"Não estou com fome", eu disse, tomando um gole lento e deliberado de água.
"Você é sempre tão séria", ela suspirou, recostando-se no veludo macio. "Sabe, na gala da próxima semana, as pessoas vão comentar. Dizem que o casamento dos Santos é... estritamente comercial. Um contrato."
Ela girou o vinho, observando o líquido vermelho cobrir a taça. "Deve ser difícil, saber que você foi apenas uma assinatura em um pedaço de papel."
Bernardo franziu a testa, mas não a impediu. "Ari, já chega."
"Estou apenas dizendo", ela fez beicinho. "É triste. Ser um peão."
Coloquei meu copo na mesa. O som foi suave, mas pesado.
"Eu sou a Arquiteta dos empreendimentos imobiliários dos Santos", eu disse, minha voz caindo para uma calma glacial. "Eu canalizo mais dinheiro através de projetos de construção legítimos em um mês do que sua galeria fatura em uma década. Eu não sou um peão, Ariane. Eu sou o tabuleiro."
Ela se encolheu. Bernardo olhou para mim, surpreso. Ele raramente via os dentes por trás do sorriso.
De repente, a sala tremeu.
Não foi um terremoto. Foi uma explosão vinda da cozinha - um vazamento de gás, ou uma bomba. O som foi ensurdecedor, um rugido que sugou o ar da sala e o substituiu por uma parede de pressão.
O chão se inclinou.
Acima de nós, o enorme lustre de cristal, um gigante de vidro e aço pesando meia tonelada, gemeu. O gesso do teto rachou com o som de um tiro.
Estava caindo.
O tempo se dilatou. Eu o vi caindo em câmera lenta. Uma guilhotina brilhante.
Eu estava sentada à esquerda. Ariane estava à direita. Bernardo estava no meio.
Ele teve uma fração de segundo. Um instinto. Uma escolha.
Ele não olhou para mim.
Ele se jogou para a direita.
Ele derrubou Ariane da cadeira, jogando seu corpo sobre o dela, protegendo-a com sua própria carne e osso, rolando ambos para debaixo da pesada mesa de carvalho.
Eu fiquei sentada ali.
Eu o vi escolher.
Então o mundo explodiu.
Cristal se estilhaçou. Metal gritou. Um pesado acessório de latão bateu no meu ombro, me jogando no chão. Cacos de vidro choveram como punhais. Um pedaço do teto desabou, prendendo minha perna.
Dor, branca e ofuscante, subiu pela minha coxa. Eu gritei, mas o som se perdeu no caos dos alarmes e dos gritos.
Poeira encheu o ar. Eu estava tossindo, engasgando com gesso e medo.
"Ariane! Você está bem?"
A voz de Bernardo. Frenética. Desesperada.
"Eu... acho que sim", ela gemeu de debaixo da mesa. "Você me salvou."
"Fique abaixada", ele ordenou. "Não se mova."
Eu estava deitada nos escombros, a um metro e meio de distância. O sangue encharcava meu vestido esmeralda. Minha perna parecia estar em chamas.
"Bernardo", grasnei. Saiu como um sussurro quebrado.
Ele saiu de debaixo da mesa, ajudando Ariane a se levantar. Ela não tinha um arranhão. Ele verificou a cabeça dela, os braços, as mãos frenéticas.
"Bernardo", eu disse mais alto, com os dentes cerrados.
Ele se virou. Ele me viu.
Eu estava meio enterrada sob gesso e vidro. Minha perna estava torcida em um ângulo antinatural.
Seu rosto ficou pálido. Por um momento, apenas um momento, vi horror em seus olhos.
"Carolina", ele sussurrou. Ele deu um passo em minha direção.
"Senhor! Temos que evacuar! Vazamento de gás! Explosão secundária iminente!" Um segurança agarrou o braço de Bernardo.
"Minha esposa", disse Bernardo, apontando para mim.
"Nós cuidamos dela, Senhor! Você precisa tirar a Senhorita Whitfield, ela está tendo um evento respiratório!"
Ariane estava ofegante, agarrando o peito, interpretando o papel do cisne moribundo com perfeição. "Bernardo... não consigo respirar..."
Bernardo olhou para mim. Eu estava consciente. Estava sangrando, mas olhava para ele com olhos claros e mortos.
Ele olhou para Ariane, que estava hiperventilando.
"Tirem a Carolina daqui", Bernardo ordenou ao guarda. "Agora!"
Então ele pegou Ariane nos braços e correu para a saída.
Ele me deixou.
De novo.
O guarda me arrastou para fora. A dor era excruciante, arrastando minha perna quebrada sobre os destroços. Mordi o lábio para não gritar o nome dele.
Fui colocada em uma ambulância separada. Sozinha.
Quando as portas se fecharam, eu o vi na calçada, verificando o pulso de Ariane, ignorando completamente a maca que passava por ele.
Fechei os olhos. A dor física não era nada comparada à clareza.
O registro em minha mente se atualizou automaticamente.
*Menos vinte pontos.*
*O lustre caiu.*
*Ele se tornou o escudo dela.*
*Eu me tornei a vítima.*
*Pontuação Total: 10.*