Deslizei um maço de dinheiro pelo balcão.
"Se alguém perguntar, você nunca me viu", eu disse.
Salomão folheou as notas com velocidade praticada.
"Por essa grana, nem eu me vejo no espelho."
Peguei o envelope e saí, dissolvendo-me no anonimato da rua lotada.
Meu coração batia contra minhas costelas.
Eu estava cometendo traição contra a Organização.
Se Breno descobrisse, ele não apenas me mataria.
Ele me trancaria na ala oeste da propriedade e me deixaria lá até eu virar pó.
Peguei três táxis diferentes para chegar ao laboratório de Evan em Pinheiros.
Estava disfarçado de uma clínica veterinária desativada.
Evan estava me esperando no subsolo.
A sala era branca, estéril e terrivelmente fria.
Uma cadeira de metal com pesadas tiras de couro estava no centro.
Parecia uma cadeira elétrica.
"É aqui?", perguntei.
Evan assentiu, seu rosto pálido.
"Esta é a máquina que induz a inundação neuroquímica", ele explicou, tocando em um console. "Ela atinge o hipocampo e a amígdala. Essencialmente, dissolve as vias sinápticas associadas à memória episódica. Você manterá sua memória semântica - saberá como falar, como dirigir, como usar um garfo. Mas a história da sua vida? Desaparecerá."
"Vai doer?", perguntei.
"De forma excruciante", ele disse.
"Ótimo", eu disse. "Queime tudo."
"Você tem que ter certeza, Eleonora", disse Evan, segurando meus ombros. "Depois que eu apertar aquele êmbolo, não há volta. Você não saberá quem é Breno. Não saberá que ele é perigoso. Você será uma ovelha caminhando em um mundo de lobos."
"Eu tenho um plano para isso", eu disse, batendo no bolso onde guardei um caderno. "Escrevi instruções para a Júlia."
Ele me olhou com pena.
"Por quê?", ele perguntou. "Por que não apenas fugir?"
"Porque ele me encontraria", eu disse. "Ele viraria o mundo de cabeça para baixo para encontrar Eleonora Ricci. Mas se Eleonora Ricci não existir... se não houver reconhecimento em meus olhos quando ele me encontrar... ele perde."
Era a única maneira de vencer um narcisista como Breno.
Negar-lhe a satisfação do meu medo.
Negar-lhe a satisfação da minha memória.
Verifiquei meu relógio.
Eu tinha que estar em casa em uma hora para me vestir para o jantar.
Breno estava trazendo os Gerentes.
Eu tinha que interpretar a anfitriã perfeita.
Toquei o metal frio da cadeira.
"Até quinta, Evan."
Saí do laboratório e voltei para a luz do sol.
Chamei um táxi e dei o endereço da fortaleza.
Quando entrei pela porta da frente, Breno estava esperando no hall.
"Onde você estava?", ele perguntou, seus olhos se estreitando. "O rastreador do seu carro disse que você estava na Zona Leste."
Senti uma pontada de adrenalina, afiada e fria.
"Fui àquela loja de antiguidades que você odeia", menti suavemente. "Aquela com as luminárias vintage. Queria encontrar algo para o escritório."
Seu rosto relaxou.
Ele acreditou.
Porque na mente dele, eu era simples.
Eu era doméstica.
Eu era uma dona de casa com um cartão sem limites.
Ele se aproximou e beijou minha testa.
"Da próxima vez, leve um segurança", ele disse. "A Zona Leste não é segura."
Reprimi uma risada sombria.
A única coisa insegura na minha vida estava bem na minha frente, vestindo um terno de quinze mil reais.
"Eu levarei, querido", eu disse.
Passei por ele e subi as escadas.
Cada passo era uma contagem regressiva.
Três dias.