"Eu não sou estéril", Daniel murmurou.
Ele falava para o chão. Não conseguia me olhar nos olhos. Não conseguia encarar a mulher que o arrastou para todos os especialistas na Suíça. A mulher que suportou centenas de agulhas, exames invasivos e decepções esmagadoras, tudo para proteger seu ego frágil.
"Nós gastamos milhões, Daniel", eu disse, forçando minha voz a permanecer firme. "Tentamos de tudo. Não era eu."
Cássia soltou uma risada curta e aguda. Ela cobriu a boca instantaneamente, mas o som já havia escapado.
"Desculpe", disse ela. "É que... eu tenho o problema oposto. Só preciso olhar para um homem e engravido. Meus meninos são a prova disso. 'Superfertilidade', os médicos chamam."
A fúria que explodiu em meu peito era incandescente. Não era ciúme. Era nojo. Ela estava zombando da única coisa que eu não podia comprar. A única coisa que o poder do meu pai não podia garantir.
Olhei para Daniel. Esperava que ele ficasse com raiva. Esperava que ele defendesse sua esposa contra esse insulto.
Mas ele não estava olhando para mim. Ele estava olhando para ela.
E a expressão em seu rosto não era de raiva. Era de desejo. Era uma adoração faminta, desesperada. Ele a olhava como se ela fosse um milagre. E me olhava como se eu fosse um campo estéril.
"Alana, por favor", disse Daniel.
Ele deu um passo em direção a Cássia, colocando-se entre nós. Como se eu fosse a ameaça. Como se eu fosse o monstro.
"Seja gentil."
"Gentileza", repeti. A palavra tinha gosto de cinzas. "Você quer gentileza enquanto desfila com sua amante na minha casa? Enquanto a deixa usar minhas joias? Enquanto a deixa zombar da minha dor?"
A mandíbula de Daniel se contraiu. "Ela não é minha amante", ele mentiu. "Ela é a babá. E é uma boa mãe. Algo que você não entenderia."
Não foi um tapa físico, mas suas palavras atingiram mais forte que um punho.
Ele estava usando minha infertilidade como arma. Estava me culpando. Depois de tudo que fiz para acobertá-lo. Depois de mentir para meu pai, dizendo ao Don que era eu quem não podia conceber, apenas para salvar Daniel da vergonha de ser menos homem aos olhos da Família.
"Fora", eu disse.
Minha voz tremeu. Não de medo, mas do esforço de conter a violência que estava codificada no meu DNA.
"Vocês dois. Fora da minha casa."
Daniel riu. Foi um som frio e amargo.
"Sua casa?", ele zombou. "Eu sou o homem desta casa, Alana. Eu conquistei isso. Eu sou o Chefe de Cirurgia. Você não passa de uma princesinha mimada vivendo do dinheiro de sangue do papai."
Ele pegou a mão de Cássia. Entrelaçou seus dedos. Apertou com força.
"Nós não vamos a lugar nenhum", disse ele.
Cássia sorriu de canto. Ela me olhou por cima do ombro dele. Era um olhar de triunfo. Ela achava que tinha vencido. Achava que, por poder lhe dar filhos, ela o possuía.
Ela não percebia que Daniel não possuía nada. Nem esta casa. Nem seu emprego. Nem mesmo as roupas do corpo.
Eu o possuía. E estava prestes a executar a hipoteca.
Fui até o aparador. Havia um vaso de cristal ali. Um presente de casamento do chefão das famílias de São Paulo. Pesado. Caro. Substituível.
Eu o peguei.
Os olhos de Daniel se arregalaram. "Alana, não seja louca", disse ele. Ele deu um passo para trás, puxando Cássia com ele.
Eu não disse uma palavra. Não precisei.
Arremessei o vaso pela sala.
Não foi mirando neles. Foi um tiro de aviso. Ele se espatifou na parede a centímetros da cabeça de Daniel. Cacos de cristal explodiram para fora como estilhaços.
Daniel gritou. Ele levantou os braços para cobrir o rosto. Mas não se cobriu. Ele virou o corpo. Ele protegeu Cássia.
Ele levou o vidro por ela.
Um caco cortou sua bochecha. O sangue brotou, vermelho vivo contra sua pele pálida. Ele não verificou seu ferimento. Ele agarrou o rosto de Cássia, procurando por arranhões.
"Você está bem?", ele perguntou freneticamente. "Ela te machucou?"
Ele me olhou com puro ódio. "Você está louca", ele gritou. "Você é igual ao seu pai. Um animal violento."
Eu fiquei em meio aos destroços do vaso. Observei o sangue escorrer pelo seu rosto.
E senti meu coração virar pedra.