bar. - Por que há uma mulher trancada aqui dentro?!
- E-eu... eu não sei! - gaguejou a gerente, pálida. - N-não havia ninguém quando verifiquei antes!
Henrique não respondeu, e apenas olhou. Mas a criança foi mais rápida, e Mateo correu até a mulher e se jogou sobre ela, abraçando-a com força.
- Mateo! - Axel deu um passo, mas parou no meio do caminho, surpreso com a expressão no rosto do sobrinho.
O menininho olhava para Helena com um misto de medo e ternura - um olhar puro, protetor, como se quisesse guardar aquela mulher do mundo inteiro.
Henrique deu um passo à frente.
O olhar dele - afiado, calculista - percorreu a cena com precisão.
A escada caída.
A claraboia aberta - pequena demais para um adulto.
A lâmpada queimada.
E a culpa estampada no rosto da gerente.
Em segundos, ele entendeu tudo.
- Afastem-se. - A voz baixa, firme, cheia de autoridade, era tão fria que ninguém ousou respirar.
Os seguranças recuaram imediatamente.
Henrique se aproximou devagar.
E então, sem hesitar, ajoelhou-se ao lado de Helena.
O tempo pareceu parar.
A luz filtrada pela janela tocava o rosto dela, revelando traços delicados, serenos.
O cabelo negro caía sobre os ombros como seda.
Os lábios, mesmo desbotados, mantinham uma tonalidade suave, quase rosada.
Henrique sentiu o coração dar um salto involuntário.
Um som, uma lembrança, um instinto - algo dentro dele reagiu àquela mulher.
E então, o cheiro.
O mesmo aroma que impregnava as roupas de Mateo. Doce, puro... e cortante.
Um perfume que ele não deveria reconhecer, mas que, de algum modo, o fez perder o fôlego.
Sem dizer nada, passou um braço sob o corpo dela e a ergueu com cuidado, e o peso leve dela contra o peito era perturbador. Mateo o observava, imóvel - mas no olhar do menino havia algo que dizia tudo:
"Se eu fosse maior... eu mesmo a teria carregado."
Henrique manteve o semblante impassível, mas o toque dela queimava contra a sua pele, e a respiração de Helena, fraca e irregular, batia contra seu pescoço. E por um instante, o homem que nunca perdia o controle... vacilou.
Enquanto saíam do depósito, o bar inteiro assistia em silêncio, e ninguém percebeu o olhar que Henrique lançou para a mulher inconsciente - um olhar onde se misturavam curiosidade, fascínio e algo mais profundo... algo que ele ainda não ousava nomear.
Hospital Unimedes, São Paulo.
A luz suave da manhã atravessava as cortinas brancas, banhando o quarto com um brilho pálido e frio, e quando Helena abriu os olhos, por um instante pensou que ainda estivesse sonhando.
Um homem estava sentado à frente da janela - um retrato de poder e silêncio, e as pernas longas e elegantes cruzadas, o terno escuro sob medida moldando ombros largos e cintura impecável.
A camisa branca, abotoada até o colarinho, não tinha um vinco fora do lugar, e parecia feito de mármore.
Até que levantou o olhar. E o mundo de Helena parou.
Olhos profundos como o oceano, mas tão gélidos que pareciam congelar o ar.
Helena estremeceu.
Aquele olhar... era demais.
Invasivo. Cortante. Perigoso.
Desviou o rosto, tentando se recompor, e sussurrou, com a voz ainda fraca:
- C-com licença, senhor... como eu vim parar aqui? O senhor viu um menininho? Uns quatro ou cinco anos... branquinho, quieto, com um olhar meio distraído... e muito fofo?
O homem arqueou uma sobrancelha, como se achasse curioso o tom doce e despretensioso dela.
Depois desviou lentamente o olhar para a direita e respondeu, a voz grave e fria como aço:
- Você quer dizer... Mateo?
Helena seguiu o olhar dele - e o coração disparou, pois ao lado de sua cama, um bercinho hospitalar.
Dentro dele, o pequeno menino dormia profundamente, com um soro preso à mãozinha.
- Sim! É ele! - suspirou, aliviada, o rosto se suavizando. - O nome dele é Mateo, então...
Ela se inclinou, tocando a testa do menino. Estava fria.
A febre havia passado.
Um sorriso leve brotou em seus lábios - frágil e puro. Por um instante, esqueceu o homem que a observava em silêncio, e tudo o que sentia era alívio.
Mas, ao erguer os olhos de novo, sentiu o peso daquela presença. A aura dele parecia preencher o quarto inteiro.
Autoridade. Controle. Distância.
- O senhor é... o responsável por ele? - perguntou, ainda que já soubesse a resposta.
E foi.
- Eu sou o pai dele. - A voz saiu grave, baixa, implacável.
Helena piscou, surpresa.
As palavras ecoaram dentro dela - e antes que pudesse reagir, uma nova voz cortou o ar:
- Você finalmente acordou! - exclamou um homem, sorrindo nervoso. - Eu sou o tio da criança!
Helena levou um susto, recuando levemente.
Mas quando seus olhos focaram o rosto dele... ela arregalou os olhos.
- Axel Ballmer? É você mesmo?
Ele riu, um tanto sem jeito.
Axel Ballmer.
Playboy das revistas, herdeiro das manchetes, dono da World Entretenimento.
Carismático, imprudente, perigoso - o oposto completo do homem sentado à janela.
E se aquele era o tio...
Helena virou o rosto devagar, e o coração bateu mais forte.
Henrique Ballmer.O nome pesou em sua mente como um trovão silencioso, pois o lendário herdeiro do Grupo ProCosan.
Frio. Inacessível. Inabalável. E agora - o homem diante dela.