Enfiei a mala de lona no fundo do duto de ventilação atrás do armário de hóspedes, parafusando a grade de volta no lugar com os dedos trêmulos.
Quando Dante finalmente voltou, ele entrou no quarto como se não tivesse jogado meu táxi para fora da estrada dias atrás.
"Vista-se", ele ordenou, jogando uma pesada capa de terno na cama. "Vamos comemorar."
"Comemorar o quê?" Eu não levantei os olhos do meu livro, embora as palavras estivessem borradas diante dos meus olhos.
"A doação da Mia. A cirurgia está marcada para a próxima semana. Teremos um jantar privado no D.O.M."
"Eu não vou."
Dante se moveu em um piscar de olhos.
Ele agarrou meu queixo, seus dedos cravando em minha mandíbula com força, inclinando minha cabeça para trás.
"Você vai. Você vai sentar lá, vai sorrir e vai agradecê-la por salvar a vida do seu pai. Entendeu?"
Procurei em seus olhos escuros por um vislumbre do homem que um dia conheci.
Não havia mais amor ali. Apenas posse. Apenas controle.
"Entendi", sussurrei.
O jantar foi uma câmara de tortura disfarçada de veludo e cristal.
Mia sentou-se na cabeceira da mesa - meu lugar - cercada pelos capitães de Dante e suas esposas.
Ela estava radiante, brilhando com falsa modéstia. Ela comandava a atenção como uma rainha, recontando o "acidente" com um toque dramático, pintando-se como a corajosa sobrevivente que havia suportado tanto estresse.
Dante deu uma ostra na boca dela, uma exibição íntima e escorregadia que revirou meu estômago.
Bebi minha água com gelo, tentando anestesiar a dor fantasma que irradiava do meu braço fraturado.
"Vamos jogar um jogo", sugeriu uma das esposas, sua voz arrastada por um vinho caro. "Verdade ou Desafio."
A garrafa de vinho vazia girou na toalha de mesa branca e impecável, um borrão verde vertiginoso.
Ela desacelerou, balançou e parou.
Apontando diretamente para mim.
"Verdade ou Desafio, Elena?", Mia perguntou, seus olhos brilhando com um prazer predatório.
"Verdade."
A conversa na mesa morreu instantaneamente.
"Qual foi o melhor presente que você já deu ao Dante?", Mia perguntou, inclinando-se para frente, um desafio em seu sorriso.
Dante sorriu de lado, girando o líquido vermelho em sua taça. Ele esperava que eu dissesse minha virgindade, minha lealdade inabalável, ou alguma outra oferenda patética à qual ele se sentia no direito.
Eu o encarei nos olhos, meu olhar firme e frio.
"Eu ainda não dei", eu disse.
"Oh?", Dante ergueu uma sobrancelha escura. "É uma surpresa?"
"Pode-se dizer que sim." Forcei um sorriso. Parecia uma lâmina entre meus lábios. "Estou te dando um presente muito grande e muito permanente em breve."
A mesa murmurou em aprovação. Eles pensaram que eu me referia a uma Ferrari. Ou talvez a uma criança - um herdeiro para seu império.
Dante parecia satisfeito, seu ego suficientemente massageado. "Estou ansioso por isso."
Peguei minha taça.
"Aos presentes", eu brindei.
Bebi o vinho de um só gole.
Tinha gosto de liberdade.
Ele não sabia que o presente era a minha ausência.
E quando ele o desembrulhasse, eu não seria nada mais do que um fantasma.