A Traição Fatal do Meu Noivo
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Capítulo 3

Ponto de Vista de Clarissa Ferraz:

A memória do acidente, do sangue, do osso, tudo voltou com força. Mas era fugaz, um eco distante comparado ao zumbido constante da traição. Meu fantasma, um observador silencioso, era arrastado na esteira de Diogo, um tormento muito pior do que qualquer dor física.

Nem sempre tinha sido assim. Não tão descarado. Mas as rachaduras já tinham aparecido, não é? Eu só não queria vê-las.

Lembrei-me do ano passado, quando Diogo prometeu uma escapada de fim de semana, só nós dois, para comemorar nosso aniversário. Tínhamos reservado aquela pequena pousada em Campos do Jordão, sem sinal de celular, apenas silêncio.

Dois dias antes, Kimberlee teve um "ataque de pânico" por causa de uma aranha em seu apartamento. Diogo cancelou. Ele disse que tinha que estar lá para ela, que suas fobias eram incapacitantes. Eu não discuti. Apenas guardei a lingerie nova e fingi que entendia.

Depois teve a vez em que planejei um jantar surpresa de aniversário para ele. Cozinhei seu prato favorito, convidei seus amigos mais próximos. Kimberlee ligou, transtornada, alegando que um "carro estranho" estava estacionado do lado de fora de seu prédio. Ele deixou o jantar, abandonando sua própria comemoração, para ir "protegê-la". Ele voltou horas depois, cheirando vagamente a comida barata de delivery e ao perfume enjoativo de Kimberlee, e murmurou um pedido de desculpas sem entusiasmo sobre os nervos frágeis dela.

Eu tentei falar com ele uma vez. "Diogo", lembro-me de dizer, minha voz suave, "as fobias da Kimberlee parecem se manifestar muito quando temos planos. Você não acha um pouco... conveniente?"

Seus olhos, geralmente quentes quando olhavam para mim, ficaram frios, uma tempestade familiar se formando por trás deles. "Clarissa", ele disse, sua voz seca, "você é uma cirurgiã. Você lida com fatos. Kimberlee é vítima de um trauma. Seus medos são reais. Você, uma profissional da saúde, deveria entender isso." Sua mão disparou, agarrando meu braço, um pouco forte demais. "Nunca mais questione ela. Você me entendeu?" O hematoma desapareceu em alguns dias, mas a ferroada de sua acusação, a implicação de que eu era insensível, permaneceu.

Ele ameaçou terminar o noivado naquela vez, suas palavras como punhais. "Se você não pode aceitar minha família, Clarissa, então talvez isso não vá funcionar. Talvez você não seja a mulher que eu pensei que você era." Eu desmoronei, prometendo ser mais compreensiva, ser melhor. Eu me odiei por isso, mesmo naquela época.

Então, quando a data do casamento foi marcada, decidi surpreendê-lo. Encontrei o relógio antigo perfeito que ele sempre admirou, planejei um jantar romântico em seu restaurante favorito para entregá-lo. Eu estava a caminho de lá, animada, esperançosa de que desta vez, desta vez, nada daria errado. Desta vez, nosso amor triunfaria.

Essa foi a noite em que Kimberlee me jogou da ponte.

Meu fantasma pairava, a dor crua da traição agora se misturando com o peso esmagador do arrependimento. Como pude ser tão cega? Tão desesperada por seu amor que ignorei todos os sinais de alerta?

Minha visão embaçou, não com lágrimas, pois fantasmas não choram, mas com a pura força de minhas memórias se desfazendo. Fui arrancada da ambulância, puxada por uma força invisível, atraída de volta para Diogo. Nosso vínculo, rompido em vida, era uma amarra miserável na morte.

Ele estava em um quarto de hospital estéril e opulento. O hospital. Nosso hospital. Aquele que sua família possuía. Kimberlee estava deitada em uma cama de luxo, vestida com uma camisola de seda, um cobertor macio puxado até o queixo. Um residente, um médico júnior que eu havia orientado, estava nervosamente parado perto da porta.

"A Sra. Salles está estável, Dr. Fontes", relatou o residente, sua voz baixa. "Sem ferimentos físicos. Administramos um sedativo leve para a ansiedade."

Kimberlee gemeu, seus olhos se abrindo. "Diogo? Oh, Diogo... foi tão horrível. A tempestade... e a Clarissa... ela estava com tanta raiva." Ela estendeu a mão para ele, seus dedos tremendo. "Pensei que ela ia me matar."

Diogo pegou a mão dela, seu polegar acariciando seus nós dos dedos. Seus olhos encontraram os meus, ou melhor, o espaço onde eu flutuava. Ele não podia me ver. A constatação foi ao mesmo tempo um alívio e uma nova ferida. Ele não teria que enfrentar o fantasma de sua negligência.

Seu telefone vibrou. Era o meu, ou melhor, o pager do hospital que ainda listava meu contato. Ele olhou para ele, depois para Kimberlee, depois de volta para o telefone.

Kimberlee enrijeceu. "É... ela?" Sua voz era um sussurro aterrorizado. "Ela ainda está tentando me machucar?"

"Não, meu bem, não", Diogo a acalmou, sua voz firme. Ele silenciou o pager. "Ela não vai. Eu não vou deixar."

"Ela me chamou de monstro", Kimberlee soluçou, puxando a mão dele para sua bochecha. "Ela disse que eu estava tentando roubar você. Que eu era uma pessoa ruim." Seus olhos, grandes e inocentes, encheram-se de novas lágrimas. "Eu sou uma pessoa ruim, Diogo? Eu sou?"

Diogo a puxou para mais perto, seus lábios pressionados em sua testa. "Nunca. Você é a mulher mais gentil e doce que eu conheço. Ela está com ciúmes, Kimberlee. Ela sempre teve ciúmes do nosso vínculo. Não dê ouvidos a ela. Eu vou te proteger dela. Sempre."

Suas palavras foram um golpe físico. Ciúmes? Do vínculo deles? O vínculo forjado na culpa e na manipulação? Minha raiva, fria e afiada, explodiu. Ele realmente acreditava nas mentiras dela.

"Você é meu, Diogo", Kimberlee sussurrou, sua voz possessiva, quase triunfante. "Só meu."

Ele a segurou mais forte. "Sim, Kimberlee. Eu sou seu."

Eu assisti, horrorizada, enquanto ele assentia, afirmando a realidade distorcida dela. Ele estava tão perdido em seu próprio senso de responsabilidade distorcido, tão cego para a cobra venenosa que ele embalava. Meu fantasma cambaleou. Ele estava verdadeiramente perdido.

De repente, eu estava em seu escritório, o espaço opulento um contraste gritante com o quarto de hospital estéril. Ele sentou-se em sua grande mesa de mogno, seu rosto sombrio. Meu pager não parava de vibrar. Ele o ignorou, depois finalmente o desligou, jogando-o em uma gaveta.

Ele tentou ligar para o meu celular pessoal, depois para o meu ramal do trabalho. Nenhuma resposta. Claro que não. Eu estava morta.

Sua assistente chamou pelo interfone. "Dr. Fontes, o Dr. Lins precisa de você na SO 3. Trauma craniano crítico do acidente na ponte mais cedo. Ele está pedindo sua expertise, diz que o paciente está se deteriorando rapidamente."

Diogo fez uma pausa, sua mão pairando sobre o telefone. "Como está o tempo, Brenda?"

"Céu limpo, Dr. Fontes. A tempestade passou há cerca de uma hora."

"Bom." Ele assentiu, depois recostou-se na cadeira. "Diga ao Dr. Lins que estou indisponível. Ele terá que se virar. Encaminhe-o para a Dra. Ananda Sharma. Ela é capaz."

Meu fantasma gritou. O acidente na ponte. O paciente. Era eu. Ele estava se recusando a operar em mim. A mulher com quem ele deveria se casar em uma semana.

"Mas Dr. Fontes", a voz de Brenda era hesitante, "o Dr. Lins pediu especificamente por você. Ele disse que o prognóstico do paciente é terrível sem intervenção neurocirúrgica imediata, e dada a profissão dela-"

"Eu disse que estou indisponível, Brenda", Diogo a interrompeu, sua voz seca. "Cancele todos os meus compromissos para os próximos dois dias. Estarei com a Sra. Salles."

Ele me cancelou. Ele cancelou minha vida. Ele cancelou a cirurgia que poderia ter me salvado. Ele cancelou tudo, por ela.

            
            

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