- Mulheres não aparecem desmaiadas com o meu filho nos braços por acaso.
A entonação era fria, mas por baixo dela havia outra coisa...
Uma curiosidade perigosa.
Um interesse que nem ele parecia disposto a admitir.
Helena abriu a boca para responder, mas a garganta falhou.
O coração disparava.
Aquele homem - com seu olhar glacial e presença avassaladora - parecia capaz de enxergar tudo o que ela tentava esconder.
E, pela primeira vez em muito tempo, Helena sentiu medo.
Não do perigo.
Mas de si mesma... e da força com que aquele estranho a fazia sentir.
Antes que pudesse continuar, Axel interveio, animado:
- Meu irmão quer te agradecer por ter salvo o Mateo! Ele pediu que você faça o seu pedido. Qualquer coisa, Helena!
Ela respirou fundo e o encarou.
- Senhor Ballmer, eu não quero nada. - respondeu com serenidade. - Eu salvei o Mateo, sim... mas ele também me salvou.
Henrique arqueou levemente uma sobrancelha.
Helena manteve a voz firme:
- Se ele não tivesse subido pela janela e pedido ajuda, eu ainda estaria presa naquele depósito. Então... - sorriu, gentil, mas decidida - podemos considerar que estamos quites.
O silêncio que se seguiu foi denso, e Henrique a observava, os olhos semicerrados, avaliando cada palavra, cada gesto.
E, pela primeira vez em muito tempo, algo dentro dele se moveu.
Uma emoção antiga. Incômoda. Quase esquecida.
Embora tivesse tido a sorte de salvar o herdeiro dos Ballmer, Helena jamais exigiria recompensa, pois para ela, aquilo era apenas o certo. Mas o leve franzir no rosto de Henrique - aquela expressão de impaciência contida - fez o coração dela disparar.
Por que aquele olhar frio era tão assustador?
Ela havia dito algo errado?
Antes que o silêncio se tornasse insuportável, Axel quebrou a tensão, rindo nervoso:
- Irmão, pelo amor de Deus, não faz essa cara! - Voltou-se para Helena, piscando. - Ele só está tentando te agradecer, mas com essa expressão... parece que vai te processar em vez de recompensar!
Helena piscou, dividida entre rir e chorar.
Axel prosseguiu, gesticulando:
- É sério! Meu irmão não suporta dever nada a ninguém. É mania dele. Então, por mais estranho que pareça, ele realmente quer te recompensar. Faça um pedido. Qualquer um.
Helena suspirou.
- Não é que eu esteja sendo educada - explicou com calma -, eu simplesmente não quero nada. E se vocês não acreditam, podem verificar. Foi tudo exatamente como eu disse.
Henrique não desviou o olhar.
- Não precisa. - Sua voz cortou o ar como uma lâmina.
O tom era baixo, mas carregava autoridade demais para ser questionado.
Axel assentiu, ansioso por aliviar o clima.
- Já verificamos. As câmeras mostram o Mateo entrando no depósito sozinho, e a gerente confessou, foi ela quem te trancou lá dentro. Então relaxa, ninguém suspeita de você.
Mas, já que você salvou meu sobrinho, é justo pedir algo em troca.
Helena respirou fundo.
Parecia impossível escapar daquilo, e o olhar de Henrique - firme, penetrante, predatório - a pressionava sem precisar de uma palavra.
Ele não iria deixá-la sair dali sem uma resposta.
- Então... - ela cedeu, tentando parecer confiante. - Que tal... você me dar dinheiro?
O silêncio que se seguiu era quase palpável.
Podia-se ouvir o tique-taque do relógio da parede.
O rosto de Henrique escureceu.
A linha da mandíbula se contraiu levemente.
Helena engoliu em seco, já arrependida.
- Eu... não quis dizer... - começou, mas Axel a interrompeu, rindo nervoso:
- O que meu irmão quer dizer é que... hum... ele acha que dinheiro é pouco pra te agradecer.
"Pouco?!"
Helena arregalou os olhos. Ela só queria sair dali viva. Mas antes que pudesse recusar, a voz grave e gelada de Henrique se ergueu, límpida, como uma sentença:
- Então... que tal se casar comigo, Srta. Rodrigues?
O ar sumiu do quarto.
Por um segundo, o mundo pareceu parar.
Helena tossiu, engasgando com o próprio ar.
- C-como é que é?! - balbuciou, virando-se desesperada para Axel. - Ele está... falando sério?
Axel passou a mão no rosto, incrédulo.
- Henrique... o que diabos você quer dizer com isso? Tá bem da cabeça?
Helena, pálida, apertou o travesseiro com força.
- Senhor Ballmer... o senhor quer me agradecer com um casamento?!
Henrique inclinou levemente a cabeça, e após alguns segundos, respondeu com aquela naturalidade glacial que fazia a pele arrepiar:
- Sim. Exatamente isso.
O silêncio voltou, pesado, sufocante, e Helena piscou, incapaz de reagir.
Devia estar delirando.
Ou... ele estava.
Helena levou a mão à testa, exausta.
- Senhor Ballmer... acho melhor o senhor chamar o médico. - murmurou, com ironia. - Talvez eu tenha batido a cabeça e esteja tendo... alucinações.
Axel conteve uma risada nervosa, olhando do irmão para ela. Mas Henrique continuava imóvel, e nem um músculo se mexia.
Apenas a observava - com aquele olhar profundo, silencioso e inabalável.
E por um instante, Helena sentiu o coração vacilar.
Não porque acreditasse na proposta absurda...
Mas porque havia algo naquele olhar - algo que a fazia perder o eixo. O ar pareceu mudar, pesado, denso, como se a presença dele tivesse gravidade própria.
Mesmo assim, a lógica tentava gritar dentro dela.
Ela havia salvado uma criança.
Só isso.
E agora o pai do menino queria "retribuir"... com o casamento? O homem mais frio, arrogante e inacessível de São Paulo?
O magnata que as revistas chamavam de o rei poderoso? Aquele que parecia ver o mundo como um tabuleiro e as pessoas como peças?
- Você não é gay, Sr Ballmer? - perguntou Helena, de repente.
O silêncio que se seguiu foi ensurdecedor, e o rosto de Henrique Ballmer escureceu na hora - sombrio, tenso, como o fundo de uma panela de ferro.
Axel, ao lado, arregalou os olhos... e então explodiu em risadas, quase engasgando.